Não há surpresa alguma quando Rob Mazurek leva sua direção musical em sentindo totalmente divergente do último trabalho. É difícil descrever um ponto em que sua obra caia na mesmice ou também mapear alguma coerência lógica em cada rota que ele opta escolher. Sua parceria com Emmett Kelly (dois artistas talentosos mas com caminhos musicais e estéticas aparentemente divergentes) não apenas cobre mais um dos espaços ainda não experimentado por Mazurek como amplia a vastidão do catálogo já imenso de seu corpo sonoro produzido.
Na quase uma hora que o disco soma, percebe-se a transição ente diversas sonoridades (o pop torto, o eletroacústico, o livre-improviso) que convergem sempre pra experimentações sonoras que passam do limite da simples audição pra evocar algo físico no ouvinte. A participação da voz doce e “melancólica” de Kelly surge através de turbulências sonoras que ora variam entre primeiro e segundo plano – é como um momento de sobriedade em meio a um treco obtusamente bizarro.
Ambos compuseram respectivas partes (Rob no instrumental, Kelly nas letras) em conjunto e paralelamente. Dá pra dizer, então, que toda a construção de “Alien Flower Sutra” é decididamente um esforço duplo de duas mentes criativas querendo convergir influências aparentemente tão diferentes em alguma unidade (mesmo que dispersa).
Há uma comunhão entre a voz sutil de Kelly e as paredes grotescas de Mazurek. Mazurek e seus convidados entopem o disco com layers eletrônicos, instrumentos de sopro em livre improviso, em paralelo à sobriedade de Kelly que inunda esse ambiente decididamente bizarro em alguma espécie de surrealismo.
Essas aparições contrastantes interessantemente levam a sensação pra um mesmo ponto; o que existe uma espécie de meditação ao mesmo tempo que nenhum mergulho em si mesmo sairia ileso de ranhuras. Como se fosse um passeio em algum lugar calmo mas que o caos do ambiente que o cerca não permitisse uma sensação completa de paz ou qualquer coisas dessas. Ecoam ruídos, tentativas de transcendência e observadoras da realidade sob um viés de encanto e espanto. O eletrônico é claramente o ponto mais eufórico da arquitetura de Mazurek.
Os caminhos modernos e exploradores de Mazurek não só invocam uma afinidade explícita com a arte contemporânea (ele vai obviamente além da produção musical, há um diálogo bem pertinente com as artes plásticas que renderia uma resenha por si) ao mesmo tempo que carrega uma forte veia desejosa por transcendência. É como se ele soubesse que seu padrão criativo obedecesse certo limite e ainda sim é o único caminho possível pra passar tais barreiras.
Ao invés de uma dicotomia entre humanidade e cybercriação, como o próprio Kelly canta (“We Are One”), é necessária uma tentativa de unidade; algo ainda impensado, que personifique uma nova compreensão sobre o que o progresso pode passar a ser. É uma entrega ao indeterminado.
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01. Back To The Ocean, Back To The Sea
02. Android Love Cry
03. Blackout
04. Bright Nights Havoc
05. I Untied My Wrists
06. Of Time Wasted
07. Remember Nothing
08. Embryo Genesis
09. We Are One
10. Overture Towards The Beginning Of The End Of Time
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NOTA: 8,0
Lançamento: 13 de maio de 2016
Duração: 57 minutos e 33 segundos
Selo: International Anthem
Produção: Rob Mazurek