OS DISCOS DA VIDA: STARFIRE CONNECTIVE SOUND

O Starfire Connective Sound lançou o primeiro EP (homônimo) este ano, há poucos meses, e já chamou atenção dos blogues e sites mais espertos mundo afora. Não é pra menos. Al Schenkel, o homem que encabeça o projeto, é um profundo adorar de guitarras rasgadas, microfonias e afins, colocando o quanto pode de suas predileções musicais nas músicas do seu alter-ego sonoro, e criando canções sem fronteiras.

A questão é: que predileções são essas?

Nessa nova edição de “Os Discos da Vida”, Al se desdobra pra escolher (apenas) dez discos que mudaram sua maneira de ver a vida – e que ajudarão seus fãs a entender o Starfire Connective Sound um pouco mais.

Direto de Criciúma, Santa Catarina, Al Schenkel e sua modelagem musical:

Nirvana – “In Utero” (1993)
Esta sem dúvida nenhuma foi a banda que alimentou a minha vontade de aprender a tocar guitarra e montar uma banda. A ligação com a sonoridade feita pelo trio causou-me efeitos irreversíveis desde as primeiras audições e serviu como primeiro contato com o então aclamado rock alternativo americano, tornando-se um agravante pra minha paixão por guitarras altamente distorcidas e exorcismos envolvendo simplicidade e sinceridade. Eu poderia citar qualquer disco do Nirvana nesta lista, mas como tive contato com todos eles praticamente ao mesmo tempo, escolhi “In Utero”, como um dos meus primeiros tíquetes para um mundo que existia longe do poder das FMs. Canções como “Milk It”, “Scentless Apprendice”, “All Apologies”, “Dumb” e “Radio Friendly Unit Shifter” sempre serão ótimas referências e lembranças de como tudo começou pra mim.

Ouça “All Apologies”:

The Fall – “Bend Sinister” (1986)
Sempre tive uma queda por coisas estranhas, sonoridades caóticas e experimentações dentro da música. Tive contato com o The Fall, do incansável Mark E. Smith, por parte de um amigo mais velho em Novo Hamburgo, Rio Grande do Sul, através deste disco. Costumávamos nos reunir na casa dele para beber e ouvir música nos finais de semana e “Bend Sinister” me pegou de assalto, entre muitas outras preciosidades que íamos descobrindo. Os vocais anasalados, os ambientes meio caóticos e as letras ácidas e desoncertantes foram um prato cheio pra mim nesta longa e infinita jornada de esquisitices sonoras e descobertas memoráveis. “Bend Sinister”, ao lado “The Franz Experiment”, é considerado de longe as duas maiores obras da banda e este disco foi um dos mais frequentes a visitar meu primeiro toca-discos, até o dia em que o esqueci em cima da escrivaninha no meu quarto de frente pra janela em um dia de sol escaldante. Não deu outra, o disco enpenou totalmente e as desculpas pela perda dele ainda rolam até hoje (risos).

Ouça “Shoulder Pads 1”:

Sonic Youth – “Sister” (1987)
O quarto disco do Sonic Youth foi meu primeiro contato com a obra inteira desta banda que considero motivo de culto pessoal. As circunstâncias que envolveram a primeira audição foram as mesmas que aconteceram com o The Fall, em uma época em que a Internet não estava presente na minha vida e que a única forma de conhecimento de bandas pouco divulgadas era através de troca de informações com amigos mais velhos, visitas a sebos e reuniões pra beberragens, onde o assunto que predominava era música underground e literatura marginal. “Sister” e as dissonâncias e climas tornaram-se logo referências diretas pra entender toda a essência do alt-rock e suas filiações diretas e indiretas com bandas que o Sonic Youth viria a influenciar, e bandas que influenciaram Thurston e cia. Um disco genial, que complementa décadas de belíssimos trabalhos junto de uma das bandas mais originais da história.

Ouça “Schizophrenia”:

Viana Moog – “Boemia Adolescente Após Os 30 EP” (2002)
Meu primeiro contato com uma banda nacional, dentro dos padrões do que eu ouvia, foi através da Viana Moog, banda de São Leopoldo, Rio Grande do Sul. Ela continua cada vez melhor e na ativa até os dias de hoje. Lembro-me extamente do lançamento deste EP, há pouco mais que uma década, com gravações lo-fi, misturadas à essência proto-punk e influências diretas de guitar bands norte-americanas: eram motivo de verdadeiro culto nas noitadas undergrounds que rondavam a região do Vale dos Sinos, entre Novo Hamburgo e São Leopoldo, principalmente. A relação com a banda era direta e os shows, apesar de terem um público razoável, eram conpensados por devotos de Everton Cidade e cia. em apresentações fervorosas e caóticas, onde as letras curtas e ácidas eram empunhadas por todos os presentes.

Ouça o disco na íntegra:

The Birthday Party – “Prayers On Fire” (1981)
A relevância e importância de Nick Cave para a música mundial é inquestionável, seja ao lado dos Bad Seeds, do Boys Next Doors ou do Grinderman. Mas foi com o The Birthday Party que o negócio me pegou de jeito. A mistura de post-punk, no-wave em tons góticos totalmente caóticos, guiados pela voz cavernosa de Cave, e pelos instrumentais desgovernados de Harvey, Pew, Calvert e S. Howard, foi a primeira coisa que ouvi nesta linha e que serviu para aumentar a minha curiosidade por bandas que exerciam a mesma sonoridade desses australianos. N”ick The Stripper”, “Zoo-Music Girl”, “A Dead Song” e “Kathy Kisses”, que são encontradas neste disco de estreia dos caras, são algumas das canções mais dementes deste mundo, sem dúvida alguma!

Ouça “Nick The Stripper”:

The Velvet Underground – “The Velvet Underground And Nico” (1967)
Fui conhecer Velvet Underground através do soundtrack do filme “The Doors”, do Oliver Stone. Lembro que na época eu estava em Torres, Rio Grande do Sul, e não tinha jeito de descolar algum material da banda, sendo que ninguém conhecia ou jamais tinha ouvido falar deles e o processo do MP3 ainda estava em baixa por aqueles lados. Somente algum tempo depois consegui ouvir o primeiro disco e vi que “Heroin” era apenas uma prévia de uma obra maravilhosa que estava se abrindo pra mim e mudando novamente toda a minha concepção de música e arte. Lou Reed, Sterling Morrison, Moe Tucker e Nico compuseram algumas das músicas mais sensacionais já feitas neste mundo e até hoje servem como referência maior para algumas das bandas que mais sou aficcionado. Tão importantes quanto os Beatles, se não mais…

Ouça “Heroin”:

Flaming Lips – “Hear It Is” (1986)
Antes de entrarem de cabeça na psicodelia que os caracteriza hoje e atingirem um massivo número de fãs por com seu sucesso comercial, o Flaming Lips era uma das bandas mais bacanas do rock alternativo norte-americano e foram responsáveis por grandiosos e barulhentos álbuns lançados até a metade da década de 90. A primeira vez que ouvi a banda foi através de uma compilação caseira feita por um amigo de um amigo, numa K7 contendo canções de “Hear It Is”, “Oh My Gawd!!!” e “Telephatic Surgery”, os três primeiros álbuns dos caras. A paixão foi instantânea logo quando me deparei com os títulos de algumas canções: “Jesus Shottin’ Heroin”, “Charles Manson Blues” e outras, aumentando esta fissura pelas pirações da banda a cada audição. Eu poderia citar qualquer um destes três primeiros discos, mas “Hear It Is”, o primeiro dos lábios flamejantes, sem dúvida alguma é o mais demente, e canções como “With You”, “She Is Death”, “Just Like Before” e as já citadas fazem parte da minha vida de modo que certamente sempre irão me acompanhar.

Ouça: “Jesus Shootin’ Heroin”:

My Bloody Valentine – “Ins’t Anything” (1988)
Meu primeiro contato com o shoegaze ocorreu diretamente da fonte, com o primeiro disco cheio desta banda irlandesa chamada My Bloody Valentine. O primeiro contato foi como um choque, pois não havia nada parecido que houvesse passado pelas minhas mãos ainda até o momento. Uma vastidão de densidade, melancolia, atmosferas carregadas e ao mesmo tempo beleza, uma beleza assombrosa, capaz de derreter geleiras em meio aos caos sonoro e etéreo, produzido por Kevin Shields, Bilinda Butcher, Colm Ó Cíosóig e Debbie Googe. Seria totalmente injusto não listá-los aqui, sendo que a cada 10 bandas que gosto, 9 são diretamente influenciadas pelo quarteto. Uma das bandas mais inovadoras e que magistralmente redefiniram a música que vinha sendo feita nos anos 90 e continuam inspirando dia-após-dia centenas de novas bandas.

Ouça “Soft As Snow (But Warm Inside)”:

Yo La Tengo – “Electr-O-Pura” (1995)
Se não me engano, eu devia ter uns 14 pra 15 anos quando vi/ouvi o Yo La Tengo pela primeira vez. O contato foi através de um programa da TV Cultura chamado Alto Falante, mas a música em questão não me vem à memória de jeito algum. Passados alguns anos sem ouvir falar novamente na banda, tive uma surpresa ao me deparar com uma boa quantia de CDs da discografia deles em uma promoção inacreditável: cada CD por R$ 5,00. Minha alegria naquele dia foi enorme, não só pelo valor das obras mas por ter reencontrado uma banda que havia me despertado o interesse de forma tão acessível e inesperada. “Electro-O-Pura”, o sétimo disco do trio de Hoboken, New Jersey, é meu favorito dentre tantos trabalhos lançados nestas décadas de pura dedicação a música e baixo reconhecimento. Uma fusão perfeita entre Sonic Youth e Velvet Underground!

Ouça “Tom Courtenay”:

Urusei Yatsura – “We Are Urusei Yatsura” (1996)
A discografia desta banda pouco conhecida, vinda de Glasgow, Escócia, é uma das coisas mais incríveis deste mundo. São três discos de estúdio e uma porrada de singles e EPs que transbordam noise-pop, lo-fi e alt-rock por todos os lados. A banda esteve na ativa de 1993 até 2001 e hoje em dia alguns dos membros ainda trabalham junto, porém em outro projeto, intitulado Projekt A-Ko. Sua sonoridade recebe influências diretas de nome como Pavement, Sebadoh, Pixies, Sonic Youth, Yo La Tengo e Dinosaur Jr., o que já é um ponto muito positivo. Fiquei na dúvida de qual disco deles colocaria na lista mas resolvi escolher o segundo da carreira pelo fato de ter sido o primeiro que tive contato e por conter minhas canções preferidas: “Kewpies Like Watermelons”, “Plastic Ashtray”, “First Day On A New Planet” e “Phasers On Sun/Sola Kola”. Melodias assoviáveis com guitarras super distorcidas, microfonias e dissonâncias de primeira.

Ouça “Kewpies Like Watermelon”:

Na próxima edição de “Os Discos da Vida”, Hirofante Púrpura.

Na edição anterior, “Os Discos da Vida: @indiedadepre”.

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