FAIXA A FAIXA: DUELECTRUM – SHE DOESN’T FEEL THE SUN EP

Acho essa história de faixa-a-faixa um troço muito legal, porque ninguém conhece melhor as músicas do que os próprios autores. Ok, música, como toda arte, é interpretativa, não precisa da explicação ou da orientação do artista, mas há nesse tipo de relato curiosidades que só quem criou pode revelar. E, ouvinte, apreciadores, não dispensamos essas informações de bastidores.

É o que Filipe Albuquerque, guitarrista e vocalista da Duelectrum, conta aqui, falando de cada uma das quatro faixas do novo EP da banda, “She Doesn’t Feel The Sun”, lançado em agosto de 2014 pela Sinewave (pra baixar, clique aqui).

São detalhes interessantes sobre o processo de criação, o nascimentos das canções e seus significados. Lendo e ouvindo, ao mesmo tempo, as canções ganham outra dimensão. Vale a experiência.

1. She Doesn’t Feel The Sun
A letra não é nova. Tem alguns anos, e a gente chegou a tocá-la algumas vezes ao vivo no passado, mas num arranjo diferente. A versão que está no EP é de 2012, se não me engano, e foi devidamente influenciada pela presença do Lippaus e do Elson. É a versão definitiva, a mais pesada e a mais próxima do que eu imaginava pra ela. A ideia era contrastar a melodia meio assoviável com uma cacetada feita de guitarras e bateria acelerada. A letra não diz muita coisa. Saiu rápida, apenas pra preencher a música, sem necessidade de algum significado. ‘Roubei’ um verso de “My Life In Art”, do Mojave 3 (“Excuses For Travellers”), porque achei que se encaixava na melodia. Na verdade, o roubo não foi literal. Adaptei pra caber na métrica de “She Doesn’t…” E se perceber bem, a melodia dessa música tem bastante a ver com “My Life In Art”. Acho que funcionou.

2. Trembling Blue Stars
Talvez a música mais fácil que eu já fiz, e por isso a que saiu mais rapidamente, incluindo a letra. Três acordes, uma variação discreta no acorde principal, tanto na introdução quanto na ponte entre a primeira e a segunda estrofes. O segredo dessa música são as camadas criadas pelos efeitos e pelas oscilações de volume feitas pelo Lippaus no improviso, durante os ensaios. A música também não é nova: é do tempo que o Luiz Freitas tocava com a gente, 2011, se não me engano, e ele tocava a bateria numa espécie de contratempo. Com o Elson, a bateria ficou mais acelerada, menos quebrada. Gosto das duas versões, mas a gente optou pela segunda. A letra nasceu da necessidade de ter algum discurso, porque particularmente não consigo estruturar uma música instrumental. Mas apesar de sair no tranco, a letra acabou tendo certo significado, embora nada muito profundo; só alguém que está levando umas lambadas da vida e, no limite, pede ajuda de cima (“sweet Jesus, take my hand/give me your grace until the end, because I’m bleeding”). Não é autobiográfica.

3. Eisbar
A sugestão de fazer uma versão pra música do Grauzone foi do Franklin. A gente foi convidado pra tocar no extinto Espaço Walden (em São Paulo) em 2012, se não me engano no aniversário do Renato Malizia, e a ideia sugerida por ele era que cada banda tocasse duas coveres. E a sugestão do Franklin foi encontrar uma música que não tivesse nada a ver com o tipo de som que a gente faz. Quando ele me mostrou a música, lançada originalmente em 1981, pensei imediatamente numa versão acelerada, pós-punk, explodindo no refrão. E me parece que era a idela dele também. Nessa, o Franklin, alemão nativo, assumiu os vocais e eu fui pra bateria, e botei também uma guitarra de fundo gritando pra engordar a música. O noise e a guitarra-avalanche é do Lippaus. É a música que eu mais gosto no EP.

4. She Doesn’t Feel The Sun (Alternate Version)
A ideia foi do Elson. Ele sugeriu uma versão acústica depois que eu mostrei a música pra banda em um ensaio. “Parece Sebadoh”, ele disse, e vindo dele, chefe da torcida organizada do Lou Barlow e nosso patrão, é um baita elogio. Como eu nunca gostei de acústico, a gente juntou duas ideias. O Lippaus regravou o violão que eu tinha feito antes e que não estava bom, e deixou redondo, sem rebarba nenhuma. Gostei bastante do resultado final, com as microfonias arranhando a música e a distorção quase engolindo tudo na segunda parte. O mais legal é que, tanto nessa quanto nas outras três faixas, a gente não precisou de oitenta pedais pra atingir o nível de ruído que a gente queria, nem embolar quinze guitarras pra conseguir criar alguns climas. Em boa parte dos casos, foram três ou quatro guitarras sobrepostas no máximo, e nem cinco pedais conectados.

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