ENTREVISTA: THE ARCTIC FLOW – PURA PAIXÃO

Conheço o Arctic Flow há alguns anos. Talvez desde 2008, dois anos depois que comecei com o Floga-se, de forma gaiata, sem muitas pretensões (bom, ainda não existem muitas).

De lá pra cá, troco mensagens constantes com Brian Hancheck, o cabeça do Arctic Flow. Mas nunca o conheci ao vivo. Ele mora em Myrtle Beach, South Carolina, Esteites, e sinto como se fosse uma alma gêmea distante: gostamos do mesmo tipo de música, futebol e de amigos e do clima família.

O cara tem uma alma brasileira, expansiva. Ao contrário da maioria dos seus compatriotas, gosta de um bom papo e se resume da seguinte maneira: “sou casado com minha bela esposa, Aimee’, desde 12 de maio de 2000. Temos dois filhos, Madison e Ian. Trabalho como gerente administrativo pra Fortune 50 (empresa de varejo em tecnologia) e divido meu tempo entre minha família, meu trabalho e o trabalho com meu projeto, o Arctic Flow”.

Essa é sua vida – e ela é, na verdade, o espelho da vida da maioria das pessoas que eu, você ou qualquer um conhece de perto. A diferença é que Brian tem o dom criativo pra música. Isso o coloca acima da “normalidade”. Isso o destaca.

Além do mais, ele é prolífico: tem um sem número de singles, alguns EPs e um disco lançados, todos de forma independente, por selos diferentes (inclusive europeus), a maioria fáceis de encontrar pra download gratuito na Internet.

Pra quem conhece Felt, Durutti Column e aquele dream pop característico da segunda metade dos anos 1980 – e que se prolongou até a década de 1990 – é um prato cheio. São músicas simples: guitarra, bateria eletrônica, programações. E deliciosas, quase calmantes. É como se a viagem agora fosse na base de sorrisos alucinógenos e abraços familiares entorpecentes. É assim que Brian faz sua cabeça. É assim que ele cria sua música e faz a nossa cabeça.

Essa é a sua paixão. Uma paixão de quem faz música por prazer, sem se importar com o resultado financeiro. Não é ideologia, nem nada, muito menos papo de quem não conseguiu uma brecha no mercado. É paixão pura. É arte em estado puro.

Floga-se: Vamos começar do princípio… Fale sobre a história do Arctic Flow. E, em poucas palavras, defina sua música.
Brian Hancheck: Bem, antes de dizer a história do Arctic Flow, preciso dizer pra você o que veio antes disso. Meus pais e meu irmão eram da música, então eu sempre estive no meio dela. Meus pais se conheceram tocando em bandas. Quando eu estava no colegial, estive em algumas bandas e continuei na faculdade, nada muito sério, mas eu sempre toquei as músicas dos outros. Eu levei a sério minhas músicas no verão em que me formei no colégio, quando meu irmão comprou uma guitarra pra mim. De qualquer forma, em 2006, decidi parar de tocar em bandas de outras pessoas e começar meu próprio projeto solo. A primeira encarnação se chamava The Horrid Lorries e era ok, mas em 2008 mergulhei na música ambiente e achei que seria mais legal ter um projeto só desse tipo de música, então achei que The Arctic Flow soaria mais ambient e comecei a gravar alguns instrumentais – como “Ocean Colored Days”. Aquelas primeiras canções estão todas no primeiro EP, “I Saw The Silver Sun”. Do nada, coloquei no MySpace e de repente decolou. Não estava preparado pra ouvir pessoas falando sobre a minha música… Pra descrever minha música… Algumas pessoas chamam de “Twee Gaze” (nota: não há uma tradução literal pro que ele quer dizer aqui, mas Brian se refere a um shoegaze mais tranquilo, sem tanto zunido, algo como se fosse um catar de pássaros). Meio que concordo com essa descrição. Eu gosto de shoegaze e indie guitar pop, Sweedish pop, coisas assim. Gosto de melodias bonitas e vocais suaves. Muitas das minhas canções são sobre amor não correspondido, nada autobiográfico, só é mais fácil escrever sobre isso.

Ouça na íntegra o primeiro EP, “I Saw The Silver Sun”:

F-se: Parece que você trata o Arctic Flow como um hobby. Além disso, você claramente se posiciona como um “cara família”, o oposto do estereótipo rock’n’roll de festas, bebidas e drogas. De fato, quem é Brian Hanchek?
B.H.: Eu diria que é um hobby porque eu não vivo disso. Mas eu não quero que as pessoas pensem que eu não levo isso a sério, porque eu levo. É uma grande paixão minha, entretanto mantenho minhas prioridades. Família em primeiro lugar. Porém, quando a inspiração bate, tenho que levar a cabo. Nunca de fato caí nessa onda de “festejar” (de balada). Cresci usando meu tempo livre pra aprender a tocar guitarra. Conheci minha esposa quanto eu tinha 20 anos e casei com 22. Até quando estava em turnê com outras bandas eu era o único que não caía na balada. Atualmente, eu trabalho como Gerente Administrativo de um grande varejista e gosto disso. Não tenho muito tempo livre quanto gostaria, então quando eu consigo uma chance, uso-a pra escrever e gravar. Minha vida é bem simples. Adoro o mar e sinto-me abençoado por viver perto dele. É uma fonte sem fim de inspiração.

F-se: Você tem algum tipo de ambição artística?
B.H.: Acho que só gosto de escrever música. Diria que é um prazer. Nunca tive grandes ambições artísticas além de criar boas canções e pensar que alguém poderia dançar devagar com sua namorada ouvindo-as.

F-se: É difícil ganhar dinheiro com música até nos Esteites? Quais os maiores desafios?
B.H.: Você tem que devotar sua vida a isso. Nos Estados Unidos é bem difícil porque todas as grandes cidades são tão lotadas de gente. A menos que você tenha uma grande gravadora por trás, ou que você tenha sua música num comercial de carro, você está por conta própria. Eu sei que em Myrtle Beach músicas independentes passam fome porque há poucos lugares pra tocar.

F-se: Qual sua opinião sobre os direitos autorais?
B.H.: Copyright é um assunto complicado. COm a Internet e o modo de distribuir música agora… Direitos autorais não parecem ser o que eram antes. Obviamente, você quer ganhar crédito por sua música e você não que que ninguém roube suas músicas. É importante, mas não não penso realmente muito sobre isso.

F-se: Você lançou apenas um disco, “All The Way Until December”. Além disso, decidiu por uma série de EPs e singles, por diferentes selos. Por que essa escolha? É difícil lançar ábuns cheios?
B.H.: “All The Way Until December” não era pra ser um álbum. Não era até o último minuto, quando ficou decidido que teria nove faixas. Fiquei surpreso que a Holiday Records tinha ido contra a política dela de “apenas singles” e lançou o LP. Na maior parte, são os selos que decidem que formato os álbuns terão. Eu prefiro os EPs porque eles são curtos e prendem sua atenção. Acho difícil lançar álbuns porque e não quero dar um peso maior aqui ou ali. Acho que toda canção conta. Quer lançar um em breve. Mas nosso próximo lançamento é um EP. Só não gosto de discos que você tenha que pular faixas. Tenho tido sorte de estar envolvido com muitos selos. Eles são maravilhosos e ainda bem lançam minha música pelo mundo.

F-se: As capas dos discos são belíssimas. Quem as cria?
B.H.: Tenho muitos amigos talentosos. Deixa eu ver se consigo dar crédito onde o crédito é merecido: “I Saw The Silver Sun”, “Too Late To Say I’m Sorry”, “All The Way Until December”, “December Morning” e “There Will Never Be…” são todos de Jacob Graham; “Lemonade Kiss” é da Beko (selo francês que lançou o single); “Goodbye Oceana” e “Starflow Lighting” são de Tony Pucci; e “Sentiments And Artifacts” por Cristobal e sua namorada da Bubbletone/Club 7. Acho que são todas, espero não ter esquecido nenhuma ou ninguém. Não consigo fazer o design de nada. Não sou um bom artista visual, mas adoraria conseguir fazer.

F-se: Como é o processo de gravação do Arctic Flow? Você tem seu próprio estúdio?
B.H.: Gravo tudo no meu estúdio próprio. Não é nada elaborado, mas funciona pra mim. É meio primitivo se for comparado com o que a maioria das pessoas possui. Tenho ainda a mesma guitarra que meu irmão me deu, alguns baixos, um teclado, uma bateria e outras coisinhas. Gostaria de falar pra você que é um grande negócio, mas funciona pra mim.

F-se: É inevitável ouvir o Arctic Flow e pensar em Durutti Column. Concorda com a ligação?
B.H.: Nunca ouvi falar dele. Tenho lido sobre isso e acho que tenho que dar uma checada. Conheço o trabalho de Vini Reily no primeiro disco do Morrissey.

Ouça na íntegra o EP “December Morning”:

F-se: O que você ouve em casa? Quais bandas te influenciaram?
B.H.: Nos últimos quatro meses, ouvi muito The Radio Dept. pelo menos uma vez ao dia. Eles são fenomenais. Uma banda chamada Days também tem passado pelo meu iPod, assim como o Northern Portrait, Pet Shop Boys, Dinosaur Jr. e The Field Mice, The Drag, Chapterhouse… As bandas que mais me influenciaram são, na ordem: Ths Smiths, The Cure, New Order, The Radio Dept., Slowdive, Starflyer 59, Chapterhouse, The Cocteau Twins, My Bloody Valentine, Ride, Boat Club, Pet Shop Boys, só pra citar alguns. Há algumas bandas incríveis que merecem muito mais atenção do que eles estão conseguindo, por isso recomendo Sundae, Isles of Kin, The Consolation Project, The Bilinda Butchers, qualquer coisa do Tony Pucci, Soda Shop, A Classic Education, Data Unit, Orange 86.

F-se: Recebe muitos convites pra shows? Como são os shows do Arcitc Flow?
B.H.: Recebo alguns sim. Realmente preciso excurcionar, mas é muito caro. Sou um tanto tímido então é estranho ser o centro das atenções. Acho que é por isso que gosto de tocar bateria, você meio que se esconde. Tô pensando em fazer alguns shows no verão, mas será algo intimista, nad amuito extravagante.

F-se: Por que nunca vimos um vídeo do Arctic Flow? É muito caro fazer um ou você não gosta de gravá-los? Qual música você escolheria pra fazer o primeiro clipe
B.H.: Como pra capas de discos, não tenho talento algum pra fazer vídeos. Nem sei por onde começar. Adoraria ter um vídeo bacana, entretanto que tipo de vídeo eu faria? Se tivesse que escolher, bom, não sei… Qualquer música estaria bom pra mim. Provavelmente uma nova.

F-se: Como você divulga a música do Arctic Flow? Usa apenas a Internet ou há outros canais? Tem um agente que cuide de sua carreira?
B.H.: Internet é demais e é perfeita pra músicos independentes como eu. Eu confio em blogues independentes como o Floga-se e tantos outros. Parece que a palavra caminha mais rápido. Há ótimas comunidades por aí. Holiday Records me deu o “grande impulso” e eles meio que começaram com tudo. Não mantenho muito contato com eles mais. Gostaria, sinto falta deles. Mas não, não tenho um agente, eu faço tudo, da composição à gravação, embora os selos façam a promoção. Uso o Facebook e meu próprio site http://www.thearcticflow.blogspot.com/ pra ajudar. Seria bom ter um agente com tempo livre pra isso.

F-se: Conhece a música brasileira ou o Brasil?
B.H.: Sinto dizer que não conheço nenhuma música brasileira. Um dos meus antigos chefes era do Brasil e eu lembro dele me contando sobre o Carnaval e o quão incrível é. Pra mim, os brasileiros parecem ser tão apaixonados pela vida, esportes, música, comida…

F-se: Mande uma mensagem aos fãs do Brasil.
B.H.: Gostaria de agradecer o apoio. Talvez um dia eu chegue ao Brasil pra alguns shows. Obrigado a todos e dêem uma ouvida no nosso novo EP, “Starflow Lightning”.

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