O (curto) silêncio inicial é rompido com brados evocativos, que atraem uma atmosfera – em último estágio – de autoprovação. Pra tanto, os canadenses do Wormwitch visitam outras coisas além do black metal; especialmente o thrash metal e o hardcore oldschool.
Há uma coisa nas canções que faz o álbum soar essencialmente primitivo. E, ainda que soando de forma muito diferente do Sangue Nero (leia aqui), também é tentativa explícita de recuperação de uma antiguidade (pagã ou religiosa) através do próprio método de produção do disco. Então, que soe a coisa toda de forma antiga – que ela cause uma estranheza no ouvinte. Persistência e saturação são, de certa maneira, uma espécie de ritualismo.
Não é explicitamente uma tentativa de falsificar o presente, mas sim um depoimento denso dum ocultismo velado. De que algo inominado ronda o que percebemos como vida – por isso os longos grunhidos ininteligíveis seguindo de infernais blast-beats. O som pode soar desgraçado ao ouvinte, mas é que a banda acredita que pode criar uma fresta de abertura no mundo instituído. Leva seu tempo, recorre a uma velocidade inventada (partes rápidas consoando com gritos melódicos) pra tentar deixar o processo menos usurpado, de acordo com as intenções do mundo. Eventualmente o uníssono parece menos massivo e uma verdadeira tônica crua e bela pode sugerir outra forma de vida.
Ouça o disco na íntegra:
“I stand on the precipice. And I leave my body to wash away in the current of time. Pour your wisdom into me. Repent into me. And prepare for total annihilation”.
A introdução murmura uma inabilidade de lidar com este mundo, por isso perseguir frestas que permitam uma visualização mais serena. Pra tanto, é necessária a aniquilação das coisas conhecidas. A velha língua que pode ser capaz de dizer a mesma matéria de uma maneira menos infectada.
A arquitetura das canções do Wormwitch, ao contrário do que aparenta nas primeiras audições, é um tributo à vida e – ao mesmo tempo – uma nota de imenso repúdio à forma que a temos vivido. Cada seção alinha à escola de rifes do Venom, com grunhidos recortados diretamente de toda cena black metal do final dos anos 80.
As transições são violentas (mesmo as realizadas pra instrumentos acústicos) e declaram uma superfície gélida cujo interior necessita de um novo ar pra respirar. Depois de ouvir o disco, os rifes vão persistir em sua memória devido ao esforço repetitivo da banda. Há uma multiplicação de dissonantes solos que emerge após furiosos brados do vocalista. Não há descanso pra esses caras. Novamente, assim como os consecutivos rifes, eles perseguem uma outra espécie de paz – à sua maneira. Como se fossem atrás do próprio espírito que está vagando desvanecidamente aguardando a apreensão. A palavra não é o suficiente pra encontrá-la. Por isso a difusão do metal dissonante com influências nítidas do rock’n’roll clássico, pra reafirmar o que uma vez foi confronto e alçá-lo à mesma condição negativa que, alguma vez, ocupou.
Todo esse “andar pra trás”, na verdade, revela pessoas esgotadas com a condição contemporânea de viver e estipulam, a partir dessa busca, um redirecionamento em que o mundo em ruínas é deixado pra trás. A face está vazia, mas deseja vida. As canções são como brisas ardentes, insistentes em seus sopros e cujas aderências estimulam sensações.
—
01. As Above
02. Howling From The Grave
03. Weregild
04. Even The Sun Will Die
05. Relentless Death
06. Cerulean Abyss
07. Everlasting Lie
08. …And Smote His Ruin Upon The Mountainside
09. Mantle Of Ignorance
10. So Below