ENTREVISTA: DISAPPEARS – A HIPNÓTICA MANEIRA DE SURPREENDER

O desejo de fazer essa entrevista nasceu quando ouvi o brilhante “Guider”, lá em fevereiro. Pensei que sinceramente eu já havia ouvido um bocado sobre esse tipo de som, e parece-me claro que o Disappears fazia algo minimamente diferente. E fui procurar na Internet se alguém tinha uma definição estrombólica e criativa pra essa definição.

Não encontrei. Então, pensei: vou perguntar pra própria banda. E mandei um e-mail. Eles responderam e mandei outras tantas perguntas. Simples assim – e idiota assim. Um motivo idiota, fútil, vazio, mas que, no fim, acabou rolando um papo bacana, mesmo que por e-mail.

Definir o tipo de som que o Disappears faz é algo desnecessário, uma curiosidade infantil até, mas ouvir o que essa banda toca, os dois discos, “Lux” (de 2010) e “Guider” (de 2011), é quase uma obrigação.

É uma das bandas mais viajantes da atualidade, como o Loop, o Black Angels (por que não?), o Spacemen 3 e uma longa lista de outras tantas – e bandas assim merecem lugar de honra no meu tocador de MP3, sempre. Adoro essa hipnótica maneira de me surpreender com a música.

A banda é formada por Brian Case (guitarra e vocal), Jonathan Van Herik (guitarra), Damon Carruesco (baixo) e Steve Shelley (batera). É de Chicago, Esteites. Eis que então, de um princípio infantil, ficamos sabendo como Shelley, baterista do Sonic Youth, embarcou nessa; o que ele acha do Brasil; e que o Disappears já está gravando o sucessor de “Guider”; além de outras coisinhas mais.

E, claro, descobrimos que nem a banda sabe como se definir. Mas aí, essa besteira já não era tão importante pra mim.

Floga-se: É curioso: a Wikipedia descreve o Disappears como uma “mistura de shoegaze, krautrock e garage rock.” Mas o Disappears parece ter outras fontes de inspiração ou similaridade, como o Spacemen 3 (“Revisiting” é um bom exemplo) e Suicide. Você pode, de alguma maneira, definir o som do Disappears ou esse tipo de coisa não faz mais sentido hoje em dia?

Brian Case: É difícil ligar o que nós fazemos com poucas influências ou bandas. Você provavelmente ficaria surpreso seu eu lhe dissesse que Steve Reich foi uma grande influência na nossa música! (N.E.: Stephen Michael Reich é um compositor estadunidense, conhecido como o pioneiro da música minimalista, de modo que não está assim tão distante do som do Disappears, como sugere Case) A despeito de nos definir a partir de um tipo de música ou grupo, acho que tentamos focar mais em ideias e conceitos – trabalhamos mais na criação de um estado de espírito, de uma atmosfera, no sentido de capturar um pouco do espírito que se conecte à época das bandas que gostamos.

F-se: Há um consenso aqui no Floga-se de que “Guider” é um dos melhores discos do ano. Comparado com “Lux”, que não era tão contundente, você acredita que de fato houve uma evolução no som de vocês?

BC: É uma evolução definitiva. Fizemos um esforço consciente pra fazer um disco bem focado. Gosto de “Lux” um bocado, mas “Guider” tem a vantagem da gente ter tocado “Lux” por tanto tempo que ficamos melhores na maneira de criar música, e o estúdio nos deu a oportunidade e nos incentivou a criar canções como “Revisiting” (N.E.: a música tem 16 minutos de duração), algo que seria difícil de fazer um tempo atrás. Estamos nos aprontando pra gravar nosso próximo disco, semana que vem (essa semana) e já é um pouco diferente dos dois anteriores, o que nos deixa bem satisfeitos.

Ouça “Revisiting”:

F-se: Chicago parece ter uma ligação umbilical com a psicodelia, o noise e o shoegaze. The Secret Colours, Calm Palm Vapour e o Panda Riot são bons exemplos. Por que você acha que a cidade dá ao mundo bandas tão impressionantes?

BC: É uma das últimas grandes cidades acessíveis. Há muitas escolas de arte aqui e há sempre um influxo de novas ideias e garotos, e sempre houve música aqui pras pessoas ouvirem – elas se mudam pra cá especificamente pra tocar. Além disso, o inverno passado foi tão longo que deu às bandas um bocado de tempo pra ensaiar.

F-se: Fale sobre como Graeme Gibson deixou a banda e como Steve Shelley entrou.

BC: Graeme queria se mudar pra Portland, ele tava de saco cheio de Chicago e estava tocando em outra banda por lá. Não rolou rancor e no final funcionou melhor pra gente e pra ele. Então foi legal. Conhecemos Steve um ano antes de “Lux” sair. Um amigo nosso que trabalhava pro Sonic Youth trouxe Steve pra nos ver tocar. Ele realmente gostou do show e acabamos trabalhando num projeto poucos meses depois (que de fato será lançado ano que vem). Ficamos em contato depois disso. Quando soubemos que Graeme estava nos deixando, perguntamos se Steve queria tocar, achando que ele estaria muito ocupado e no final das contas o convite funcionou.

F-se: Como está sendo a turnê de “Guider”? Vocês tocaram um bocado pelos Esteites e também na Europa… Como foi a reação da plateia em ambos os lugares?

BC: Tem sido demais, estamos felizes em como a turnê tem se desenvolvido. O lance da Europa foi uma grande surpresa, não tínhamos a menor ideia do que esperar, mas daqueles foram nossos maiores shows. Nos Esteites, foram tão bons quanto, particularmente na costa oeste, por algumas razões. Nós tocamos um bocado do novo material e a reação do público tem sido boa, o que nos motiva mais.

Veja um vídeo da banda tocando “Radiation”, do Suicide, ao vivo no Ancienne Belgique, em Bruxelas, Bélgica, dia 29 de maio de 2011:

F-se: Steve Shelley esteve no Brasil algumas vezes com o Sonic Youth e o Hallogallo. Ele disse algo sobre essas visitas? Disappears pensa em tocar por aqui algum dia?

BC: Sim, ele fala um bocado sobre isso – ama tocar aí e gostaria de levar o Disappears o mais rápido possível. Tomara que com o próximo disco.

F-se: Disappears lançou dois discos pela Kranky, um selo independente de Chigaco. Vocês receberam algum convite de uma grande gravadora? Aceitariam?

BC: Nunca recebemos convite de uma major. Se aceitaríamos? Quem sabe – Kranky faz tudo o que pedimos, eles nos apoiam e nos ajudam um tanto. Gostamos deles e eles sinceramente estão preocupados com as bandas que lançam. Não tenho certeza se essas qualidades existem num esquema de grande gravadora.

F-se: Já estão pensando no próximo disco e podem falar sobre isso?

BC: (rindo) Sim, vamos começar a gravá-lo agora. As canções são diferentes, mais uma evolução do que algo entre “Lux” e “Guider”. Não estou realmente certo de como ele será no final, mas nesse exato momento, tem oito ou nove músicas, algo em torno de 30 a 35 minutos provavelmente. Estamos gravando no estúdio do Sonic Youth (Echo Canyon) e mixaremos com nosso amigo John Congleton – ele fez discos com The Walkmen, St. Vincent, David Byrne (e até com R. Kelley, risos).

F-se: Como definir a linha entre paixão e ilegalidade quando o assunto é download gratuito de música?

BC: Acho que é um fato dos dias de hoje. Se ajuda alguém conhecer sua banda ou possibilita descobrir algo que você nunca ouviu, por que é tão ruim? As pessoas têm de decidir se comprar música é algo tão importante pra elas ou não – a pra algumas não é. Mas talvez essas pessoas verão sua banda tocar e comprarão uma camiseta ou algo do tipo. Acho que pra uma banda do nosso nível, ajuda mais do que prejudica.

F-se: Conhece música brasileira?

BC: Sim, conheço alguma coisa, não muito bem e a maioria através de compilações, mas realmente gosto de Arthur Verocai, de Os Mutantes, o tipo de coisa que todo mundo gosta, acho. Há um bom livro/CD lançado pela Soul Jazz, chamado “Bossa Nova”, que minha esposa me deu de aniversário, que eu curto muito. Acho que essa seria uma boa pergunta pro Steve ou pro Jonathan!

F-se: Por fim, apresente o Disappears pros brasileiros, em suas próprias palavras.

BC: O Disappears toca minimal rock music. Obrigado por entrar em contato, nos achar, e tomara que possamos tocar alguns shows pra vocês num futuro próximo.

Veja o vídeo de “Guider”:

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