RESENHA: THIS LONELY CROWD – THIS LONELY CROWD

“A palavra existe pra ser sussurrada”.
– Don DeLillo, Os Nomes

Nomes. As faixas falam de nomes. O que se concebe a partir daí é como as próprias letras (de escritoras icônicas), alinhadas ao instrumental mais feroz da banda, decodificam uma nomeação primária pra invadir estes recantos sagrados e explorar (não sem certa sensibilidade) tudo o que um nome sustenta, tudo o que o som distorcido pode abordar sobre algum elemento nomeado. É muito barulho, mudanças de acordes, enquanto o vocal se arrasta perplexamente e descrevendo infinitos olhares.

O disco contém algumas das passagens mais belas em toda a história da banda (destaca-se a linda introdução de “Vancian Noise”) que convivem com o som brusco e “conturbado”, elaborando um plano complexo (os ruídos, as microfonias) em que praticamente todas as facetas das escritoras mencionadas são diluídas e adicionadas na estética etérea da banda. Recordações nostálgicas, tristeza e pesar – parece que, por mais aflitivo que um sentimento possa ser, a This Lonely Crowd vai achar uma maneira de aplicar beleza (ouça o disco aqui).

É nos diálogos entre a antiguidade e o valor dos versos apresentados e uma delicadeza sobreposta no instrumental que o “movimento” da banda consegue estabelecer um transe no ouvinte – infligindo não literalmente provocações tão amplas quanto as palavras recitadas. Os instrumentais reiterados e muitas vezes fechados em si mesmos induzem algo parecido com uma caminhada desolada em que surgem lembranças, pensamentos que nascem e morrem e centena de outras sensações indiscerníveis, catalogadas apenas por um acesso instantâneo.

A glória da banda é evocar tanta coisa diferente num instrumental que foge do realizado nos outros discos. Elementos reconhecidamente como “próprios” do conjunto atribuem aos versos cantados uma significação não apenas da estética da TLC como das próprias palavras. Elas renascem e testemunham uma modificação. Elas experimentam terrenos que elas sozinhas não alcançariam. Isso potencializa a linguagem escrita, isso transcende “a mera poesia” pra afirmar em outro campo (ainda que poesia e cantos se misturem com certa frequência) tantos tipos de evocações e lembranças quanto se é possível.

A possibilidade de ouvir de maneira completamente autoral tais palavras reivindica o espaço poético dessas mulheres. Espaço torturado por uma produção mercadológica e um império de homens. Pela poesia, o acesso à comunhão com a experiência de outrem deixa de ser refém de ideologias e abre um pequeno acesso; a música, em especial com tal poder da TLC, catalisa isso e não apenas apresenta a percepção de alguém (a banda) muito afetada por tais palavras, mas também apresenta ao ouvinte a concepção entre origem (“no início era apenas o verbo”, Evangelho de João) e reelaboração estética através deste início (música).

NOTA: 8,5
Lançamento: 27 de janeiro de 2017
Duração: 30 minutos e 07 segundos
Selo: Sinewave
Produção: Luiz Orta

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