“Imagina a minha alegria quando o Márcio Bulk me convidou pra fazer um disco com o Cadu. Já admirava o trabalho do Cadu há um tempo. O Cadu é desses caras infinitamente inventivos e generosos, tem uma força criativa e uma sensibilidade que só inspiram a gente! Ficamos um ano em prezerosas trocas de ideias e sons, e agora o disco tá pronto”: assim escreveu empolgada Juçara Marçal no Facebook.
Márcio Bulk e Cadu Tenório já haviam mostrado o caminho em “Banquete”, discaço de 2014, juntando belas e doces vozes com o noise e o industrial. Era leveza e doçura misturadas com a agressividade e com a brutalidade do cotidiano cinza. A MPB com a MTB.
Por sua vez, Juçara tem uma bela história em linha semelhante, seja no brilhante disco solo (“Encarnado”, o melhor de 2014 aqui pro Floga-se), seja com o Metá Metá.
Daí que ambos se uniram pra reviver cantos antigos do congado mineiro, muitos presentes no clássico disco ‘Canto Dos Escravos’, lançado em 1982.
Segundo o selo QTV, um dos responsáveis pelo lançamento, junto com a Sinewave, em 6 de outubro de 2015, o disco contém “cantos ancestrais dos negros benguelas de São João da Chapada, Diamantina, Minas Gerais. Colhidos e transcritos pelo filólogo, professor e linguista mineiro Aires da Mata Machado Filho”.
Cadu completa: “além dos cantos, tem duas canções originais (‘Eká’ e ‘Taio’), que não têm letra… A Juçara usa a voz de forma a complementar o instrumental. De resto, são todas composições que foram feitas pra ‘abrigar’ e acompanhar os cantos”.
“Anganga”, no português de Moçambique, é um termo respeitoso pra tratar senhores e senhoras de idade. Anganga é uma entidade suprema do povo banto (“Anganga Nzambi”). A palavra está num dos títulos de músicas do disco, “Grande Anganga Muquichi” (um antigo canto), e bastante presente nas letras, o que chamou atenção da dupla. Na canção citada, os versos fazem reverência ao “mestre”, ao “mais velho”.
“Como o passado alimenta o presente, é possível que o presente alimente o passado?”, reverte Cadu Tenório diretamente ao Floga-se, em resumo ao que pretende o trabalho.
O resultado é de uma beleza impressionante (leia aqui a resenha mais detalhada do disco).
Cadu Tenório utilizou sintetizadores, objetos amplificados, microfones de contato, violão e violinos preparados, compôs, gravou e produziu o disco, com Juçara acrescentando sua irretocável interpretação.
A mixagem e masterização couberam ao companheiro de Tenório no Sobre A Máquina, Emygdio Costa.
Ouça na íntegra:
1. Eká
2. Canto II
3. Grande Anganga Muquixe
4. Canto III
5. Canto VI
6. Canto VII
7. Taio
8. Candombe – Ia Cacundê Iauê