REVISITANDO: SUCKDOG – DRUGS ARE NICE (1989)

“Drugs Are Nice” é mais um resumo de uma época da vida do que propriamente um disco a ser lembrado. Principalmente se a vida for de Lisa Crystal Carver, a doidinha que viveu intensamente a virada da década de 1980 pra de 1990, quando ela estava na faixa dos vinte anos.

Sim, drogas são um troço legal até se você usa em excesso e, ao invés de sair fazendo besteira por aí, cataliza tudo em sua criação, em sua arte. Bem, nos anos 1980 ainda era assim, a cocaína e a heroína viriam forte pra colocar as coisas a perder, e depois o crack. E a gente sabe, é um limite difícil de se perceber. É possível que quando a pessoa se dê conta, ela já tenha virado um criminoso insano ou um pedinte sem perspectiva na vida. Lisa, não: ela esteve lá e voltou pra contar sua história.

A moça nasceu em 1968, nos Esteites, e, segundo ela própria, já aos dezoito anos, havia se tornado prostituta. Não foi numa vida fácil, mas foi intensa.

Se meteu com muita gente doida, como Vaginal Davis, o artista transexual da Afro Sisters, banda que teve a honra de abrir os shows da primeira turnê dos Smiths nos Esteites – além de fazer a abertura pro Happy Mondays (dá pra imaginar o tamanho da loucura); o ícone maluco GG Allin, uma grande inspiração artística pra ela; e Jean-Louis Costes, com quem casou e montou uma de suas banda, a Suckdog.

O Suckdog teve até uma vida razoavelmente longa, pra padrões estilo “drugs are nice”. Lançou três discos e um cassete e excursionou até 1998. Foram dez anos. O segundo disco é justamente “Drugs Are Nice”, de 1989.

Há quem diga que esse é um dos discos mais irritantes de todos os tempos. É uma tentativa de captar em estúdio o caos dos shows – caos herdado de GG Allin – com nudez, sangue, fezes e atos de provocação com a plateia.

Era assim que a dupla se apresentava pela Europa (no total, foram seis excursões pelo Velho Continente).

O álbum é uma coleção de quase-canções punk: são berros, colagens e balbúrdias, com muita sujeira e gravação de qualidade inexistente. Imagine você ligando um microfone pra captar aquela festa que você tem certeza que sua filha faz quando você viaja de férias…

O faça-você-mesmo extremo do caso Carter-Costes era menos ideológico e mais diversão e provocação. Era viver a juventude ao máximo, do jeito mais desprovido de encaixe possível.

A noisey music evocada pelo Suckdog era, por outro lado, apenas diversão e um jeito de cair na estrada. Lisa tinha preferência por escrever. Ela tocou nos anos 1990 o fanzine chamado “Rollerderby”, com muito nu, mensagens feministas e entrevistas desbocadas. O zine virou livro, “Rollerderby: The Book”. E a história dela também.

Sem medo de se desnudar, Lisa escreveu “Drugs Are Nice”, publicado em 2005, contando toda a história dela com a música, a prostituição, seu filho com deficiência, as excursões, seu casamento e seus casos amorosos fracassados. Ela hoje é escritora, vivinha da silva.

Escreve no Nerve.com, onde mantinha, até 2013, um diário ficcional sobre sua vida sexual. É até amiga de Yoko Ono, cuja obra mereceu um tratado escrito – e publicado – por Carver, “Reaching Out with No Hands: Reconsidering Yoko Ono”. Ganha dinheiro escrevendo.

Com a música, nada, embora “Drugs Are Nice”, o disco, seja hoje o mais conhecido da sua carreira musical. Disco que ela mesma produziu e mixou (o que não quer dizer nada, como dá pra notar ao ouvir). A capa, também de autoria dela, lembra bastante a capa de “Country Life”, o disco de 1974, do Roxy Music, mas de um jeito bem mais punkclique aqui pra ver a contracapa.

Já o ex-marido e parceiro no Suckdog, o francês Jean-Louis Costes, era considerado o GG Allin europeu, o que dá bem na conta do que imaginar de sua loucura. Quatorze anos mais velho que Lisa, enveredou pelo cinema (tem uma ponta em “Irreversível”, aquele mesmo, com a Monica Belucci) e continua excursionando com peças musicais-teatrais. Vale conhecer seu site.

“Drugs Are Nice” foi gravado entre 1988 e 1989 durante a excursão daquele ano pelos Esteites e na França.

Além do livro, vale ver o documentário “Drugs Are Nice: A Suckumentary 1988-2005”, contando a vida de Lisa.

O disco é fácil de achar na Internet, até porque foi relançado em CD algumas vezes. Se você gosta de noise punk, é um prato cheio e é possível afirmar que esse é um clássico. É a forma como a juventude se expressa, com um resultado na vida adulta que desmente os temores dos pais: você pode ser um completo amalucado na juventude e se tornar um adulto razoavelmente estável e responsável (a foto que abre a matéria é dela “responsável”).

Até porque, é assim que a vida funciona. Ou deveria funcionar. O Suckdog foi o jeito de Lisa viver sua juventude. “Drugs Are Nice”, sua forma de expressão.

“Your Dragon”:

“The Song Of The Flying Cats Of The Stars”

“Jokes About Women”:

Lado A
1. Your Dragon
2. Beasts Of The Night Gather Together
3. Alligators Lurking
4. The Number Of The Priest
5. Oh Mighty Pigeon
6. Ugh Ugh Ugh

Lado B
1. Jokes About Women
2. Will I Ever Do Anything With My Clothes On?
3. The Song Of The Flying Cats Of The Stars
4. Being In Love
5. Snakes Dancing
6. Suckdog
7. Murding Monsters
8. Holy Hell
9. Brontës In The Attic

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