Ultimamente, a sociedade brasileira tem se alimentado de tudo quanto é tipo de embate polêmico. O debate é uma ferramenta construtiva pra qualquer sociedade, mas no caso da nossa há uma série questão de entendimento e profundidade. Ninguém debate, ninguém se entende, todo mundo só grita nas redes sociais, nas ruas, nos encontros de família, todos falam e ninguém ouve. Estamos aparentemente num beco sem saída. Ou como já definiram: o beco tem saída, mas estão todos cegos de ódio a ponto de não ver a saída escancarada.
“Todos cegos de ódio” é modo de dizer. Há uma grande parcela odienta, babando a baba elástica e ácida, mas há também gente que tenta ponderar, enxergar o quadro geral, qualificar o debate, buscar o diálogo e o entendimento. E há gente fazendo arte explosiva com a situação. Jhones Silva é um deles, com o seu impiedoso God Pussy.
Com o EP “Bra$il”, o carioca foi ágil em mais um embate polêmico que se deu nas redes brasileiras. A clássica banda Dead Kennedys peidou na farofa quando viu a repercussão do cartaz feito pra turnê em nosso país. Cristiano Suarez foi cirúrgico na cena idealizada, com uma família de brancos bem-nascidos, vestindo camisa da CBF, armados e dizendo que adoram o “cheiro de pobres mortos pela manhã”.
As reações de aprovação e de repúdio inundaram as redes da banda que, acuada, amarelou e cancelou a turnê. Todo mundo já conhece a história, mas aqui está a nota oficial sobre o cancelamento, explicando o passo a passo da encrenca.
Silva, porém, indignado com o quadro montado fez esse EP pra “banda punk(?) DK entender que nem só de flores vivem o povo brasileiro, 12 títulos retratando um pouco de nossas batalhas diárias. Aqui não é só carnaval, samba e futebol!”.
Não é. Aqui temos mulheres estupradas, pessoas mortas inocentemente, desemprego atingindo milhões de pessoas, presidente alimentando o ódio e estúpido por natureza, retrocessos dos direitos do trabalhados, vítimas do despreparo militar, clamor à ditadura, racismo, homofobia, neonazismo tomando conta da nação, polícia abastecendo a favela com armas, estado sendo conivente com o crime, sem contar milicianos próximos (bem próximos) do poder, mídia pisando em ovos pra denunciar os novos comandantes, ministério público e justiça (assim mesmo, com letra minúscula) partidarizados e fisiológicos, um ex-presidente preso político, corte de verbas pra educação universitária e básica, reforma previdenciária que penaliza os mais pobres, relações exteriores ideologizada e fazendo o Brasil se tornar um pária, estagnação da economia, governo batendo cabeça… O God Pussy poderia fazer uma série sobre esse “novo” Brasil ainda mais injusto e reforçando desigualdades.
Mas “Bra$il” é um EP porque dá pra dizer muito em pouco tempo. Há quem ainda acredite que isso aqui é lindo e maravilhoso, acreditando em praias, futebol e cartão postal. Às muitas virtudes naturais do Brasil, somam-se as mentes que tentam traduzir sua realidade cruel de forma implacável na música, nas letras, no cinema, nas artes em geral.
O harsh noise do God Pussy está a serviço desse desabafo, dessa trilha. É preciso porque o recado está dado mesmo sem precisar ouvir os temas – embora seja inescapável. Está aí. Há ruído na comunicação, há barulho na nossa história, há interferência na lógica, mas o God Pussy não se cala. Continua tentando explicar o que o novo establishment se esforça pra esconder debaixo do tapete.
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01. Mulheres Estupradas
02. Pessoas Mortas Inocentemente
03. Desemprego Atingido Milhões De Pessoas
04. Presidente Alimentador De Ódio E Estupido Por Natureza
05. Retrocesso Dos Direitos Do Trabalhador
06. Vitimas Do Despreparo Militar
07. Clamor A Ditadura…
08. Racismo, Homofobia, Neonazismo Tomando Conta Da Nação
09. Policia Abastecendo A Favela De Armas
10. Estado Sendo Conivente Com O Crime
11. E vocês Achando Que Aqui É Lindo E Maravilhoso
12. …Acreditando No Cartão Postal do País!!!
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NOTA: 8,0
Lançamento: 27 de abril de 2019
Duração: 13 minutos e 59 segundos
Selo: Independente
Produção: Jhones Silva