VERMES DO LIMBO E BABY HITLER NO CENTRO CULTURAL SÃO PAULO – COMO FOI

São Paulo não é uma cidade pra amadores. Não é pros sadios da mente. Ninguém consegue explicá-la e segue piorando a confusão em tempos de FlaxFlu político. O ódio cresce, o amor se deixa pra depois. O futuro parece sombrio com as próximas eleições se avizinhando – seja pra prefeito, seja pra governador e presidente. Viver em São Paulo requer uma enorme dose de paciência.

Uns dizem que sempre dá respirar fundo e deixar os idiotas pra lá. Outros recorrem aos amigos em mesas de bar, uma saída sempre digna, embora discussões políticas e sociais sempre afloram com umas cervejas a mais na cachola. Outros preferem se exercitar nos pouquíssimos parques que há na metrópole. É certo que opções pra fugir do embate raso e viver um dia sadio existem aos montes. Uma delas é uma visitinha ao Centro Cultural São Paulo.

O lugar é maravilhosamente espetado no meio da balbúrdia, uma construção cinzenta, setentista, que ao menos é recheada de cultura, de cabeças abertas e um pouco de verde. Respira-se bem ali.

Se os tempos não permitem respiros e sossego, uma noite qualquer no CCSP pode ser acalentador. Nesse dia 27 de agosto de 2015, tinha, veja só, Boogarins num palco e Vermes Do Limbo e Baby Hitler em outro. A despeito de tantas outras atrações – da biblioteca, vinilteca, espaços amplos, as turmas de guris ensaiando seus passos de dança etc. – nos palcos do CCSP surge e ressurge a música que outros lugares não estão dispostos a receber.

O Boogerins, novo queridinho da moçada pitchforkiana da Augusta, tinha sua plateia abarrotada. Vi o finalzinho, do lado de fora, e o público parece ter saído satisfeito com o que viu. A banda vai crescer (ao menos, torço pra isso) e essas chances de vê-la tão de perto vão rarear (ou vão custar bem mais caro).

Os cariocas do Baby Hitler e os paulistas do Vermes Do Limbo não têm cartaz entre os hipsters descolados, não ganham manchetes na mídia tradicional e, a bem da verdade, têm tudo (ou mais) a ver com o Centro Cultural: são um respiro no meio da mesmice da música “comercial”, experimentando, provocando e, também, divertindo.

Não entenda o parágrafo acima como uma determinação de valor. Não é. Cada um na sua. E na do Vermes Do Limbo e Baby Hitler até que tinha bastante gente.

Gente que foi atrás de respiro, mas que saiu sem ar, com as cacetadas de noise e batidas quebradas e desnorteantes de ambas as bandas.

A Vermes Do Limbo começou.

Já foi trio, já teve guitarra, agora é só Vinicius Patrial no baixo e Guilherme Pacola na bateria (aliás, um baita baterista inventivo). E basta pro tanto que a dupla faz. São músicas curtas, bem curtas, espalhadas por vários discos, mas ali eles estavam promovendo o seu novo sete polegadas duplo, “Panvermina”, lançado em 2015, com quatro músicas mais longas, que na verdade são várias músicas dentro de cada uma.

Pacola toca de um jeito quebrado, sem uma batida que você consiga acompanhar em palmas ou na batida do pé. Logo ele tá partindo por outro caminho, a música acabou e ele já acelerou em outra. Ele e Patrial gritam letras sem sentido, o baixo virado pros amplis a apitar, o entrosamento é refinado (é uma banda de mais de quinze anos de estrada), e é preciso fôlego pra tanta vitalidade. O Vermes Do Limbo é o caos de São Paulo: uma cidade ligeira, claustrofóbica, insana, com várias tintas, não-linear.

Foram trinta minutos extasiantes que abriram pro Baby Hitler, trio carioca formado por Negro Léo (guitarra e vocal), Renato Godoy (bateria, Chinese Cookie Poets) e Eduardo Manso (Bemônio, guitarra). Com um disco no currículo, o motossérrico “Hey Babe”, de 2014, a banda metralhou a plateia com guitarras assassinas, uma bateria inventiva (Godoy é outro baterista de colocar babador) e uma performance transpirante.

Tinha receio de que a dobradinha de noise e experimentação das duas bandas cansasse. Mas elas são substancialmente diferentes entre si. A Vermes é crua, quebrada, imprevisível. A Baby Hitler é mais compactada, às vezes soando punk, linear. Uma não tem guitarra, a outra tem duas. No centro, dois baita bateristas, além do desejo de sair do lugar-comum, como elo entre elas.

Durante uma hora, uma música que podia ter qualquer nacionalidade ocupou o espaço das minhas preocupações numa cidade que essencialmente parece só estimular preocupações – a não ser que você saiba aproveitar as oportunidades, como essa.

São Paulo em caráter de metrópole, de casa de mais de uma dezena de milhões, é receptiva a tudo. Do caos à invenção. Do sufoco ao respiro. Do debate à alienação. Da música palatável à experimentadora e desafiante. Tente aproveitar todas as faces dela.

Vermes Do Limbo tocando “Mentes”:

“Baby Hitler” tocando “Mayor Rob Ford’s Day” e “Hey Babe!”:

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