PENSE OU DANCE: ALGO PELO QUAL VALE A PENA LUTAR

Reclamamos com bastante vigor sobre como o mercado é cruel com as bandas nacionais fora do âmbito da música superpopular brasileira (aquela que toca em rádio, novela, programas de auditório em televisão aberta, propagandas e que comanda as vendas – e, claro, o grande público).

A esses artistas fora do mercado poucas portas se abrem. Eles se alimentam da abnegação, da vontade de continuar criando, tocando, produzindo, até que a vida lhes apresente soluções mais rentáveis, ou “pé-no-chão”, pra abater as responsabilidades cada vez maiores. Em outras palavras, não é um cenário pra crianças brincando de ser músicos.

Mas bem podia ser. Crianças brincando de ser músicos, de ser astros do rock, mesmo que por breves períodos, podem criar aquela obra histórica, ou aquela música que vai mudar a vida de alguém. E já terá valido a pena. Não é preciso uma carreira longeva e bilionária pra que sua existência faça sentido.

O problema é que há cada vez menos gente disposta a pagar por isso, por uma obra desguarnecida dos arbítrios jurídicos das grandes gravadoras. Esses artistas jogam a obra na Internet, de certa forma torcendo pra que alguém ouça. Mas são precisos quantos “alguéns” pra que valha o esforço? A resposta varia de artista pra artista, de ambição pra ambição, de desejo de reconhecimento pra desejo de reconhecimento.

Do lado de cá, de quem gosta e deveria consumir, há como contribuir pra que essas mentes pensantes e criativas tenham uma paga qualquer, um reconhecimento qualquer.E é Você que pode contribuir. Pouco, mas pode. O pouco é muito, mesmo que sejam necessários muitos “muito” pra ser suficiente e produzir o efeito merecido.

Aqui, algumas dicas básicas e até mesmo óbvias, mas que escapam normalmente no relacionamento com nossas bandas brasileiras. Parecem barganhas, esmolas, mas é como a história de que uma casa só começa a ser erguida com o primeiro tijolo.

A primeira medida é simples: se você é amigo de alguma banda ou artista, pague pra ir ao show dele. Não queira ser “vip” pelo prazer de dizer que foi “vip”. Convenhamos, normalmente um show de banda iniciante ou do subterrâneo, com muita boa vontade, custa lá seus dez, quinze reais. É um valor irrisório pra você e, caso a casa realmente repasse todo o valor da entrada ao artista, juntando tudo, dá uma boa paga pela apresentação.

Depois, se possível, compre o CD (ou o cassete, se for colecionador). Custa entre cinco e dez reais. Se o amigo quiser dar de graça o CD, lembre-se que ele teve o trabalho de produzir o material físico (capa, impressão, mídia etc.) e que aquela é de fato a arte dele. Ela tem que valer alguma coisa, principalmente pros amigos. Insista em pagar. É óbvio que o artista vai disponibilizar a música gratuitamente na Internet e que você, amigão que é dele, já vai ter baixado até antes de todo mundo. Mas compre, incentive a produção. Qualquer grana ajuda a abater o prejuízo que se avista ali na frente.

Compre o vinil também, se puder. É mais caro (inclusive pra produzir, obviemante), mas vale pra colecionadores naquela regra do quanto-mais-raro-melhor. Artistas do subterrâneo produzem poucas cópias e o trabalho normalmente é esmerado, com um cuidado de fazer inveja às grandes gravadoras.

Camiseta: por que não comprar uma quando passar pela banquinha montada no show? Ok, é um produto mais caro, se for de boa qualidade, como o vinil, mas é também um produto quase único, pela baixa quantidade produzida. Ajuda no caixa do artista e ajuda a divulgá-lo quando você desfilar pimpão por aí.

Contribua com o financiamento coletivo. O artista quer continuar produzindo, criando e formatando sua arte naquele pacote a que nos acostumamos chamar de disco ou álbum (que no fim ninguém compra). Dessa vez ele tá praticamente implorando por ajuda. Uma ajuda pra produzir algo que o fã deverá gostar. Há num risco de decepção, mas, bem… por que não? Acredite: mesmo levantando fundos, o artista ainda vai colocar a mão no bolso e nunca mais vai ver esse dinheiro de volta.

Se não quiser abrir a mão, não tiver grana, não estiver disposto a contribuir financeiramente, há como ajudar em redes sociais e tals, mas é possível sempre, ao menos, comparecer aos shows.

Bandas pequenas, do subterrâneo, podem construir assim, tijolo a tijolo, um nanomercado só delas, do tamanho que precisarem, desde que haja um esforço pra isso e desde que o próprio artista compreenda que a engrenagem mudou. Não dá pra esperar uma fada madrinha bater à porta e dizer que a partir daquele momento a banda está estourada em todas as paradas, que todos podem largar os empregos e viver só disso. É mais complicado, como se sabe. É preciso planejamento caso a caso, diante da difícil certeza de que não há uma regra que hoje valha pra todos.

Mas enquanto os artistas batem cabeça pra descobrir sua fórmula mágica pra viver de música, há como ir pavimentando o caminho com pequenas relações legítimas de mercado. Já ajuda. Afinal, se você enxerga algum valor na música, esse valor se presta tanto pro medalhão das paradas de sucesso, quanto pra mais desencanada das bandas. Uma delas pode criar a música da sua vida – e isso não é algo pelo qual vale a pena lutar?

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