Benedito Novo é um município relativamente novo: se emancipou em 1961, desmembrando-se de Rodeio, a menos de cinquenta quilômetros de Blumenau, ícone catarinense. É uma cidade pequena, bem pequena. Tem pouco mais de onze mil habitantes, com Índice de Desenvolvimento Humano alto (0,74).
O turismo de aventura é um forte no local, com trilhas, canoagem, grutas etc. A cultura alemã é marcante. O clima é ameno, com invernos frios e verões de agradáveis a quentes, mas o cenário natural montanhoso e verde dá uma ideia mais de aconchego outonal.
Não admira que num cenário bucólico desses surja uma banda como a WOLKEN.
O quarteto formado em 2015, por Felipe Locks (voz e guitarra), Leo Victor Koprowski (guitarra), Billy Gireli (baixo) e Eduardo Dallabona (bateria), namora entusiasticamente a sonoridade do Real Estate – e basta ouvir o belo disco de 2014, “Atlas”, pra ter noção da semelhança – o que casa como um quadro na moldura certa com a ambientação da cidade.
Como quase toda banda, no começo era o divertido caos, sem direção. Leo e Eduardo começaram a ensaiar juntos, por diversão, tocando versões de Real Estate e Mac DeMarco. Billy logo se juntou à dupla. Mas, segundo Leo conta, ainda faltava um vocalista: “a ideia era que eu cantasse, mas nos vocais eu sou um pouco melhor do que nas guitarras, ou seja, horrível”.
Como Benedito Novo (e região) é uma área pequena pra achar alguém que aderisse a esse tipo de sonoridade só por diversão, o trio deu sorte de achar numa rede social o Felipe, que tinha afinidade musical e mora ali perto. Leo e Felipe trocaram rifes e trechos de composições e logo a Wolken tinha um vocalista.
“Benedito é bem pequena, fica a uma hora e meia de Blumenau, não me lembro de outra banda alternativa por aqui. Em Timbó existem bandas autorais, mas não nesse estilo. Esse foi um dos motivos de decidirmos levar a frente a banda, além de ser um estilo que gostamos bastante, queriamos mostrar algo diferente”, conta Leo ao Floga-se.
“Passar nossa realidade vivendo no interior é algo que buscamos, e ainda queremos melhorar pros próximos trabalhos. Acho que torna o trabalho mais honesto. É o que somos. Tanto no som quanto propriamente nas letras. Duas das quatro canções do EP (‘Fading Colours’ e ‘Take Out’) tratam da chuva no período de setembro, que vem constantemente afetando nossa rotina”, diz.
O nome da banda veio como reforço dos pilares do ambiente em que vivem: “estávamos um bom tempo pensando em algum nome que expressasse de alguma maneira nossa proposta sonora. Wolken significa ‘nuvens’ em alemão. Achamos que combinava com o feeling etéreo e quase onírico que pretendemos alcançar com nossa música. E de certa forma, o fato da palavra ser alemã também remete a nossa origem, vivendo em cidades colonizadas por alemães”.
Da troca de sons entre Leo e Felipe saiu o embrião do viria a ser o primeiro EP do grupo, “Caos Calmo”, nome bem apropriado ao que a música expõe: “a ideia do som é passar uma sensação de conforto, ainda que exista um certo caos por trás disso tudo”.
Curiosamente, com um nome em alemão, numa cidade culturalmente alemã, o título do EP remete diretamente a um filme italiano, “Caos Calmo”, de 2008, dirigido por Antonello Grimaldi e escrito e estrelado pelo comediante Nanni Moretti. “Eu gosto bastante do Nanni Moretti. E acho bacana essa interação entre as artes”, revela Leo. O título de outra canção, “Environ De Louvenciennes”, vem de um quadro do francês Alfred Sisley, de 1873.
Mas o EP nasceu mesmo graças ao esforço da parceria com uma dupla de Blumenau, Roberto ‘Swan’ Lucena e Lola Belli, criadores da Aquagreen Records, que se empolgaram com a banda e fizeram questão de gravá-la, no estúdio Takeout, e lançá-la.
“O cara comprou a ideia da banda desde o início. E por uma ótima coincidência, a proposta da nossa banda foi de encontro a uma ideia que o Swan e sua esposa, a Lolla, estavam querendo por em prática: um selo independente focado nas bandas alternativas do médio vale do Itajaí”, conta.
Swan é importante também nessa fase inicial da banda na hora de marcar shows. A região, imagina-se, não oferece muitas opções, de modo que a Wolken tocou pouco ao vivo até aqui. “Nos apresentamos em Timbó no bar de um amigo – foi um show secreto, anunciado no dia, pois o lugar também é pequeno – e fizemos o lançamento do EP pra uns quarenta amigos aqui na minha casa em Alto Benedito. Opções pra valer só em Blumenau. O Swan está agendando outros shows por cidades maiores aqui da região, como Jaraguá e Rio do Sul, pois ele já está na estrada há um bom tempo e possui contatos. Todas as vezes que tocamos, a galera veio comentar que estamos reproduzindo bem o feeling do EP. Ficamos felizes com isso. Acredito que com o lançamento de mais material, conseguiremos tocar fora da nossa região”.
Ouça na íntegra:
O EP tem cinco canções, do mais agradável dreampop. Mas mudanças aparentemente vêm por aí, nos próximos passos. É uma banda em maturação.
“Nosso som é simples e melancólico, pra ouvir tomando uma cerveja na madrugada ou num sábado de sol com os amigos. E eu faço questão de frisar esse ‘simples’, porque eu não sou um bom guitarrista, em termos técnicos. E se analisarmos artistas como Real Estate e Mac DeMarco, o nível técnico não é alto, mesmo assim o conjunto cria algo sincero e bonito. É isso que eu queria. É um aspecto democrático, quase. O Mac DeMarco usar a mesma guitarra de trinta dólares que ele usava desde a adolescência até recentemente é algo que encoraja as pessoas a se arriscarem também. Eu criei todas as composições com uma guitarra Michael que meu irmão ganhou quando eu tinha 13 anos, e sem nenhum tipo de pedal. Eu adaptei tudo depois só na hora da gravação. Eu acho que já chegamos muito perto do que eu eu tinha em mente pra nosso som nesse primeiro EP. Mas ter a oportunidade de criar uma música com uma maior diversidade de equipamento ajuda muito. Podemos experimentar mais. Eu particularmente já percebi isso nessa novas músicas que estou trabalhando. Um exemplo prático: quando eu tinha apenas a guitarra seca, e sem muita experiência com banda, a tendência é você encorpar mais as músicas. Com mais acordes. Com um bom equipamento, principalmente os pedais, não existe tanto essa necessidade. Consigo deixar a música mais limpa e leve, onde ainda entrará a segunda guitarra. Acho que isso irá ser refletido nessas novas composições”, conta.
E completa: “minha ideia sempre foi compor em português. Acho que o Brasil está passando por um momento de fortalecimento da cena autoral, principalmente pelo crescimento dos selos independentes. Você não precisa fazer música ‘pros gringos’. Boogarins é um exemplo recente de que podemos ultrapassar a barreira do idioma. As composições desse EP acabaram sendo em inglês pelo fato do Felipe compor já há um bom tempo em inglês. Como estávamos começando, ainda buscando uma maior afinidade, optamos por seguir o fluxo. Acho que o compor em português irá criar uma identidade mais forte com o ouvinte”.
1. Caos Calmo
2. Environ De Louvenciennes
3. Asthmatic
4. Fading Colours
5. Take Out The Living Room Furniture