OS DISCOS DA VIDA: SINGLE PARENTS

A gente acredita que o que faz algumas pessoas se unirem pra formar uma banda é o gosto musical semelhante. Curiosamente, não é isso que temos presenciado nas muitas edições de “Os Discos da Vida”. O motivos não se sabe quais são, mas pouco importa, as bandas se entendem de outras maneiras.

No caso do Single Parents, os quatro integrantes têm traçados musicais bastante similares, girando pela mesma época e pela mesma praia. Há muitos discos em intersecção, como se os sabores sonoros deles se ligassem em vários momentos.

Isso faz do Single Parents melhor que qualquer outra banda que passou por aqui? Certamente não. Mostra que Fernando Dotta, Anderson Lima, Rafael Farah e Erick Alves são amigos até nisso – e, o mais importante, suas listas indicam claramente qual caminho a banda seguiria assim que surgisse, o que de fato aconteceu, no primeiro EP, “Could You Explain?”, de 2010.

O DNA do Single Parents está bem traçado e delineado.

FERNANDO DOTTA (vocal e guitarra)

The Beatles – “A Hard Day’s Night” (1964)
Este é com certeza o álbum que eu mais ouvi na minha infância toda, em viagens de carro com meus pais e meu irmão. É uma das lembranças mais claras que tenho. Engraçado que não me lembro de um dia ou época exata em que me deu um estalo do tipo “caralho, Beatles é bom, hein?”. Parece que nasci gostando. Meus pais adoravam essa primeira fase da banda, grande influência para a Jovem Guarda que eles tanto ouviam e que fez inúmeras versões. Esses álbuns iniciais dos Beatles me trazem boas memórias, meio nostálgico, e sempre achei que o “Hard Day’s Night” tinha os melhores hits, não precisava pular nenhuma faixa do CD. A capa do álbum também é genial, curtia muito procurar qual era a careta mais legal, brisa de criança.

Ouça “I’m Happy Just To Dance With You”:

Nirvana – “Nevermind” (1991)
O CD que me salvou no colégio. Que me deu gás pra estudar pra provas de matemática. Que me trouxe minha primeira guitarra aos 13. Que me moldou musicalmente e que soa sempre atual. É a obra-prima do Nirvana e dos anos 1990, acabou com a hegemonia de Michael Jackson, Madonna e do pop que dominava as rádios. Foi um dos primeiros CDS que eu comprei e aprendi a tirar na guitarra todas as músicas, gostava de tocar sempre na ordem das faixas. Foi o álbum que eu mais ouvi na adolescência e talvez na vida. Sempre que alguém num ensaio de banda puxava um “Smells Like Teen Spirit”, era só alegria misturada com sentimento de rebeldia+guitar-hero+vamo-quebrar-tudo-mas-não-posso-porque-tenho-só-essa-guita-e-dependo-de-mesada. O álbum perfeito.

Ouça “Drain You”:

Radiohead – “Pablo Honey” (1993)
Fui procurar sobre Radiohead na fase do “Amnesiac”, que falavam tanto da banda com idolatria xiita vinda do “OK Computer”, mas em 2001 aquilo não fazia sentido pra mim. Eletrônico? Pfff… O que eu conhecia de Radiohead eu levemente ignorava, só “Creep”, “High & Dry” e “Fake Plastic Trees”. Pra mim aquilo era o suficiente. Até que um dia fui à Nuvem Nove (extinta e excelente loja de discos de SP) e trocando idéia com outro cliente, vi ele levando o “The Bends”. Cheguei pro cara meio curioso, falei: “quais são os álbuns bons do Radiohead? Aliás, quantos eles têm?”. Ele me perguntou quais bandas eu ouvia e me disse “então, leva esse aqui, já tenho, discaço! Depois, talvez, você vá gostar dessa nova fase deles, ninguém curte ou entende qual é de primeira”. Achei meio blasé mas fui na dele, comprei o “Pablo Honey”. Acho esse álbum muito representativo pra época da explosão do grunge, quando chegou ao Reino Unido. As linhas de guitarra do Greenwood são excelentes, timbre sensacional! O quase-jovem Thom Yorke de cabelo descolorido e deprimido com letras amorosas, criador de vários hits. Acho um álbum bem maduro pra uma estréia. Músicas simples em sua construção que fazem “Anyone Can Play Guitar” até parecer verdadeiro, mas Radiohead ao vivo mostra que vai muito além disso. É sempre bom ouvir o álbum e rever o DVD do show deles no Astoria dessa turnê pra entender como foi o começo de tudo e que Radiohead já foi uma guitar band.

Ouça “I Can’t”:

Sonic Youth – “Rather Ripped” (2006)
Puta banda complicada. No Claro Que É Rock de 2005, eu assisti com uma cara de “que porra é essa que tá acontecendo no palco?”. Foi a banda que eu aprendi a gostar, idolatrar, expandiu meu gosto musical radicalmente, abrindo um leque gigante de influências, um caminho sem volta. Acho que ninguém nasce gostando de Sonic Youth, acho uma banda “ame/odeie”, não dá pra ficar indiferente. Escolhi esse álbum porque foi o mais significativo pra minha relação com eles e com a banda que eu toco. Talvez o CD mais fácil numa primeira audição (se comparado com o resto da extensa discografia da banda) e que me fez insistir na idéia de “quero ter uma banda assim”. Quem me mostrou “Incinerate” foi o Anderson (baixista), quando ainda não tínhamos muita idéia do que queríamos pro som da nossa possível-futura banda, e eu sempre ia na casa dele para ouvirmos uma porrada de sons que curtíamos em comum. A música bateu de primeira, deixei num repeat que durou dias, então resolvi comprar o “Rather Ripped”. Fiquei intrigado de cara com todos efeitos que saíam das guitarras e não fazia idéia de como eram tocados. Quando tentava tirar de ouvido as músicas não conseguia, aí fui ver que as afinações eram todas diferentes, surtei! “Como não pensei nisso antes? Como ninguém me mostrou isso antes?”. Aí comecei a baixar todos os álbuns da bandas e à medida que ia ouvindo, lembrava de algumas que soavam familiares, que já tinha visto na MTV ou ouvido na casa de alguém mas que passou desapercebido até então. Hoje em dia é a banda que eu mais admiro e esse é o álbum que eu sempre deixarei na cabeceira da cama.

Ouça “Pink Steam”:

Arctic Monkeys – “Whatever People Say I Am, That’s What I’m Not” (2006)
Deixei esse álbum por último porque não tinha idéia por onde começar a falar dele, especialmente dessa banda. Pode parecer exagero, mas eu acho o Arctic Monkeys impecável em todos os trabalhos que executa e que desde o início têm um senso de humor esperto em vídeos e entrevistas que não se via desde os Beatles. Acompanhei por blogues o nascimento do hype em cima da banda e ouvia as demos de 2005 pensando “porra, são um ano mais novo que eu”. Eis que sai o disco em 2006 e explode, tiram do Oasis a marca de álbum que vendeu mais rápido no Reino Unido. Quase toda semana, capa da NME, idolatria geral. Comparações com Libertines, The Clash, Strokes eram freqüentes, mas esses nunca me causaram o mesmo impacto. Um álbum rápido, com excelente escolha da sequência das faixas (gás inicial absurdo e ao longo do disco você percebe que a banda não vive só disso, vem coisa melhor por aí). Bateria acelerada, rifes de guitarra grudentos, melodias marcantes e belas letras do talentoso Alex Turner dão identidade ao som e fazem parecer fácil montar uma banda com os amigos de escola e ter sucesso. Sempre achei que o Arctic Monkeys correu em paralelo e independente ao que aconteceu no indie britânico e por isso foram certeiros, não seguiram tendências. Não acho que eles salvaram o rock, mas sim uma geração, e vêm fazendo isso com classe.

Ouça “A Certain Romance”:

ANDERSON LIMA (baixo)

Nirvana – “Nevermind” (1991)
Não poderia ser mais clichê ter o “Nevermind” no topo da lista, mas foda-se, é a mais pura verdade. Este álbum revolucionou tudo. Acho que musicalmente, penso em termos de antes e depois dele. É um disco que todas as músicas são boas, pesadas e barulhentas, mas todas as melodias são bonitas. É tão marcante que é inútil ficar falando, o negócio é sentar, ouvir e pronto.

Ouça “Smells Like Teen Spirit”:

Red Hot Chili Peppers – “Blood Sugar Sex Magik” (1991)
Na minha opinião é o disco mais importante do RHCP. Foi o segundo com o John Frusciante na guitarra, o que levou a um entrosamento maior da banda e resultou em ótimas músicas. Sem contar as linhas de baixo do Flea que falam com a mesma importância de uma guitarra ou de qualquer instrumento de linha de frente, o que despertou meu interesse pelo contrabaixo.

Ouça: “Suck My Kiss”:

Guns N’Roses – “Appetite For Destruction” (1987)
Até então eu só escutava os pops dos anos 80, quando apareceu o Guns N’Roses com um som que era exatamente o contrário do que estava rolando: pesado, gritado e quebrando tudo. Gosto muito do timbre de baixo desse disco, o Duff usava um fender jazz bass especial que era um misto de precision e jazz bass, e amplificadores Gallien-Krueger bem roncados, com ótimos graves. É uma pena que a banda tenha se perdido ao longo dos anos.

Ouça “Paradise City”:

Pearl Jam – “Ten” (1991)
A voz do Eddie Vedder era diferente de tudo o que eu já tinha ouvido antes e as músicas têm um instrumental forte e integrado, com ótimas melodias e letras profundas. Além disso, a energia de palco dos caras é única e renderam apresentações e clipes clássicos como Even Flow e Alive.

Ouça “Why Go”:

Foo Fighters – “Wasting Light” (2011)
É o resgate ao rock agressivo e sujo que estava esquecido nos últimos anos. A produção ficou por conta de Butch Vig, que também trabalhou com Dave em “Nevermind” e contou também com a participação de Krist Novoselic e Bob Mould. O legal é que a gravação do disco é analógica então isso dá uma sonoridade mais quente para o álbum.

Ouça “Zombie”:

RAFAEL FARAH (bateria)

“Os cinco discos da minha vida não são os discos que eu elegeria como os melhores cinco discos que já ouvi em toda minha vida, alguns estão bem longe disso. Fiz esta seleção pensando naqueles que me influenciaram e me moldaram musicalmente, e que, caso não tivesse os escutado, com certeza hoje não estaria aqui. Em ordem cronológica:”

Sepultura – “Chaos A.D.” (1993)
Foi meu primeiro disco de rock, comprei quando tinha uns sete anos. Lembro que não sabia muito bem do que se tratava, mas era alguma coisa bem barulhenta e que me fazia sentir bem quando escutava. Algo que não era me passado quando ouvia as “sete melhores da Pan”, outras coisas na rádio ou nos discos dos meus pais. A partir daí comecei a gostar de rock, principalmente metal. De fato, o “Chaos A.D.” é um puta álbum e em minha opinião é disparado o melhor trabalho da banda. Foram os pioneiros a misturar a agressividade do metal aos ritmos e percussões tribais africanos e indígenas brasileiros, o que dá uma dinâmica frenética a todo o álbum. Assim, o Sepultura conseguiu dar mais ritmo ao trash metal/hardcore caracterizado por sua percussão rápida e precisa. Um disco cru, de peso e ritmo únicos para o gênero musical.

Ouça “Slave New World”:

Nirvana – “In Utero” (1993) (N.E.: Rafael fez um texto apenas, válido pra esse disco e pro próximo)
“In Utero” foi lançado no mesmo ano que o “Chaos A.D.”, mas só o descobri uns três anos depois. Com ele conheci o grunge/garage punk e entendi que o rock poderia ser mais objetivo, simples e com belas melodias sem perder o peso. Pouco tempo depois descobri Ramones, o que reforçou mais ainda esse conceito. “O In Utero” foi o primeiro que escutei do Nirvana e é o meu preferido até hoje. Os três são geniais, mas esse é especial. Um disco de volta às origens, sujo e cru, pra esquecer o verso-refrão-verso do “Nevermind”. Quase uma auto-biografia do Kurt Coubain no auge da sua depressão. Intenso. O auto-intitulado álbum de estréia dos Ramones também foi o primeiro que ouvi da banda e mudou completamente meus parâmetros de música, assim como mudou foi pra toda uma geração. Com a simplicidade dos três acordes, músicas rápidas, diretas, a banda foi responsável por inúmeros hinos do rock.

Ouça “Frances Farmer Will Have Her Revenge On Seattle”:

Ramones – “Ramones” (1976) (N.E.: Rafael fez um texto apenas, válido pra esse disco e pro anterior)
“In Utero” foi lançado no mesmo ano que o “Chaos A.D.”, mas só o descobri uns três anos depois. Com ele conheci o grunge/garage punk e entendi que o rock poderia ser mais objetivo, simples e com belas melodias sem perder o peso. Pouco tempo depois descobri Ramones, o que reforçou mais ainda esse conceito. “O In Utero” foi o primeiro que escutei do Nirvana e é o meu preferido até hoje. Os três são geniais, mas esse é especial. Um disco de volta às origens, sujo e cru, pra esquecer o verso-refrão-verso do “Nevermind”. Quase uma auto-biografia do Kurt Coubain no auge da sua depressão. Intenso. O auto-intitulado álbum de estréia dos Ramones também foi o primeiro que ouvi da banda e mudou completamente meus parâmetros de música, assim como mudou foi pra toda uma geração. Com a simplicidade dos três acordes, músicas rápidas, diretas, a banda foi responsável por inúmeros hinos do rock.

Ouça “Beat On The Brat”:

The Beatles – “Revolver” (1966)
“Revolver” é o meu favorito, mas aqui deveria ser citada toda a discografia, b-sides, os trabalhos solo de cada integrante. Conhecer a fundo os Beatles é uma experiência única pra quem gosta de música. Não tem nenhum outro artista que possa proporcionar algo parecido. São os verdadeiros gênios da música, disparados. Me fizeram repensar tudo o que eu achava saber sobre música.

Ouça “Good Day Sunshine”:

Hefner – “The Fidelity Wars” (1999)
O Hefner foi a primeira banda que ouvi e que nenhum dos meus amigos conhecia (e meus amigos sempre foram do tipo que gostavam bastante de música). Não lembro como tive contato com a banda, mas lembro que fiquei indignado como uma banda tão legal poderia ser tão desconhecida. Foi a partir daí que comecei com o hábito de ir atrás de novos artistas. Também foi uma das primeiras bandas de indie-rock que ouvi. A banda lançou ótimos álbuns como o “The Fidelity Wars”, “We Love The City” e “Dead Media”. O “Fidelity Wars” é o que mais gosto, as músicas são baladinhas-indie e as letras deprimentes, destacando o álcool e o cigarro com escape pro sofrimento amoroso.

Ouça: “I Love Only You”:

ERICK ALVES (guitarra)

Nirvana – “Nevermind” (1991)
Ao ouvir este álbum, minha concepção sobre música, principalmente rock e tudo que já tinha ouvido antes, pareceu meio que “leve e bobo”. Um álbum que deve ser escutado e apreciado pra toda a vida.

Ouça “In Bloom”:

My Bloody Valentine – “Loveless” (1991)
A harmonia de distorções e microfonias neste álbum é assustadora. É como se tivesse um maestro regendo todo aquele barulho e entregando ao ouvido uma melodia hipnotizante que vicia. Ninguém nunca mais é o mesmo depois deste álbum. Obrigatório para quem curte shoegaze.

Ouça “Only Shallow”:

The Beatles – “Revolver” (1966)
É difícil achar um álbum dos beatles que não seja bom, mas “Revolver” é um álbum único. Começou a modelar o que seria o “Sgt Pepper’s”, e deu continuidade nas viagens de “Rubber Soul”, se tornando um disco único e importante para história do rock.

Ouça “She Said She Said”:

The Cure – “Wish” (1992)
O melhor álbum de Cure ao lado do “Disintegration”. Belos timbres de guitarras, ótimas linhas de baixo (que sempre foram boas) e a sempre ótima voz de Robert Smith seduzindo todos os espaços da sua mente. Recomendado!

Ouça “A Letter To Elise”:

Sonic Youth – “Rather Ripped” (2006)
Apontar um álbum que mexe com todos seus sentidos é fácil quando se escuta esse do Sonic: todas as distorções, afinações, e ruídos já carecteristicos da banda em sua forma plena. Quem escuta “Incinerate” e não se arrepia, por favor se jogue do mais alto prédio que encontrar.

Ouça “Incinerate”:

Na próxima edição de “Os Discos da Vida”, Top Surprise.

Na edição anterior, “Os Discos da Vida: Locomotiva Discos”.

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Comentários

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4 comentários

  1. Lembro até hoje a primeira vez que ouvi “Incinerate”. Acho que foi na MTV, num clipe que passava nas madrugadas. Eu não entendi muito bem o quando aquela música soava acústica e ao mesmo tempo suja, violenta. É tipo um doce com um recheio salgado. É a minha canção favorita do Sonic youth até hoje.

  2. Putz, Hefner, Sonic Youth e My Bloody Valentine no meio. E depois ainda tem gente com coragem de dizer que tem poucos brasileiros com bom gosto. Discordo totalmente!
    E Marcos, “Incinerate” continua minha favorita até hoje também; ainda que, nos meus tempos no interioRRR, eu achava o máximo ver o Jason Lee desfilando o skate dele no “100%” haha.

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