Sem maiores blábláblás, vamos a uma grandiosa história que envolve o jargão máximo que tanto nos excita: sexo, drogas e rock’n’roll. Uma história verdadeira e vivida intensamente, tão intensamente que basicamente todos os limites foram testados e – por que não dizer? – ultrapassados. Coitados dos meus pais.
Puta que pariu, a virada dos 80’s pros 90’s foi intensa e provocativa pra muitos caras e garotas, os infernos de São Paulo eram realmente infernos, e não simples casinhas pra ficar dançando o hit da semana, muito pelo contrário. A noite de São Paulo naquela época era tensa, pesada, e como uma bomba-relógio poderia explodir a qualquer instante, bastava uma bituca de cigarro ainda acessa pra que a confusão começasse.
Punks, darks, shinheads, metaleiros, skatistas, todos se esbarravam na Boca do Lixo. Era assim: ou você era bem relacionado, e tinha conhecimento de causa, ou você literalmente estava fodido e tomava um cacete nervoso, simplesmente ou por ser poser ou por estar no local e no horário errados.
Andar na Rua Augusta ou perambular pela Santa Cecília era uma arte, e muito mais, um delicioso frescor de confrontamento sem limites.
Nesse ambiente todo havia uma banda que destoava de tudo, uma banda na qual os três integrantes vestiam preto, mas não eram darks e quando não estavam de preto empunhavam suas vestimentas que só de olhar já gerava barulho. A bandeira levantada era notada quando subiam ao palco, nada de pose, o negócio era um massacre dos tímpanos sem limites: noise, noise intenso e brutal, Jesus & Mary Chain, My Bloody Valentine, Telescopes, Loop, MC5, VU, Spacemen 3, Stooges, barulho gratuito e interminável.
Semanas e semanas, os Pin Ups tocavam no maior inferno que São Paulo já teve, o Retrô, do saudoso Roberto Cotrim. Era a casa da banda, o reduto dos redutos, noites e noites passamos lá dentro fazendo parte da historia vívida, nua e crua.
A trajetória dos Pin Ups originais era assim, infestada de sexo, drogas e rock’n’roll, um troço realmente intenso e foda. O caos estava literalmente inserido ali, quando do lançamento do fundamental “Time Will Burn”.
Era claro que os caras estavam sintonizados com o que acontecia tanto nos Esteites como em Londres.
Fazíamos parte de tudo: shoegazer, noise, música barulhenta pra pessoas selvagens que pouco estavam ligando se haveria futuro ou coisa que o valha. O lance era virar tudo de cabeça pra baixo e vibrar, vibrar ouvindo “Bright”, “You’re Not The One For Me”, “Kill Myself” e o hino “Sonic Butterflies”.
Ouça “Bright”:
Luiz Gustavo, Zé Antonio e Marquinhos, os Pin Ups originais, botaram essa bomba infernal chamada “Time Will Burn” no mundo e jogaram querosene no tempero, facilmente um dos melhores álbuns já lançados nesse pais (Nota do Editor: o disco acabou em 37º lugar entre os “100 Melhores Discos Nacionais De Todos Os Tempos”).
Há mais de vinte anos isso aconteceu. Aquilo era comportamental, confrontador, só quem estava por lá pode falar como era. Retrô, Der Temple, Armagedon e outros infernos da São Paulo da virada dos 80’s pros 90’s, pra estar ligado a aquilo tudo era necessário realmente viver aquilo, porque as coisas eram reais e pesadas, nada de fake. Pra se descolar um álbum do Sonic Youth ou Spacemen 3, por exemplo, ao contrário de hoje, você tinha que ter a manha.
E ainda hoje os reflexos daquela matadora época ecoam na minha mente. Gritos, desespero, brigas, drogas, noites intermináveis, suor, música, os tempos forem cruéis com muitos, mas com outros nem tanto. Alguns sobreviveram e seguiram adiante tentando algum dia fazer com que “Time Will Burn again”… Quem sabe? Qual a dificuldade?
Eu só sei que sempre me vem à cabeça os primeiros versos da abertura do “Time Will Burn”, da trucidante “Sonic Butterflies” – e toda vez que ecoa na minha mente vem esse desejo maldoso e cruel de provocação por pura vontade de ver a reação das pessoas: “when I’m stoned I see sonic butterflies”.
Ouça na íntegra:
Álbum – Time Will Burn
Lançamento – 1990
Selo – Stilleto
Tempo total – 35 minutos e 48 segundos
Produção – Não informado
01. Sonic Butterflies
02. Kill Myself
03. Bright
04. Loose
05. So High
06. Bleed
07. You’re Not The One
08. These Days
09. Hard To Fall
10. Thousand Times
11. The Groover
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Renato Malizia é editor do blogue The Blog That Celebrates Itself.