RESENHA: EFDEMIN – NEW ATLANTIS

Em 1627, Francis Bacon teve seu livro “New Atlantis” publicado. Ele havia morrido um ano antes e a obra acabou incompleta. Mesmo assim fincou-se nela a etiqueta de indispensável. O escritor via um mundo utópico de esplendor, dignidade, bondade e gentileza. “Bacon imaginou ‘casas de som’ futuristas, que contêm instrumentos musicais capazes de recriar a totalidade dos sons do universo; uma profecia de quatrocentos anos que antecipa a realidade sonora digital atual”, escreve Phillip Sollmann, o Efdemin, ao explicar seu “New Atlantis”.

Logo no início, ouve-se a voz dramática de William T. Wiley declamando “Oh, lovely appearance of death / No sight upon earth is so fair / Not all the gay pageants that breathe / Can with a dead body compare”, retirado de Charles Wesley, “A Funeral Hymn For A Believer”, de 1780, gravado no disco “Vision # 4 – Word Of Mouth”, de 1980. Os bons ventos chegam na sequência, soando eletrônicos, envolventes, sedutores, magnânimos. O mundo se abre das trevas, o céu clareia, e uma sociedade futurista nasce da imaginação pra realidade, quatrocentos anos depois.

Não o mundo imaginado por Bacon, longe disso. Não há gentileza, bondade ou dignidade que dê conta de vencer o ódio e a ignomínia reinantes no século atual. A batalha chega a ser desigual. Mas se Bacon parecia um otimista utópico, Efdemin oferece, ao menos, o esplendor como saída pros tempos duros.

Os beats graves são a base pra camadas de sons eletrônicos que sobem e descem, se arrastam e se repetem, um mecanismo de ordem indevida na desordem incalculada de hoje. “New Atlantis”, a música, se apresenta como um guia de turismo por essa visão utópica da sociedade. Em seus quatorze minutos é como se a tristeza e a imbecilidade não nos pudessem alcançar. Envoltos num daqueles veículos elétricos assépticos, flutuamos por uma cidade igualitária, onde tudo funciona, até mesmo as diferenças naturais.

A nossa visão é que atrapalha o disco. Não sei se sugestionados por obras de massivo apelo popular desde a infância (de desenho dos Jetsons até filmes como “Oblivion”), só conseguimos enxergar a utopia pelos olhos dos outros. “New Atlantis”, porém, não é a visão ou a releitura de uma obra a partir de outra, mas uma inspiração pra sonoridade que se cria. Nós é que levamos tais sons por caminhos conhecidos e assentados na nossa imaginação.

Efdemin até contribui pra isso, com seu eletrônico repetitivo, reflexivo e palatável. Ele vai avançando com temas de fácil assimilação (a exceção está em “Temple”, uma world music estranhíssima), dando ao ouvinte um pouco do que poderia ser essa utopia. Seu trunfo é jogar essa “culpa” pras costas da audiência. Sua afirmação é que da Idade Média pra cá mudaram as tecnologias, mas a sociedade aparentemente segue na mesma, expondo seu fracasso em não conseguir seu “mundo ideal”, com sua utopia ainda sendo tão perfeita e desejável quanto inalcançável.

1. Oh, Lovely Appearance Of Death
2. Good Winds
3. New Atlantis
4. At The Strangers House
5. A Land Unknown
6. Temple
7. Black Sun
8. The Sound House

NOTA: 8,5
Lançamento: 15 de fevereiro de 2019
Duração: 49 minutos e 57 segundos
Selo: Ostgut Ton
Produção: Phillip Sollmann

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