PORÃO DO ROCK 2013 – COMO FOI

Não é fácil fazer festival no Brasil. Em tempos (mais uma vez) em que se discute a legitimidade, a eficiência e a proposta do Fora do Eixo e sua “rede de festivais pelo Brasil”, é sempre bom ver eventos como o Porão do Rock respirando a plenos pulmões, viabilizando a décima quinta edição.

Dias 30 e 31 de agosto de 2013, o PDR juntou trinta e oito bandas, sendo cinco estrangeiras, em três palcos, pra um público oficial de quarenta e cinco mil pessoas em Brasília. Sucesso? Sim, sem dúvida, independente das expectativas oficiais. Pra quem olha de fora, há mais a se elogiar do que se criticar, embora sempre existam críticas a serem feitas. O momento é de aplaudir.

A repórter Janaína Azevedo Lopes esteve lá e contou (pro Floga-se e pro Urbanaque – leia aqui e aqui) como foi a experiência vivida no festival – experiência que pra gente é o cerne da questão em festivais: como tudo funcionou, se é que funcionou, quanto custava, será que houve respeito com o público, como era a chegada e a saída e, claro, a qualidade artística e técnica. Janaína observou tudo e conta abaixo.

O resultado, em resumo, foi bem positivo.

OPÇÃO VIÁVEL E DIVERSIDADE ARTÍSTICA
Texto: Janaína Azevedo Lopes
Fotos: Porão do Rock

É possível trazer shows internacionais de peso pro Brasil sem cobrar uma fortuna de ingresso por isso? O já tradicional festival brasiliense Porão do Rock vem mostrando que sim, escalando nomes relevantes pra suas edições mais recentes, e oferecendo ao público uma experiência de qualidade.

O último festival aconteceu há uma semana, com cinco atrações gringas e mais de trinta nacionais, reunindo um público estimado em 45 mil pessoas no estacionamento do estádio Mané Garrincha, segundo a organização do evento.

Com certeza é necessário observar a diferença entre o Porão e um festival bombado do sudeste: enquanto o primeiro tem por trás uma ONG, batizada com o nome do festival, o segundo provavelmente terá uma grande empresa, de olho nos lucros que o mercado pode lhe render. Enquanto ONG, o PDR conta com verba pública (através do patrocínio do banco público BRB, por exemplo) e também com seus sponsors privados. Ainda tem a retaguarda do Governo do Distrito Federal, através de sua Secretaria de Cultura, na organização, e não perde de vista as contrapartidas sociais: treina e capacita voluntários pra cumprir diferentes funções dentro do festival, oferece entradas gratuitas pra estudantes da rede municipal, incentiva o uso de bicicletas, arrecada alimentos não perecíveis pra posteriores doações, entre outras medidas de impacto local.

Os ingressos eram adquiridos por dia. Se a compra fosse antecipada, a entrada inteira era R$ 30,00 e a de estudante, R$ 15,00. E, caso se optasse por comprar no festival, a inteira subia para R$ 40,00 e a meia, R$ 20,00. Então, a experiência completa do Porão do Rock custou ao público, no máximo, R$ 80. Foram divulgados 14 pontos de venda, sendo dois em Goiás e o restante em Brasília. Não houve divulgação de venda online.



Suicidal Tendencies e The Mono Men

Então, pagando, se muito, R$ 80,00, pôde-se prestigiar as cinco já mencionadas atrações internacionais, três nomes consistentes e ativos – Suicidal Tendencies, Soulfly e Mark Lanegan – a inciante banda argentina Banda de La Muerte e os veteranos da The Mono Men, já em sua segunda reunião após o fim da banda nos anos 90. Ainda, com tratamento de headliners estavam três nomes mais do que conhecidos por aqui: Capital Inicial, Paralamas do Sucesso e Lobão. Entre os velhos conhecidos do público, Leela, Matanza, Devotos e Krisiun. Pra quem queria as melhores novidades da música nacional, Sexy Fi e Test. Música dançante? Uh La La e Kita. New metal? Na Lata. Psicodelia? Rios Voadores. Hardcore e metal extremo? Todo um palco destinado a receber só os expoentes desses gêneros. Indie conectado com as tendências que vêm de fora? Supercombo. Rock setentista e engraçadão? The Galo Power.

Com tanta diversidade, não deve ter sido difícil encontrar algum show dentro da preferência de quem foi até o evento. Entre os destaques, o imbatível e emocionante show do Paralamas, metralhando hits, porque não há outro jeito: “Alagados”, “Lanterna dos Afogados”, “O Beco”, “Meu Erro”, “Óculos”, “Lourinha Bombril”, “Cuide Bem Do Seu Amor”, e isso foi só uma pequena parte de um dos shows mais longos do festival: cerca de uma hora e meia com pedidos de bis. O show do Porão foi a comemoração de 30 anos do Paralamas, e a banda estava afiadíssima. Ainda conta com um trunfo: clássico naipe de metais que dá o toque de celebração.



Paralamas e Lobão

Mais comedido, mas trazendo sua carga emocional habitual, o estadunidense Mark Lanegan subiu ao palco com quase meia hora de atraso, reforçando mais ainda a expectativa por um dos shows mais aguardados pelo público. Com uma formação reduzida a um baixista e um guitarrista, provavelmente teve que esperar o fim do show que transcorria em outro palco, vazando muito som, e que certamente atrapalharia a audição de sua performance minimalista.

Houve quem reclamasse do estilo low profile do cantor que não interage com a plateia, exceto alguns “thank you, very much”, ou das músicas acústicas, mas na verdade Mark trouxe um belo show, com as versões acústicas de várias épocas de sua carreira. Intérprete aclamado, com um currículo de colaborações sempre crescendo, no Porão do Rock ele mostrou que, se quiser, abre mão da formação de banda completa pra eletrizar o público na potência de sua voz. Conhecer as músicas ajuda, é claro. Mas, sobretudo, gostar de ser surpreendido é imprescindível pra conseguir apreciar um show como esse. E não há ocasião melhor pra ser surpreendido do que um festival, portanto, a escalação de Mark Lanegan foi um ponto positivo do Porão do Rock este ano.

Os brasilienses do Sexy Fi também fizeram um grande show e mostraram porquê são merecedores da atenção que vêm recebendo nos últimos tempos: a mistura rifes abrasileirados com programações psicodélicas, que vão num crescendo até descambar numa confusão noise embalada pela voz amigável da vocalista Camila, dá muito certo.

O duo paulista Test foi outra escalação digna de nota: tocando de frente pro outro, o vocalista João e o baterista Thiago conseguem aliar o que parece impossível: o grindcore com intervalos de ambiências, frases espaçadas e repetições de rifes. Sem nunca perder o peso e a sujeira, com o gutural aterrorizante de João. O Test tocou antes do Soulfly e contou com um bom público.


Test

Aliás, durante o show do Test que foi possível notar um grande problema do festival: o vazamento de som de um palco pro outro. Eram três palcos, dois perfilados e o terceiro no outro extremo do local dos shows. Era esse que recebia as atrações de metal, e tanto sofria com o barulho vindo dos outros dois quanto interferia lá quando o show era muito intenso. Enquanto o Test tocava, num dos palcos principais estava o Capital Inicial. Ouvir “naquele amor à sua maneiraaaa” entre as músicas do Test não foi muito legal.

Com um esquema especial de trânsito que bloqueou as vias que circulavam a área do festival, o público não teve grandes problemas pra acessar o estacionamento do Mané Garrincha. Também não houve filas de entrada. Circular pela área era tranquilo, havia uma grande equipe de segurança por todos os lados, e a área de convivência, que juntava barracas de bebida e alimentação, lojinhas e equipamentos pra esportes radicais com supervisão, também não registrou filas absurdas. Os preços eram aceitáveis: cerveja a R$ 5,00, sanduíches e crepes a R$ 8,00, camisetas a R$ 30,00, bottons a R$ 3,00. Pra deixar o festival, quem não tinha vindo de carro precisava contar com táxis, já que tarde da noite os ônibus pararam de circular e nenhuma linha extra foi providenciada.

E assim, enxergando além do óbvio no cenário do rock internacional e apostando forte no que é produzido por aqui, o Porão do Rock chega a sua 15ª edição e firma-se como uma opção viável pra quem se dispõe a uma experiência de festival, com o cerrado planaltino como paisagem.

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