Ricardo Alexandre é uma boa inspiração pros estudantes e aspirantes a jornalistas.
É só ver o currículo dele. Escreveu na Bizz, na General, Estadão, Superinteressante, Carta Capital, Capricho, Revista MTV, Folha de São Paulo e Revista 89. Foi gerente de conteúdo do Somlivre.com. Foi o diretor de redação responsável pela última etapa da Bizz, que se encerrou em 2007. Assumiu a Trip, abriu seu próprio estúdio de criação editorial. Dirigiu dois documentários imperdíveis, “Napalm: O Som Da Cidade Industrial” e “Júlio Barroso: Marginal Conservador”.
E escreveu livros.
Em 2010, ganhou o Jabuti com a biografia “Nem Vem Que Não Tem: A Vida E O Veneno De Wilson Simonal”, de 2009. Sete anos antes, havia lançado “Dias De Luta: O Rock E O Brasil Dos Anos 80”, livro que apresenta o que foram aqueles anos do nascimento da música jovem no Brasil – e que está sendo relançado agora (dia 16 de abril de 2013, via Arquipélago Editorial – compre aqui), depois de anos fora de circulação e encontrado apenas em negociações pela Internet a preços elevados.
“Dias De Luta…” (veja o site oficial) é o que considero o equivalente nacional ao “Barulho”, de André Barcinski, em termos de importância documental (“Barulho” merece um relançamento tão digno quanto “Dias De Luta…”).
Com o relançamento da obra, o convite pra Ricardo Alexandre participar de “Os Discos Da Vida” foi até óbvio. Ainda bem que ele aceitou: aqui ele mostra dez dos tantos discos que moldaram sua personalidade e sua vida. Um deles, por exemplo, fez Ricardo “virar jornalista”.
Ele virou e fez uma carreira de sucesso, daquelas de servir de inspiração pra tantos outros profissionais que virão por aí.
—
RICARDO ALEXANDRE
The Beatles – “Sgt Pepper’s Lonely Hearts Club Band” (1967)
Menos pela música, e totalmente pela capa. Quando meu pai explicou aquela velha lenda de que os Beatles de terninho estavam sendo velados e os novos e multicoloridos Beatles surgiam em seu lugar, minha cabeça foi levada à estratosfera. Passava dias e dias analisando cada milímetro da capa. Sempre amei música, mas naquele momento entendi que havia todo um universo artístico e comportamental ao redor dos sons que saíam da caixa acústica. Acho que virei jornalista ali, mesmo sem saber.
Ouça “Sgt Peppers Lonely Hearts Club Band” / “With A Little Help From My Friends”:
—
Odair Cabeça De Poeta & Grupo Capote – “O Forró Vai Ser Doutor” (1975)
A beleza da inocência de uma criança é crescer achando que a maior banda do Brasil era o Grupo Capote. Ouvia esse disco em paridade com os do Roberto Carlos e dos Beatles. Só muitos anos depois descobri que era um nugget apadrinhado pelo proscrito Tom Zé e lançado pelo poeirento selo CID. Forrock, vinte anos antes dos Raimundos. Dos “discos perdidos” da MPB, eis um que precisa urgentemente ser redescoberto.
Ouça “O Sertão De Nova York”:
—
Jorge Ben – “Jorge Ben” (1969)
Só fui descobrir que esse disco não era uma coletânea já adulto. Na verdade, é o primeiro álbum do Jorge com o Trio Mocotó, no qual ele grava sua própria versão pra músicas que ele havia dado a outros artistas nos dois anos anteriores. Coisas como “Descobri Que Eu Sou Um Anjo” e mesmo “País Tropical” eram como uma brincadeira delirante, na qual eu era levado a outras realidades. Acho que Jorge provoca isso até hoje em mim.
Ouça “Descobri Que Eu Sou Um Anjo”:
—
Violeta De Outono – “Violeta De Outono” (1987)
Durante os anos 80, era a “minha” banda, a que eu defendia nas discussões contra qualquer fã do RPM, Titãs ou Plebe Rude. O que mais me impressionava no som original do Violeta era a evidente filiação à psicodelia dos anos 60, mas sem soar nem um pouco anacrônico. Eles estavam tão alinhados com Syd Barrett quanto com o Echo & The Bunnymen. Depois, foram melhorando como músicos, ganharam outros atributos, mas perderam esse charme em particular.
Ouça “Declínio De Maio”:
—
Ira! – “Psicoacústica” (1989)
O Ira! foi a primeira banda que assisti ao vivo. Na época do “Vivendo E Não Aprendendo” (1986) e de “Flores Em Você”, eles estavam quase se tornando populares de verdade. Quando voltaram, depois de um tempão sumidos, apresentaram essa espécie de recompensa aos fãs mais fiéis. “Psicoacústica” era, visivelmente, um drible no grande público. Adorava ouvi-lo no fone de ouvido, deitado no chão da sala de casa. Sem contar que “Pegue Essa Arma” me lembrava Violeta de Outono.
Ouça “Pegue Essa Arma”:
—
Voivöd – “Nothingface” (1989)
Quando meus primos se “converteram” ao metal, eu estava mais preocupado nas obscuridades dos anos 60. Mas o que eu vivia era o rock brasileiro dos anos 80. Daí, passado tudo isso, o Voivöd me vem com um disco de metal cerebral, psicodélico, inteligente, repleto de escaninhos (ilustrações malucas, conceitos, cover do Pink Floyd) que parecia juntar tudo o que eu curtia na época e ia além.
Ouça “The Unknown Knows”:
—
Stone Roses – “Stone Roses” (1989)
Essa é a banda da minha vida. Reconheço todas as limitações e todo o hype, mas fazer o quê? Gosto é uma reação orgânica, e o fato de uma banda assim ter surgido naquela época naquelas circunstâncias, na idade que eu tinha, me bateu de um jeito indescritível. Os singles lançados depois são muito melhores e mais ousados, mas foi o LP que soou como se feito pra mim. Conforta saber que estou em companhia de muita gente. O Beckham e o Liam Gallagher que o digam.
Ouça: “She Bangs The Drums”:
—
Chris Isaak – “Baja Sessions” (1996)
Pra entrar definitivamente no clima dessa obra-prima, é preciso casar com o homevideo, que mostra Isaak e sua banda tocando canções semi-acústicas em hotéis e pontos turísticos da Baixa Califórnia, no México. Isaak é um sujeito muito engraçado e consegue transmitir uma fina ironia pro romantismo exacerbado de seu repertório – e do repertório alheio. E canta pacas.
Ouça “Yellow Bird”:
—
Teenage Fanclub – “Grand Prix” (1995)
Quando “Bandwagonesque” saiu, eu tinha a minha própria banda de rock em Jundiaí, e fiquei muito desestimulado por notar que já havia uma banda, profissional e escocesa, fazendo exatamente o que eu sonhava em fazer, com uma qualidade que eu jamais igualaria. “Grand Prix” cristaliza tudo aquilo num álbum pra adultos. Ouço e me emociono até hoje.
Ouça “Don’t Look Back”:
—
Lucas Souza Banda – “Cidade Do Amor” (2009)
Sempre tive muita dificuldade em conciliar minha espiritualidade com meu amor pela música. Isso porque sempre amei música que se impusesse sobre o mercado, e basicamente o que se define como “gospel” no Brasil é música feita pro mercado evangélico. E tanto minha fé quanto meu gosto musical são sagrados demais pra serem barateados assim. Mas Lucas Souza é uma exceção artística num mar de entertainers sorridentes, cantando o amor com delicadeza e elegância eletrificados em tonéis de rock inglês. Pros não-iniciados, recomendo começar por “Teus Olhos, Meus Horizontes”, como eu, por acaso, comecei.
Ouça “Teus Olhos, Meus Horizontes”:
—
Na edição anterior, “Os Discos da Vida: Johnny Hansen”.
Cara, Grand Prix é um dos discos da minha vida!!! Emcionado em ve-lo na sua lista!!!