Supergrupo é uma denominação normalmente sensacionalista que a imprensa gosta de utilizar pra se referir à união de músicos de duas ou mais bandas num mesmo projeto. Nem sempre são de fato “supergrupos”, mas um amontoado de músicos montando um novo grupo. Acontece que no caso do Reindeer Section essa denominação pode ser usada com precisão, justamente porque se trata de um supergrupo, seja no número de artistas envolvidos, seja pela importância desses artistas.
Nos dois discos lançados pelo coletivo – é mais apropriado usar esse termo -, “Y’All Get Scared Now, Ya Hear!” (2001) e “Son Of Evil Reindeer” (2002), passaram nada mais do que trinta e quatro personalidades da música britânica/escocesa. A lista é grande, mas vale desenrolar: do Snow Patrol, Gary Lightbody, Mark McClelland e Jonny Quinn; do Arab Strap, Colin Macpherson, Malcolm Middleton e Aidan Moffat; do Alfie, Ben Dumville, Lee Gorton e Sam Morris; do Astrid, William Campbell, Charlie Clark, Neil Payne e Gareth Russell; do Belle & Sebastian, Richard Colburn, Mick Cooke e Bobby Kildea; do Idlewild, Roddy Woomble e Gareth Russell (que não estava na banda à época); do Mogwai, John Cummings; do Mull Historical Society, Colin MacIntyre; do Teenage Fanclub, Norman Blake; do Vaselines, Eugene Kelly; além de Iain Archer (Cadet), Jenny Reeve e Sarah Roberts (Eva); Johnny MacArthur e Jonathan Renton (The Wendys); Stacey Sievwright (The Moth & The Mirror); e Michael Bannister, Roy Kerr, Paul Fox, Gill Molls e Marcus Mackay.
Alguns participaram do primeiro disco, alguns apenas do segundo, outros dos dois. Mas todos giraram em torno de Gary Lightbody, o cabeça do Snow Patrol, que teve a ideia da união dessa seleção de talentos (num dia de intensa bebedeira) e acabou compondo ambos os discos, o que faz, na verdade, do The Reindeer Section uma extensão do Snow Patrol ou, com uma lupa mais precisa, um projeto-solo-com-amigos de Lightbody.
A sonoridade não se afasta muito do próprio Snow Patrol, embora em “Son Of Evil Reindeer” tenha assinatura de todas as canções como algo coletivo (ao contrário do primeiro disco). A exceção é “Where I Fall”, que tem assinatura apenas de Lightbody. Essa coletividade faz do segundo álbum algo um pouco mais versátil (“Strike Me Down” poderia estar num disco do “Belle & Sebastian”).
A imprensa à época anotou a peculiaridade. A Entertainment notou que “os supergrupos raramente têm mais de um bom álbum (e em alguns casos nem isso), mas felizmente o coletivo The Reindeer Section provou ser a exceção à regra. Sonhado em um momento de embriaguez por Gary Lightbody, líder dos luminares da Irlanda do Norte Snow Patrol, essa equipe heterogênea é composta por vinte e sete membros da liga principal de bandas escocesas (Belle & Sebastian, Arab Strap, Mogwai, Idlewild etc.). Dado que tantas pessoas estão a bordo, a música que elas produzem é surpreendentemente coesa – uma marca suave que mistura folk e indie melódico (…), sem nunca dar lugar à perversidade. Talvez a falta de pressão envolvida em projetos paralelos tenha tido um efeito benéfico, já que estrelas como Aidan Moffatt, Norman Blake e Roddy Woomble fazem contribuições de primeira classe aqui, que são facilmente equiparáveis a tudo o que alcançaram com suas próprias bandas recentemente. Não é apenas uma novidade, então, mas um belo álbum por si só e uma espécie de triunfo pra ética indie que representa com tanto orgulho”.
Já a PlayLouder nota que apesar de grande time de nomes relevante, o álbum é “totalmente não essencial, totalmente inofensivo, mas verdadeiramente sedutor, e continua sendo um registro encantadoramente radiante. Se esse tipo de som não é sua coisa, nem chegue perto. Se, no entanto, onze músicas de beleza luminosa e encantadora forem a sua, então The Reindeer Section pode ser o supergrupo independente que você está procurando”.
O alcance (indie)pop do álbum chegou à recém rebatizada Pitchfork sem causar tanta emoção, apesar do time claramente propenso a retirar suspiros daquela redação: “como um domingo chuvoso, é calmante em pequenas quantidades, mas pode induzir incomodar por longos períodos”.
A verdade é que “Son Of Evil Reindeer” não podia passar desapercebido por quem quer que tivesse ouvidos atentos àquele nascente melancólico indiepop que assumia seu lugar ao sol no novo século. O rol de nomes não permitia tal desprezo. O problema é que o tempo fez com que o disco e o coletivo ficasse como linha auxiliar do Snow Patrol, como se imaginava. Tanto que duas das melhores canções aqui, “Cartwheels” e “You Are My Joy”, acabaram na coletânea “Up To Now” (lançada em 2009), que vasculhava de cabo a rabo a carreira do Snow Patrol até ali.
Dessa forma, melancolicamente, o The Reindeer Section foi ficando no passado, como o resultado de um sonho nascido de uma noite de bebedeira, uma boa lembrança pros apreciadores do indie e nada mais. E não como o coletivo autor de dois discos perspicazes em agregar tantas mentes capazes de criar músicas preciosas, agradáveis e assobiáveis, especialmente o segundo álbum.
Um supergrupo que merece o título.
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The Reindeer Section em “Son Of Evil Reindeer” é:
Gary Lightbody (vocal, guitarra e sintetizador)
Aidan Moffat (vocal)
Bob Kildea (guitarra)
Charlie Clarke (violão e vocal de apoio)
Colin Macpherson (piano e órgão)
Eugene Kelly (vocal)
Gareth Russell (baixo)
Gill Mills (vocal de apoio)
Iain Archer (guitarra steel)
Jenny Reeve (violino e vocal de apoio)
John Cummings (guitarra)
Jonny Quinn (bateria)
Lee Gorton (vocal)
Malcolm Middleton (guitarra)
Marcus Mackay (programação)
Mark McClelland (moog)
Stacy Sievewright (violoncelo)
Willie Campbell (violão e vocal de apoio)
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Álbum – Son Of Evil Reindeer
Lançamento – 13 de dezembro de 2002
Gravadora – Bright Star Recordings e PIAS
Tempo total – 40 minutos e 47 segundos
Produção – Tony Doogan e Gary Lightbody
01. Grand Parade
02. Budapest
03. Strike Me Down
04. Your Sweet Voice
05. I’Ll Be Here
06. Where I Fall
07. Cartwheels
08. Last Song On Blue Tape
09. Cold Water
10. You Are My Joy
11. Who Told You
12. Whodunnit