WALTER FRANCO NO SESC BELENZINHO – COMO FOI

A moda de interpretar discos clássicos na íntegra é uma das modas mais bacanas dos tempos escassos de originalidade da música atual. Do Primal Scream fazendo “Screamdelica” a Walter Franco mandando “Revolver”, clássico absoluto da doideira de 1975 (com a torcida ainda tentando ver Jorge Ben com seu “A Tábua De Esmeralda”, de 1974, quem sabe um dia), tudo é válido pra atingir gerações que não puderam ver ao vivo, no momento mágico em que as obras nasceram e foram apresentadas ao público, com toda a força e o impacto da criação.

Ainda bem que Walter Franco aceitou o convite do SESC pra apresentar seu “Revolver”. Os ingressos evaporaram, como era de se esperar. Na porta, segundo conta Raul Ramone (do blogue Degenerando Neurônios), que esteve lá e escreve a resenha abaixo, alguns esperançosos fãs (muitos deles jovens) buscavam um ingresso perdido. Em vão.

Quem entrou, viu um rechonchudo Walter Franco exibir sua obra-prima de cabo a rabo com desenvoltura – e ainda ganhou boas histórias.

Que essa moda nunca acabe.

UMA OBRA-PRIMA
Texto: Raul Ramone

Ver um show do Walter Franco apresentando a íntegra do álbum “Revolver” inevitavelmente transforma numa viagem a um passado que não vivi. Apesar de ser fã de rock clássico, nunca gostei da ideia de que o passado é melhor que o presente. Acho puro cinismo.

Mas a ideia de encarar um show em pleno domingo chuvoso de São Paulo (e frio) pra ouvir um ótimo disco lançado em 1975 também remete ao conceito de música como arte, algo que quase não existe mais no século vinte e um.

Canções como “Feito Gente” e “Eternamente” exploram um tipo de território que era bem comum no rock brasileiro da década de 1970, aquele que forçava as bandas e artistas a criarem um tipo de som que recebia influências externas ao mesmo tempo em que era levado a se reinventar diante da falta de tecnologia típica dos países de terceiro mundo. Assim nasceu “Revolver”, com sua poesia e camadas de eco absurdamente inovadores (quase perturbadores). Pelo menos teoricamente, ao ser tocado em pleno 2013, com toda tecnologia disponível, o disco deveria ser melhor compreendido pelo público consumidor de música. Mas acho que isso nunca será possível. Não no caso de “Revolver”.

A plateia era basicamente formada por pessoas acima dos 50 anos de idade, fãs de velha data do cantor, sedenta pra ver um espetáculo especial que iria apresentar o álbum de cabo a rabo, na sequência original. Não tinha como dar errado, portanto.

Mas teve mais. Franco conversou bastante com todos, falando sobre desde o técnico da mesa de som com 30 anos de parceria até a recente morte do Chorão (homenageado em “Nothing”).

Fica difícil apontar algum momento menor do repertório, principalmente quando toda a história das canções era contada antes de sua execução (em “Cena Maravilhosa”, por exemplo, descobrimos que a letra foi encontrada por acaso em um livro do poeta Cid Campos). Essas conversas enriqueciam o show.

Musicalmente, faixas como “Mamãe D’Água” (com a frase “Yara eu te amo muito mas agora é tarde eu vou dormir”, uma das melhores da história da MPB), e “Toque Frágil” surpreendem pelas reverberações apoteóticas potencializadas pela acústica muito boa do teatro.

A faixa-título, que encerra o lado b, resume bem a poesia concreta urbana de “Revolver” (“Lembrar de esquecer / Esquecer de lembrar / Cansar de dormir / Dormir descansar”), uma obra-prima da música popular brasileira, reverenciada com louvor nas dependências do SESC Belenzinho.

No bis, três canções que fogem da proposta do show. Foram elas “Serra Do Luar”, “Coração Tranquilo” (do “Respire Fundo”, de 1978) e “Canalha” (pra delírio da galera – do “Vela Aberta”, de 1980). De fato, uma tarde inesquecível de domingo, que até agora ecoa na cabeça de quem estava lá.

Pra finalizar, algum aventureiro gravou o concerto em sua totalidade, com uma pequena câmera digital. Ainda que com qualidade modesta, ajuda a nos transportar pra aquele momento único (veja abaixo).

01. Feito Gente
02. Eternamente
03. Mamãe D’água
04. Partir do Alto / Animal Sentimental
05. Um Pensamento
06. Toque Frágil
07. Nothing
08. Arte E Manha
09. Apesar De Tudo É Muito Leve
10. Cachorro Babucho
11. Bumbo Do Mundo
12. Pirâmides
13. Cena Maravilhosa
14. Revolver

Bis
15. Serra do Luar
16. Coração Tranquilo (trecho)
17. Canalha

Veja na íntegra (por Bolivia57):

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Comentários

comentários

Um comentário

  1. Apenas uma correção:
    o nome do pai do Walter Franco é Cid Franco. O Cid Campos é filho do Augusto de Campos, e chegou a colaborar em alguns discos e a tocar com o Walter.
    Abraços

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