RESENHA: ORLANDO WEEKS – A QUICKENING

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Ele estava vislumbrando o “topo”. Depois que o Maccabees lançou em 2015 seu quarto disco, “Marks To Prove It”, a banda alcançou o primeiro lugar nas paradas britânicas. Mas logo se separou, em 2017. Orlando Weeks, o vocalista, lançou um livro infantil, ilustrado por ele mesmo, “The Gritterman”, com a respectiva trilha-sonora.

Entretanto, corte pra agora, 12 de junho de 2020, pandemia no auge, quinhentas mil pessoas morrendo, milhões infectadas; luta contra o racismo novamente tomando as ruas do mundo, nesse cenário de pandemia; governos populistas dando as costas pra ciência e pra lógica. Weeks, talvez como bilhões de outras pessoas, não se enxerga nesse mundo.

“A Quickening” parece ser o seu despertar. Nada de guitarras que marcaram o protagonismo de sua banda. Nada de gritos libertadores, como na abertura da faixa-título do último disco do Maccabees. Weeks, agora com 36 anos, cabelos perdendo terreno pra idade, respirou fundo e entre teclas, cordas, sopros e climas fez o que parece ser o mais viável pra apaziguar a mente no cenário atual.

Há revoltas necessárias por aí, mas há mais reflexão. Ou: cada um escolhe como reagir. O artista virou pai nesse mundo e fez uma obra pra encarar essa nova fase. Como não reagir a isso? O disco é sobre a paternidade, mas é também sobre ser filho de uma natureza (inclusive social) destruída por nós mesmos.

Weeks assumiu umas faces realmente curiosas. Fez um disco pra quem gosta de “In Rainbows” e “The King Of Limbs”, com um vocal mais solto, lembrando Anohni (Anthony Hegarty), e uma elegância que não faz feio perto do Tindersticks.

“Safe In Sound”, ele canta. É acolhedor. O filho um dia vai agradecer, torcendo pra estar de fato seguro nesse mundo.

A faixa de abertura, “Milk Breath”, se contorce em vários temas, começando esse Radiohead, virando Midlake ou Foals, se transformando em sabe-se lá o quê, algo que, convenhamos, nem importa muito.

Essa elegância do “despertar” é um registro de humores suaves e profundos, acolhedores e reflexivos, texturas orgânicas e pulsações e batimentos cardíacos glutinosos que poderiam ter sido detectados dentro do útero.

Ao contrário de pensar em “apaziguamento”, Weeks é sabidamente entusiasta do Idles, em especial “Brutalism”, o primeiro disco, de 2017. A “raiva adulta”, como ele chama, também pode ser poética e bela. Mas aqui não é a dele. A raiva dele é não poder apreciar a beleza, seja do surgimento do filho nesse mundo disforme, seja da vida em si. Com todo esse mundo à disposição pra ser desbravado e temos que ficar restritos a poucos metros quadrados, porque não temos dinheiro, porque uma pandemia não deixa, porque as obrigações não nos permitem.

“Moon’s Opera”, seu “cântigo religioso”, agradece, com certa resignação. Há brutalidade na simples falha de expor qualquer beleza. A desilusão que vem disso é brutal. E o que dizer de “None Too Tough”, com sua alegria contida?

“A Quickening”, sem guitarras, sem danças, sem escapismos, celebra o nascimento do filho de Weeks, mas é essencialmente o nascimento de um artista. Impressionante, brutal, íntimo, que vai despertar no ouvinte algo que o ouvinte nem faz ideia do que seja. Descobrir um sentimento novo é se descobrir vivo.

01. Milk Breath
02. Blood Sugar
03. Safe In Sound
04. St. Thomas
05. Takes A Village
06. Moon’s Opera
07. All The Things
08. Blame Or Love Or Nothing
09. None Too Tough
10. Summer Clothes
11. Dream

NOTA: 9,0
Lançamento: 12 de junho de 2020
Duração: 38 minutos e 51 segundos
Selo: Play It Again Sam (PIAS)
Produção: Nic Nell

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