SWERVEDRIVER NO CINE JOIA – COMO FOI

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Quando o Swervedriver lançou o meio-que-favorito de todo mundo “Mezcal Head”, em 1993, aquelas guitarras tinham um impacto e tanto. Tiveram em mim também. Com meros vinte e poucos anos, aquelas guitarras faziam um baita sentido. O começo dos anos 1990 faziam sentido.

E o corpo aguentava a inspiração: pular, encher a cara até o dia amanhecer e ir trabalhar ou estudar direto, se fosse o caso (normalmente era). Suar assim fazia sentido.

Ainda tinha fígado pra isso. Não fazia a menor ideia de existir termos como TGO e TGP. Ressaca era um prêmio. Dava pra virar a noite à base daquele manjar das melhores esquinas ladrilhadas da cidade: a pinga com limão. Existia até um boteco perto de onde eu morava cujo nome verdadeiro ninguém conhecia, mas todo mundo tratava com o maior respeito de PL, “pêéle”, o pinga-com-limão. Antes de qualquer show, a noite geralmente começava ali. O corpo aguentava e era pro pêéle que o dinheiro dava.

Fico imaginando como teria sido o Swervedriver ao vivo nessa época. Adam Franklin tinha só 25 anos e era, digamos, tão louco quanto. Tomar uns pêéles com ele talvez fizesse um efeito ainda melhor. A cabeça gira e acelera na velocidade dos brinquedinhos que Franklin carrega pra dar outra voz à sua guitarra.

Por outro lado, devemos admitir, envelhecer também é uma arte. Franklin o fez com garbo. O disco mais recente de seu Swervedriver, “I Wasn’t Born to Lose You”, de 2015, o primeiro em dezessete longos verões, faz justiça à sua história.

Não posso dizer o mesmo de mim. Há anos, aboli o pêéle da rotina. Hoje, já sei o que é TGO e TGP e tive que adorar hábitos mais saudáveis – um deles é dormir no mínimo cinco horas por noite. Arrisco dizer que Franklin também segue cartilha mais sossegada.

Não que isso faça muita diferença pra quem tá lá em cima do palco. O Swervedriver toca com um bom vigor. Não o mesmo vigor. As guitarras são cortantes, há uma certa melancolia da juventude, daquela época. Mas faz diferença pra quem tá cá embaixo. Dor nas costas, por exemplo.

Algum gênio achou de bom tom colocar TRÊS bandas de abertura pro Swervedriver. Pior sou eu que não me toco e enfrento a maratona. Podia chegar em cima da hora do show principal, talvez. Entretanto, seria bobagem. O corpo tem que aguentar. Porque a abertura tem Medialunas, dupla de Porto Alegre que abraça o noventismo como religião, com um guitarrista bem eficiente e músicas bem tocadas e divertidas, embora não tão criativas. Funciona bem ao vivo e deve funcionar ainda melhor num cubículo de teto baixo e muito pêéle na cabeça.

O único disco que a dupla lançou até hoje é de 2012, “Intropologia” (ouça aqui). Mas o som tá lá mais atrás no tempo.

O casal Liege Milk e Andrio Maquenzi acabou de ter um filho e o momento mais emocionante foi quando encerraram a apresentação com uma nova canção pro guri Ian.

O Quarto Negro foi a segunda banda. Essa com uns pêéles na cabeça não ia rolar. Sono, talvez. Mas sem os pêéles é possível perceber que é a banda mais inventiva da noite. Até mesmo que o Swervedriver. Não há uma só canção do segundo e mais recente disco do grupo, “Amor Violento”, um dos melhores de 2015 (veja aqui), que não seja minimamente elaborada pra fugir de padrões estabelecidos, como oitentismos, noventismos ou estrutura verso-refrão-verso-solo-refrão. Há canções de cabaré moderno, puteiros elegantes, MPB cabeçuda, afagos num Midlake da vida e por aí vai. A droga pra isso é a cara limpa ou algum sintético que ainda não experimentei.

Daí, vem os queridinhos de muita gente, o Supercordas, banda que me diz muito pouco ou quase nada. “Vai ter luta” foi o recado que o grupo deu. Mas nem esse pequeno gesto político fez muita gente se mexer.

A essa altura, pernas e costas cansadas, via o Cine Joia se encher. Todos queriam ver o Swervedriver e só o Swervedriver. Com uma organização impecável, horários cumpridos à risca, às nove e pouco da noite Adam Franklin sobe ao palco com Mikey Jones (bateria), Jimmy Hartridge (guitarra) e Mick Quinn (baixo, do Supergrass).

Franklin tá lá exibindo uma certa pança de quem provavelmente também já sabe do que se trata o TGO e o TGP, colesterol e afins. Sua guitarra começa tímida, quase não ouvimos. “Autodidact” é o início. Há pouco furor. A plateia, bem lotada a essa altura, não tem só tiozinhos como eu, há muita gente que provavelmente nem havia nascido quando a banda lançou o primeiro disco, “Raise”, em 1991. Mas esse pessoal também não se empolga muito. Talvez um pequeno miolo, uma meia dúzia ali próxima ao palco, ainda nos lembre que aquela banda ali podia causar alvoroço.

Demora pra isso. Lá perto do final, antes do bis, Franklin e sua turma conseguem empolgar mais que aficionados. Em “I Wonder?”, com seu final ensurdecedor, esqueço as dores nas costas pra lembrar que o Swervedriver sabe fazer barulho dos bons.

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O melhor está guardado pro fim, com “Last Train To Satansville” e “Duel”, não só por serem as mais conhecidas, mas porque a essa altura a banda não economizava nos decibéis. Lambi os beiços: ah, pêéle, onde estava você que não dei uma meia-trava aí. Fodam-se as costas, nesses momentos. Mas, peralá, por que diabos essa rapaziada sadia não tava se matando com aquelas guitarras, só aquela meia dúzia ali na frente?

Talvez o Swervedriver não tenha feito aquele esperado show ruidoso e enérgico perfeito. Foi mais contemplativo. Tanto faz se com umas na cabeça ou no sangue, se velho ou novo, provavelmente é uma banda que não faça mais tanto sentido como fazia antes. Ou aquela época não faz mais sentido. Não me decidi. Essa frustração, tenho certeza, é só minha, ou de quem tiver bagos pra admitir: nem todo dia é dia pra recordar.

01. Autodidact
02. For Seeking Heat
03. Never Lose That Feeling
04. Setting Sun
05. Rave Down
06. These Times
07. Sunset
08. For A Day Like Tomorrow
09. MM Abduction
10. Lone Star
11. The Birds
12. Son Of Mustang Ford
13. I Wonder?

BIS
14. Everso
15. Last Train To Satansville
16. Duel

Fotos: André Yamamgami

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