Casa noturna. Luzes piscantes, fumaça. O lugar está cheio. Som alto.
CENA 1 (noite – interna)
Vaiber e Raiper bebem de pé, apoiados no balcão da casa noturna. Eles olham atentos o movimento.
Vaiber: Raiper, Raiper… Olha ali! Não é o curador daquele festival que rola todo ano?
Raiper: Opa! É ele, sim!
Vaiber: Bora pagar uma gelada pra ele.
Raiper: Já compra um uiscão pra ele. Vamos encher a cara dele, pra ver se deixa de viadagem e solta logo a escalação do festival desse ano. Aí é um baita furo de reportagem. Todo idiota quer saber essa escalação aí: são muitos e muitos cliques pro site, na certa.
Vaiber: Boa, se não der no líquido, a gente leva o cara lá pro fumódromo e faz ele jogar uma fumaça pra cabeça também.
A CAM fica estática. Vê-se os dois indo até o curador. Abordam-no, se cumprimentam, conversam um pouco. Não se ouve o que eles falam, só o som da casa noturna. Ao fundo toca uma bandinha indie qualquer. CAM acelera o tempo. Volta ao ritmo normal. Os dois cumprimentam o curador com entusiasmo e voltam pra onde está a CAM, no balcão.
Vaiber: Filha da puta não quer contar nada.
Raiper: Não vai ter jeito: vamos ter que fazer ele mandar um cigarro do capeta pra tampa.
Vaiber: Beleza. Vamos lá.
A CAM continua estática. Vê-se os dois indo até o meio da pista. Abordam de novo o curador e saem por um canto. A CAM acelera o tempo novamente e só o que se vê são pessoas que dançam, andam, passam pelo balcão, se aglomeram na pista. A CAM desacelera. Vê-se Raiper e Vaiper chegando ao balcão novamente. Estão visivelmente chapados.
Raiper: O filha da puta fuma pra caralho! Acabou nossa méridjeine.
Vaiber Foda-se, pelo menos ele falou. Temos que publicar essa merda logo. Puta furo! Raiper, vamos nos encher de cliques, vai ser um sucesso, maluco!
Raiper: Anota aí os nomes num papel, no celular, sei lá.
Vaiber (apontando pra cabeça) Tá no agádê, maluco! Amanhã a gente publica e fura até Folha de São Paulo, Globo, o escambau.
Eles pedem mais uma cerveja e cena fecha em fade.
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CENA 2 (dia – interna)
Casa de Raiper. Raiper está na cama, dormindo babando. Vaiber está no chão, acordando e visivelmente com dor de cabeça. Ele levanta, vai ao banheiro, lava o rosto, vai até suas coisas e pega o telefone. Tecla, tecla, tecla e seu rosto começa a mudar: desespero.
Vaiber: Raiper… Raiper! Acorda, porra!
Raiper (resmungando): O que foi, porra? Tô dormindo, seu desgraçado.
Vaiber (ainda procurando algo no seu celular): Onde você anotou os nomes que o maluco falou ontem?
Raiper (despertando): Te falei pra anotar num papel, no celular, em qualquer lugar… Você não anotou?
Vaiber: Não sei onde… Não acho!
Raiper (desperto de vez): Tá falando sério? Não lembra de nada? Você falou que tava no agádê aí! Não tá mais?
Vaiber: Não lembro de nada! Aquela marijuana era de esmigalhar neurônios.
Raiper: Maquemané marijuana, cabrón! Você encheu a cara e deu nisso. Esqueceu tudo. Agora, fodeu!
Vaiber: E agora? (segue procurando: olha no celular, nos bolsos da calça, embaixo da cama…)
Um breve silêncio de dá. Eles se olham como se procurassem uma solução.
Raiper: Já sei! Vamos inventar!
Vaiber: Inventar? Tá maluco? A gente sabia tudo em primeira mão ontem e vai inventar hoje?
Raiper: É! O que importa é sair na frente. Não vai sair muito diferente dessas listas boateiras que rolaram por aí. Além do mais, o Lúcio Ribeiro sempre fez isso e se deu bem. Um monte de blogue e site faz isso também. O leitor não quer a verdade agora, ele quer a esperança. Depois a gente diz que a fonte se equivocou, errou, que as negociações não deram certo, que foi por pouco, que algo não deu certo, sei lá.
Vaiber (se animando): Ou simplesmente esquece, não fala nada. As pessoas vão estar tão felizes ou iradas comentando a merda da escalação, que nem vão lembrar muito do que escrevemos.
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CENA 3 (efeito – sobreposições)
Sobe música do Kings Of Leon (a mais brega possível). Clipe frenético de imagens: post sendo publicado, título do post aparecendo nas timelines do Twitter, Facebook, telas de celulares, telas de computadores. Trending Topics sendo tomado pelo nome das bandas e do festival, pelos nomes de Raiper e Vaiber.
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CENA 4 (dia – interna)
Boteco pé-sujo. Vaiber e Raiper estão sentados na entrada do bar. Sol forte. Algumas garrafas vazias de cerveja estão sobre a mesa.
Raiper: Mesmo chutando a gente acertou uns dois ou três lá. Mesmo assim, nossos acessos foram à altura. Missão cumprida.
Vaiber: Pois é… Mandamos bem. Mas só tem bosta nesse festival.
Raiper: Pois é… Nem sei se vou nessa merda.
Vaiber: Também não. Só banda ruim.
Raiper: A não ser que nos credenciem.
Raiper: É… Vamos ligar pra aquele curador? Fumar um, tomar umas?
Vaiber: Boa.
Fade lento pra black.
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FIM
Sobem créditos.
Alguém tinha que filmar essa série haha