RESENHA: MAQUINAS – LADO TURVO, LUGARES INQUIETOS

O primeiro álbum cheio do maquinas tem em seu título, “Lado Turvo, Lugares Inquietos” (veja aqui), um aviso bem importante sobre o que vamos enfrentar. São lembranças invocadas entre muita distorção e progressões surpreendentes, que trabalham em colaboração com as guitarradas, variando entre tanto gêneros que é impossível de definir – e aposto que eles nunca iriam querer isso.

A obsessão da banda parece ser com lembranças que ainda “assombram” e são capazes de transitar entre estados contemplativos, de aceitação até os níveis mais descontrolados. Não é necessariamente uma insanidade, mas todas as explosões instrumentais instalam uma matéria originalmente inconcebível. É como se os avanços labirínticos do disco estabelecessem uma estrutura de desordem e desconforto, logo inquieta e turva.

É espantoso ver a expansão que uma matéria pode chegar. E, acredite, o que o maquinas (assim mesmo, em minúsculas e sem acento) estabelece é uma vertigem em que a constatação da inquietude somada às distorções rege o mundo deles. É uma matéria própria, então. Uma massa sonora de instrumentos e vozes diferentes que se somam explorando contrastes, microfonias e melodias paralelamente. É como se no submundo que a banda transita – corpos rasgados, cama desarrumada, gritos no escuro, gritos quietos, bebedeira – berrasse de um milhão de maneiras diferentes em cada canção do disco. São coisas que vão além do controle dos integrantes e isso estes mostram! Como a explosão de “drive by”, em que parece que toda a massa sonora caça essas sensações extremas desgovernadamente por um campo desconhecido. Daí, você percebe. O maquinas já te trouxe pro seu mundo e estamos tão confusos e maravilhados que só podemos aceitar essas estranhas mudanças instrumentais como ferramentas intrínsecas da complexidade do mundo que eles navegam.

Eles apenas servem-se do descontrole pra catalisar a música como expressão de suas próprias turbidezes (“turbidezes” é uma palavra bem feia e estranha, mas como descrever esse submundo de sensações tão catárticas, autodestrutivas e angustiantes? Eu não sei). Enquanto uma “submissão” a gêneros decididamente não faz parte da banda, eles são controlados por algo muito forte e tentam caçar isso e expressar isso com toda complexidade que lhes apresenta. Soa impactante porque é um disco feito através do impacto – e cada canção em “Lado Turvo, Lugares Inquietos” explora ambivalências em termos líricos e sonoros, como um sonho deformado que faz nosso coração bater mais rápido e nossa mente ficar lotada de imagens que importam tanto, mas falta a captação de um sentido.

Não há um flerte com a redenção, não há um flerte com nada que não seja extravagante e gritante. Os momentos mais acolhedores do álbum ainda assim incomodam, ainda assim evidenciam que este coração talvez nunca fique em paz. Ele fica gritando por algo, algo que não conhece bem, talvez a soma de sons em uma união não harmoniosa.

“Do que a gente sabe da cidade dos outros?” é a frase que encerra o disco. E realmente, eu fiquei atônito com a cidade apresentada pelo maquinas. E apesar de me reconhecer em muitos pontos, este espanto supera o conhecimento lógico – ele é causado pela imersão nos cenários agressivos entrecruzados do disco. Do início ao fim.

NOTA: 8,5
Lançamento: 30 de maio de 2016
Duração: 50 minutos e 10 segundos
Selo: Bichano Records e Transtorninho Records
Produção: maquinas e Igor Miná

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