Vejo 2012 como um ano sensacional pra música. Tivemos muitos lançamentos interessantes tanto lá fora quanto aqui no Brasil. Mas antes da “lista de 12 bons discos de 2012 que me vêm à memória” (e que você deveria ter ouvido ano passado), vou expor algumas observações que fiz sobre o período.
Foi mais um ano de crescimento no que convencionou-se chamar “cena” underground brasileira – e sendo essa cena bastante subdividida e recheada de preconceitos e barreiras, insisto nas aspas.
Houve o crescimento e a aceitação do “noise” e da improvisação dentro do cenário alternativo “hypado”, o que é bom, porque torna a provocação explícita e por mais que possa ser apenas uma reação momentânea no aguardo da próxima-grande-novidade, deve deixar cicatrizes – no Brasil, vi isso refletido no surgimento e crescimento de alguns selos como o 1/2 Vida e o próprio TOC, do qual faço parte; na continuação de alguns outros bem dedicados, como a Mansarda Records, que produz incessantemente discos de improvisação livre e já possui um acervo e tanto; e a Sinewave e a Disensso, que reservam uma parcela de seus lançamentos pra música experimental. A Disensso inclusive já organiza um evento há alguns anos, chamado DIS Experimental.
Por falar em eventos, houve festivais e eventos organizados no Rio e em São Paulo. Posso falar mais pelo Rio e pelo crescimento do circuito de festas/shows voltados pra música experimental e de improviso. Nos últimos meses, a coisa andou tanto por aqui a ponto de eu não conseguir dar vazão. Houve semanas em que havia Quintavant num dia, Síncope noutro, uma boa programação no Plano B logo em seguida, e outros shows espalhados em outros lugares, tornando impossível, pra mim pelo menos, acompanhar tudo. Algo bonito de se ver.
Enfim, considero que foi um ano muito bom pra música. Mas antes de dar adeus a 2012, torcendo pra 2013 ser tão bom quanto, vamos ao ponto.
Meu objetivo com essa Engrenagem é deixar aqui registrado alguns discos que gostei muito mas não tive tempo de fazer um texto sobre; outros que li textos em português que bastaram pra mim e então eu não teria nada de novo a dizer; e ainda alguns que ficaram estampados nas poucas, porém esforçadas, Engrenagens de 2012. Dentro dessa modesta lista ordenada propositadamente pra não ter ordem de preferência, coloquei discos que ou eu vi pouco nessas enxurradas de listas ou sequer vi em nenhuma, mas fizeram minha cabeça.
Divirta-se: 2012 fica na memória.
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Aaron Dilloway – “Modern Jester”
Bem, esse esteve em várias listas e é um dos representantes do “hype noise” que pincelei na introdução e merece ser celebrado. Um discaço, que desenvolve o jeito irônico de Aaron Dilloway, um artista que está em constante crescimento desde sua saída do Wolf Eyes – sem desmerecer sua trajetória na banda.
Link pro texto do Matéria: clique aqui
Link pro texto do Camarilha dos Quatro: clique aqui
Ouça “Look Over Your Shoulder”:
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Grunt – “World Draped In A Camouflage”
Grunt é um projeto de Mikko Aspa. É seu projeto mais fiel ao power electronics/noise. Em sua arte sempre provocativa e questionadora, Mikko costuma ter construções sonoras muito bem cuidadas – quando não é apenas visual – que podem até passar despercebidas pelos ouvintes mais apressados e focados apenas na violência. São os grooves e basslines surreais que alimentam os climas e a temática hostil de seu Nicole 12 (outro projeto de Aspa, provavelmente o mais polêmico – uma rápida busca no Google vai te dizer o porquê), junto aos samples e as vozes hiper processadas. Nesse disco, as construções, samplers, vozes e todo o entorno, e os próprios loops que aparentam explorar a fita cassete estão em um nível musical apuradíssimo. Arrisco dizer que foi o melhor disco do Grunt até então.
Ouça “Dance For The Genocide”
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Raime – “Quarter Turns Over A Living Line”
As influências do industrial muito bem utilizadas num disco super atual.
Ouça “The Last Foundry”:
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Vatican Shadow – “September Cell”
Tivemos nesse ano de 2012 uma espécie de “revival do techno“. Dou como exemplo o Regis, que lançou um belo disco, e o Silent Servant no mesmo caminho. Nesse cenário, Dominick Fernow colocou a produção do Vatican Shadow a todo vapor, além de estrear com o projeto ao vivo, esse álbum foi o disco de estréia do projeto no novo selo do qual ele faz parte, Bed Of Nails, que contou ainda com um belo disco do Bronze Age.
Ouça “Cairo Is A Haunted City”:
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Silent Servant – “Negative Fascination”
Mais um belo exemplar do “revival techno“, com influência industrial desses tempos decadentes. Paranoia.
Ouça “Temptation & Desire”:
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Motion Sickness Of Time Travel – “Motion Sickness Of Time Travel”
Um disco composto a partir de improvisos em overdubs, esculpido vagarosamente por uma moça que tem o feeling (leia texto completo na Engrenagem #12).
Ouça “One Perfect Moment”:
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Prurient/JK Flesh – “Worship Is The Cleansing Of Imagination”
Com a premissa de ser o derradeiro lançamento da Hydra Head, uma união de “titãs”: JK Flesh, o projeto voltado pra mistura da atmosfera godflesheana com o post-dubstep, que teve um bom disco lançado também esse ano, e Dominick Fernow, o cara dos feedbacks em seu projeto mais intenso, o Prurient.
Não é de hoje que o Pruient vem adentrando a estrutura e certos lampejos de melodia simples, mas essa fase alcançou uma maturidade interessante nesse novo registro. Vale dizer que o JK Flesh não fica atrás, afinal Justin Broadrick dispensa comentários, por mais que alguns lançamentos do Jesu tenham “deixado a desejar” pra alguns dos fãs nos últimos anos.
Ouça “Fear Of Fear”:
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Aufghoben – “Fragments Of The Marble Plan”
Uma pedrada. Um monolito. Extremo. Um disco de improvisação/noise criado por músicos incríveis que valeu 2012. Esse merecia ser ouvido por muitos, mas acredito que poucos conseguem e que também seja meio doloso aos ouvidos (leia texto completo no Engrenagem #13).
Ouça “Ethicsisanoptics”:
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Chinese Cookie Poets – “Worm Love”
“Worm Love” saiu pela Sinewave, o que gerou abertura da banda a um público novo, e embora, na minha opinião, eles não tenham superado o incrível EP de estréia, “Worm Love” é um disco sensacional feito a partir da edição de uma sessão de 40 minutos de improvisação. Disso foi composto um belo disco de “música eletrônica” com cortes e loops certeiros. É bonito de ver o Chinese espalhado por aí em listas de melhores do ano, junto a várias coisas que pouco tem a ver com seu conteúdo, é bonito até vibrar com um “hit” como “En La Mano Del Payaso e seu vídeo genial. Uma das minhas bandas preferidas.
Ouça “En La Mano Del Payaso”:
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Chelpa Ferro – “Chelpa Ferro 3”
O Chelpa Ferro já é lenda. Esse disco foi o mais impressionante até agora, com participações especiais ilustres, tocando por cima de algumas instalações do grupo. O grupo que está sempre em movimento ou em shows ou instalações merece ser muito mais celebrado por essas bandas. Se não é o melhor, é um dos melhores discos que ouvi esse ano, fácil. Vale ler as criticas que saíram sobre ele na Camarilha dos Quatro e no Matéria.
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Pedestrian Deposit – “Kithless”
O Pedestrian Deposit evoluiu muito ao longo dos anos e sua simbiose de música ambient e noise, como um duo e não mais um projeto solo, é algo lindo de se ouvir. “Kithless” é um disco de texturas suaves feitas a partir do decomposto (leia texto completo na Engrenagemn #17).
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Sleep Research Facility – “Stealth”
Esse disco é clima puro e rendeu uma boa Engrenagem esse ano. Não poderia faltar nesta lista (leia texto completo na Engrenagem #14).
Ouça “Stealth 3”: