A abertura de “MM3” (ouça na íntegra aqui) lista tarefas que, a priori, já se mostram impossíveis de serem realizadas. As imagens montadas carregam um misticismo que só a música do conjunto poderia atribuir significado e extrair harmonias que conduzam o ouvinte pela beleza disforme criada. A urgência criativa do conjunto nasce de um atravessamento da realidade pra estabelecer pontos incomuns e difusos em um mundo musical em que tudo nasce pra escorrer. A terceira faixa, “Imagem Do Amor”, representa estas deformidades constantes que o Metá Metá tem a coragem de transparecer na música: as melodias sem palavras definidas de Juçara, pelos sopros desconcertantes de Thiago França e o tempo quebrado de Dinucci.
Pode-se falar de referências africanas, do submundo paulista dos anos 1980 ou das diversas incorporações de estilos diferentes do jazz: a gana do conjunto transpassa a reverência pra estabelecer urgência de uma criação totalmente possível, mas, aparentemente, sempre renegada à nichos diferentes.
O conjunto mira em associações que, a priori, parecem incomunicáveis. E é o presente maior que o Metá Metá vem dando nesta última década pra música brasileira: o criador é plenamente capaz de comunicar tudo o que recebeu em sua formação musical, educando o ouvido de sua audiência com uma mensagem que circula por caminhos labirínticos e até contraditórios. Mas os rastros de toda a produção que a banda já criou ainda não são suficientes pra se “esperar algo”. Caminhando em uma corda bamba de influências, progressão sonora e não se manter no ostracismo, cada integrante do conjunto exige uma contribuição à altura do outro.
A gravação rápida do disco contribui pra ideia de urgência: nada é estável o suficiente no mundo do Metá Metá que possa ser captado sem o conceito de transitoriedade. Porque o mundo não para e porque os próprios integrantes não param (não à toa eles tem diversos projetos paralelos), que a criação mira em pontos reconhecíveis e impressionistas da vastidão contemporânea.
Metá Metá é uma banda que simboliza os pontos cegos da cidade em que residem: os muros pichados com mil imagens em um mesmo plano de fundo, as festas de rua, a ebulição efervescente ao som de ritmos dançantes. O conjunto expressa esta realidade sem abrir mão de progressões incomuns, retratando não só o conhecimento musical dos integrantes, mas a forma como esta sabedoria os auxilia a captar movimentos fugidios aos ouvidos menos atentos.
Nossa concepção de música é volátil e pode ser despedaçada diversas vezes (o que requer uma conseguinte reestruturação). A alegria do Metá Metá faz estes dois serviços pra seus ouvintes. Ao mesmo tempo em que certa noção de música, principalmente pra novos interessados, mostra-se frágil em frente à naturalidade das transições sonoras do conjunto, nasce uma outra. Esta, permite que sonhadores materializem suas personas musicais em obras. E quando músicos tão desafiadores de formas reinantes têm plena liberdade pra desrespeitar estruturas canônicas, estas são obrigadas a serem interpretadas com outros ouvidos. A banda credita sua força pulsante a um mundo acelerado e, em primeira instância, desinteressado.
Isso porque tendências e crítica nunca abalaram a certeza dos integrantes do Metá Metá que, desde seu primeiro disco, causa uma comoção que vai crescendo lentamente no submundo brasileiro. Mais do que outro trabalho coerente do grupo, “MM3” evidencia o conjunto que está a frente de muitas aparições relevantes nos últimos anos. Além disso tudo, o disco é uma autêntica impressão do contemporâneo aliada à uma constante necessidade de resignificações, em que o diálogo entre as formas mais radicais seja sempre possível.
NOTA: 8,0
Lançamento: 26 de maio de 2016
Duração: 40 minutos e 34 segundos
Selo: Independente
Produção: Metá Metá