RESENHA: BELL WITCH – FOUR PHANTOMS

A enorme onda sonora que se arrasta na abertura de “Four Phantoms” representa uma peça que prolonga o tempo. Pelo menos, em nossa frágil subjetividade. É delineado um ambiente em que os elementos da natureza não absolvem, não purificam; ao invés disso, eles prolongam uma agonia interminável. Tudo parece abafado por essa disciplinada massa sonora que se arrasta em distorções e versos de guitarras lentos. Os servos sofrem como os berros baixos demais pra ter algum efeito que apele pra uma salvação. Zumbis esquecidos pelo mundo dos vivos, humilhados pela vivacidade da natureza. O Bell Witch apela pro estilo mais melancólico nas variantes do “doom metal”, criando uma atmosfera depressiva e tempos lentos ao extremo. A réplica do Bell Witch pra sua própria criação reside em conquistar esse espaço morto com distorções, urros e ambientação intencionalmente desgastante. Mas ao invés da maioria de álbuns de “funeral doom metal”, “Four Phantoms” soleniza a vida ao encarar a morte, ao preenchê-la esteticamente.

Em seu último disco, “Longing” (2012), achei que faltou muita emoção. Os drones tomavam conta e era tudo muito gélido. Ainda que muito bom, parecia uma mera confirmação da estética “funeral” ao invés de confrontar o “gênero” e suas bases. Embora os conflitos de “Longing” fossem cuidadosamente arquitetados, a resposta sempre parecia fria e entediante (a repetição dos rifes era muito chata). “Four Phantoms” não se trata da quebra dessas fórmulas, mas a emoção do narrador sintetiza todas as viradas instrumentais que a banda pode dar de um disco pra outro. Podemos encarar, então, “Longing” como a transição pra essa forma menos tradicional (ainda assim sumariamente pautada no metal) que o Bell Witch encara os limites da vida.

O aprimoramento dos “resquícios” e a contemplação das cinzas cortam qualquer dúvida que muitos tinham da dupla formar apenas outra banda genérica. O disco nos afoga em sessenta minutos de um confronto entre a vontade de passar essa jornada (de morte, de angústia) e nos apresenta todas as dificuldades que tal tarefa exige. Por isso as estruturas de “Four Phantoms” são como um pântano; frequentemente irregulares, uma travessia assimétrica por sensações de sufoco e afogamento. Obviamente não é uma ouvida fácil, a ideia da dupla não é criar uma viagem confortável, mas pra aqueles que anseiam pela música limítrofe que confronta temas que muitas pessoas querem deixar pra depois, “Four Phantoms” é a escultura vivida da afirmação do desespero.

Na íntegra:

A longa duração das peças (é um disco duplo em vinil) provocam as mentes com uma progressão pra um terreno instável, sempre extremamente vazio e solitário, ainda assim, dando muito espaço pra variação de/entre gêneros. As características das quatro canções unidas refletem o que de melhor a ultramodernidade pode despertar em bandas que, originalmente, parte do público segmenta a um nicho específico; uma estrutura dinâmica e multifacetada que não altera a estética do gênero, embora modifique seus matizes sonoros básicos. É sobre tudo circular com autonomia pra que a música não soe catalogada. A música é extremamente perto da ambiente em tons menores onipresentes.

Todas essas camadas, no entanto, não afetam a tendência lenta do Bell Witch de cavar um espaço de angústia; mesclado com uma tensão mortal em que o afogamento completo está a um passo – aliás, todo “Four Phantoms” soa como um eu-lírico à beira da desistência por testemunhar esse ritual dos mortos. O disco é composto por dois pares que refletem os quatro elementos da natureza.

O contrabaixo recluso aguarda com paciência até que os instrumentos e os vocais sejam altos e poderosos o suficiente pra mudar a progressão “arrastada” da música. Os vocais monstruosos tornam todo o disco intencionalmente mais desgastante; “Four Phantoms” realiza o contrário de muitos discos no gênero; é sobre a passagem da morte à vida. A participação de Erik Moggridge não apenas serve pra “acalmar os ânimos”, mas ter um vocalista “de verdade” foi realmente importante pro álbum não soar como a “manifestação do pútrido”. Por mais estranho que possa parecer, “Four Phantoms” é um disco de desintoxicação. Quando o “doom metal” para de estetizar a agonia pra mostrar porque ela pode ser utilizada pra afirmar a vida.

1. Suffocation, A Burial: I – Awoken (Breathing Teeth)
2. Judgement, In Fire: I – Garden (Of Blooming Ash)
3. Suffocation, A Drowning: II – Somniloquy (The Distance Of Forever)
4. Judgement, In Air: II – Felled (In Howling Wind)

NOTA: 7,0
Lançamento: 28 de abril de 2015
Duração: 66 minutos e 27 segundos
Selo: Profound Lore Records
Produção: Bell Witch e Billy Anderson

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