Esse é a primeira edição de “Os Discos da Vida” com um protagonista internacional. Wayne Hussey é o vocalista e guitarrista do The Mission (e do Sisters Of Mercy), inglês de nascimento e brasileiro por escolha (casado com uma brasileira e residente no interior de São Paulo, onde tem seu estúdio pessoal).
Apesar dessa proximidade com o Brasil, é um tanto raro vê-lo ao vivo por aqui. O Mission tocou recentemente no Cine Joia e Wayne Hussey fará uma apresentação solo especial em São Paulo, o que torna cada show algo imperdível.
Mais do que isso, é uma das edições mais divertidas. Hussey entrou no jogo com dedicação, sem medo de expor várias curiosidades de sua vida: o disco que mais ouvia quando fumava “um cigarro engraçado”, o disco que o fez desistir de querer ser jogador de futebol (do Liverpool), seus guitarristas preferidos, seu vocalista preferido, seu disco pra corações partidos, seu disco pra pra se encher de ácido e algumas outras grandes surpresas.
Hussey com o Mission e o Sisters Of Mercy também fez a minha cabeça na adolescência (basicamente, em 1985, 1986, 1987) e agora é uma honra descobrir e publicar quais são os discos que mudaram a vida dele.
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WAYNE HUSSEY
“Ok, here you go – e mais menções honrosas: Radiohead, Beatles, Massive Attack, Bob Dylan, Robert Johnson, Miles Davis, Rolling Stones, Ray Charles, Al Green, David Bowie, Billie Holliday, PJ Harvey, Blind Willie McTell, Fiona Apple, Hank Williams, Johnny Cash, Kate Bush, Texas Alexander, pre 1973 Rod Stewart, Peter Green & Fleetwood Mac, 70’s Stevie Wonder, Charlie Patton, Bukka White, Blind Lemon Jefferson, Blind Willie Johnson, early Talking Heads, early Pink Floyd etc etc…”.
T. Rex – “Electric Warrior” (1971)
Marc Bolan é o responsável por eu me decidir ser um pop star. Antes, eu tava pra ser jogador de futebol e jogar no Liverpool. Mas, depois de ver o T. Rex na TV pela primeira vez, com “Get It On”, ser um pop star pareceu ser um trabalho mais fácil e Marc Bolan tinha cabelos melhores que qualquer jogador de futebol que eu já havia visto. O resto, como dizem, é história. “Electric Warrior” até hoje soa fantástico, vivo, e de alguma forma bem sexual. Meu primeiro, e duradouro, amor.
Ouça “Jeepster”:
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Television – “Marquee Moon” (1977)
Esse disco foi lançado na época em que saí da casa dos meus pais, em Bristol, e me mudei pra Liverpool. Foi a trilha sonora do meu primeiro ano na grande cidade dos Beatles e das glórias futebolísticas, vivendo num úmido e frio quitinete. Amo as guitarras e o modo que os dois guitarristas, Tom Verlaine & Richard Lloyd, trabalham juntos nesse álbum. Foi revolucionário pros meus ouvidos na época e eu diria que Verlaine, além do Neil Young, foi uma das grandes influências pro meu jeito de tocar guitarra e ambos ainda permanecem como meus favoritos.
Ouça “Marquee Moon”:
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Frank Sinatra – Only The Lonely” (1958)
Esse é de longe o mais triste dos discos de Frank Sinatra. Era um disco gótico muito antes do termo existir. Basicamente, esse é o disco da separação de Frank com Ava Gardner e foi um consolo pra muitos momentos na minha vida, quando tive que encarar meus próprios desgostos e desesperos com o amor. Não importa o quão pra baixo e triste você está, esse disco sempre vai te levantar, porque o cara que canta essas canções fabulosas está numa ainda pior do que você. Fantástico.
Ouça “Only The Lonely”:
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Primal Scream – “Screamadelica” (1991)
O disco foi lançado no final de 1990, começo de 1991, não lembro ao certo (N.E.: foi em 1991), mas o lançamento coincide com meu primeiro uso contínuo de ecstasy. E o disco é a trilha sonora perfeita pra uma viagem completa (N.E.: segue a descrição mais apropriada do original em inglês: “with the anticipation after you’ve just dropped it, to the first rush and then exhilaration, then the trippy part before the come down starts”). “Higher Than The Sun” é um dos singles dos 90’s, na minha opinião e encapsula lindamente a época.
Ouça “Higher Than The Sun”:
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Neil Young – “Decade” (1977)
Agora, eu tenho mais de trinta disco do Neil Young e, junto com Dylan e Lennon, é um dos meus favoritos compositores, além de eu ser totalmente obcecado pela sua forma de tocar guitarra. Ele pode cru e rústico, mas em seguida, suave e sutil, tudo num único solo de guitarra. E sua voz é extraordinária. Ele deu esperança a todo mundo que queria ser cantor, porque sua voz não segue regras, não está sempre no tom, não tem sempre certeza pra onde está indo, mas é sempre única e cativante. “Decade” é o primeiro disco do Neil Young que tive (não posso dizer que comprei, já que roubei esse triplo vinil da Virgin quando era adolescente) e é basicamente uma compilação e é uma ótima introdução pra obra dele. E| inclui “Like A Hurricane”, canção que nós, o The Mission, gravamos e lançamos como um single duplo “lado a”, em vinil (lembra disso?), lá em 1986.
Ouça “Like A Hurricane”:
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Can – “Tago Mago” (1971)
Can era a banda que comecei a ouvir quando vivi em Liverpool e comecei a fumar alguns cigarros divertidos. De alguma forma, montado naquela fumaceira, essa música bem complexa e improvisada em sua maioria fazia perfeito sentido. E ainda faz, embora os cigarros há muito tenham sido extintos. Vamos só dizer que esse não é um álbum que minha mãe gostaria, é um pouco além disso, mas todos nós precisamos disso em nossas vidas, às vezes.
Ouça “Mushroom”:
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The Waterboys – “This Is The Sea” (1985)
Primeira vez que ouvi o The Waterboys foi quando tocava guitarra no Sisters Of Mercy e tocamos juntos num festival na Alemanha, por volta de 1984-1985, com o Frank Zappa de headline e o Waterboys logo depois de nós. Amei o som ruidoso deles. Amei a barulheira. Então esse disco surgiu e é poesia. As letras deste disco são maravilhosamente uma afirmação da vida, uma posição que tentei adotar nas minhas próprias letras. E esse disco apresenta “The Whole Of The Moon”, um dos melhores singles de todos os tempos (N.E.: Hussey reforçou “todos os tempos”). Mike Scott, tão doido quanto um escocês que deseja ser irlandês, mas um letrista genial, está lado a lado com Dylan, nesse momento.
Ouça “The Whole Of The Moon”:
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Talk Talk – “Spirit Of Eden” (1988)
Embora esse álbum tenha agora mais de vinte anos, é de fato uma recente descoberta pra mim, talvez de um ano atrás, e eu adoro o humor dele e queria ser corajoso o suficiente pra fazer um disco que não deve nada a ninguém a não ser à necessidade de fazer música. Isso é genial e tão a frente do seu tempo que continua soando a frente do que está acontecendo agora. Impossível de categorizar – é blues, jazz, rock, chillout, bliss out, soundscapes, com a voz frágil de Mark Hollis colocando a poesia lá em cima. Apaixonante. Minha corrente paixão.
Ouça “Desire”:
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John Lennon – “Plastic Ono Band” (1970)
Bem, poderia facilmente incluir qualquer um da série de discos dos Beatles nesta lista, eles foram onipresentes no meu crescimento, e eu veria “A Hard Days Night” na tevê todo Natal e desejar que o Papai Noel pudesse consertar tudo e eu seria um Beatle também, mas isso nunca aconteceu e o Papai Noel desapareceu. E com o o sumiço do Papai Noel veio esse clássico do meu Beatle favorito. É despojado até o osso musicalmente, emocionalmente, e poeticamente e é, em muitos aspectos, a completa antítese de alguns dos discos póstumos dos Beatles (ainda que fabulosos). Prova que você pode fazer um disco que cativa o ouvinte com algo mínimo. Ainda sinto muita falta de Lennon.
Ouça “Mother”:
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The Beach Boys – “Pet Sounds” (1966)
O que posso dizer? É provavelmente o maior disco pop já feito. Me deparei com ele no final dos anos 1980, enquanto escrevia e gravava um disco do Mission e embora não tenha uma óbvia influência nas músicas, é um disco que nunca canso de ouvir. Canções que são lindamente escritas e realizadas e que ressoam e tem a habilidade de tocar a alma, independente da sua idade, é algo que que todo músico aspira. Sei porque eu aspiro. E inclui o hino “God Only Knows”, que é uma das únicas duas canções que eu queria que tocasse no meu funeral e que tem uma das melhores aberturas de qualquer canção de amor jamais feita – “I may not always love you but long as there are stars above you…”.
Ouça “God Only Knows”:
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Na edição anterior, “Os Discos da Vida: Firefriend”.
As escolhas de Wayne Hussey são interessantes e revelam maturidade, ecletismo e também classicismo. “Plastic Ono Band” e “Pet Sounds” são imortais e a inclusão de discos dos Television e Can demonstram que o líder dos Mission aprecia o virtuosismo e o improviso. Palmas para a inclusão de “This Is The Sea”, porque os Waterboys foram uma grande banda, bem como a menção a “Spirit Of Eden”, uma vez que os Talk Talk confeccionaram boas canções e negligenciaram os aspetos lucrativos da sua arte. Combinar o “Electric Warrior” dos T.Rex com Frank Sinatra é quase um exercício de malabarismo, mas os dois álbuns facilmente seriam levados para uma ilha deserta.
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