RESENHA: TALUDE – FRAGMENTO EP

O Todo se estilhaça e a sensação de unidade fica incompleta e você observa aspectos-fantasmas (memórias) que alguma vez existiram concretamente serem apenas ecos distantes de tudo o que um dia existiu. A sensação de solidão não é imposta pela fragmentação e sim pelos estilhaços mostrarem-se amplamente diferentes do Todo que eles já constituíram. “Espelho”, a segunda faixa de “Fragmento”, EP dos potiguares da Talude, é um diálogo entre uma pessoa e seu reflexo fazendo os movimentos de um não necessariamente serem repetidos pelo outro.

É por isso que, em conjunto com as bruscas mudanças rítmicas, “Fragmento” soa disperso em vários instantes – as múltiplas visões da banda são carregadas em lirismo e cantos difusos, que se abastecem dos rifes progressivos pra evidenciar a dinâmica confusa que o eu-poético se encontra. “Eu não vou me sujeitar à condição de ser você e esquecer quem sou”: o esquecimento próprio parece ser o maior terror pro Talude. “Ruptura” surge como um questionamento de identidades confusas, em que a vontade de ser parece ser impelida por algum substrato invisível.

Os questionamentos rondam todo “Fragmento” porque, talvez, estas perguntas são a melhor forma de elucidar incertezas próprias. Querer é apresentado como uma prisão sem saídas e parece que as pessoas mais se questionam sobre suas vontades pra poderem, invariavelmente, ter justificativas esquálidas pra não as exercerem. “O que se quer é o que te faz”, Talude afirma. Então, através dos fragmentos que, involuntariamente, investigam microvontades e sutis desejos que num Todo unitário jamais seria identificáveis.

De um modo mais aplicado, estas dúvidas são exemplificadas nos atos descritos em “Avenida”. Ainda assim a afirmação “não vou parar” é uma recusa concreta à estagnação. Ainda que o caos se disperse em múltiplos signos e confronte insistentemente nossas poucas bases seguras, o trânsito e o movimento, pra além de serem meios de combates, são configurações que reorganizam e incorporam a desordem. Veja bem, assim como as multidireções das músicas da Talude, a confusão jamais poderia ser negada ou apenas confrontada – ela se une aos fragmentos pra revesti-los da condição frágil e humana.

A libertação não é transfigurada por um punhado de palavras ou sons agradáveis. Mas unindo esferas convencionalmente tão distintas que uma reorganização dos estilhaços é possível e, assim, não se fica refém de significações alheias – elas são vistas com mais dificuldade por si próprio mas também adquirem um valor afirmativo.

1. Abraço
2. Espelho
3. Ruptura
4. Avenida
5. Prolongamento

NOTA: 7,0
Lançamento: 18 de abril de 2017
Duração: 28 minutos e 59 segundos
Selo: Sopro Movimento
Produção: Talude

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