O mundo já contou trinta e dois milhões de casos confirmados e chega a um milhão de mortos ainda em setembro. Isso levando-se em conta a conhecida brutal subnotificação de países subdesenvolvidos como Brasil (que também tem um governo negacionista). É provável que a conta seja muito maior.
Mesmo assim, há gente em estado puro de negação, acreditando em teorias da conspiração. Entre esse pessoal, artistas como Van Morrison, Ian Brown e Noel Gallagher.
Em 18 de setembro de 2020, Van Morrison, de recém-completados 75 anos de idade, grupo de risco, pois, anunciou que ia lançar algumas músicas anti-isolamento social, ou anti-lockdown. Uma delas tem os seguintes versos: “No more lockdown / No more government overreach / No more fascist bullies / Disturbing our peace / No more taking of our freedom / And our God-given rights / Pretending it’s for our safety / When it’s really to enslave”.
O norte-irlandês disse: “não estou dizendo às pessoas o que fazer ou como pensar. O governo já está fazendo um ótimo trabalho nisso. É uma questão de liberdade de escolha. Acredito que as pessoas devem ter o direito de pensar por si mesmas”.
É bonito apelar pro porto-seguro da “liberdade de expressão”. Mas o discurso é perigoso, como bem lembrou o ministro da Saúde do país, Robin Swann: “esperávamos mais dele… Parte do que ele está dizendo é realmente perigoso. Isso pode encorajar as pessoas a não levarem o coronavírus a sério. Se você vê tudo como uma grande conspiração, então é menos provável que siga os conselhos vitais de saúde pública que mantêm você e outras pessoas seguras”.
“Suas palavras darão grande conforto aos teóricos da conspiração – a brigada que faz uma cruzada contra máscaras e vacinas e pensa que tudo isso é um enorme complô global pra remover as liberdades”, lamentou.
É fácil cair nesse discurso. Com as redes sociais e ferramentas de comunicação em massa, o ser humano conseguiu negar que a Terra seja redonda. Quem acredita que a Terra é plana, acredita em qualquer bobagem.
O ministro norte-irlandês usa a própria arte de Morrison pra lamentar: “é tudo bizarro e irresponsável. Só espero que ninguém o leve a sério. Ele não é guru, não é professor” – referindo-se ao álbum de Morrison de 1986 “No Guru, No Method, No Teacher”.
Não é só ele, claro. Ian Brown, ex-líder do Stone Roses, uma das bandas preferidas aqui da casa, está lutando contra a ciência.
Um dia antes de Morrison, Brown lançou uma música chamada “Little Seed Big Tree” (que o Floga-se deliberadamente não deu destaque), questionando as medidas do governo inglês que tentam conter a Covid-19.
Ele já havia se declarado anti-lockdown e contra o uso de máscaras, recentemente.
“A sonic lockdown in your home town/ A sonic lockdown, can you feel me now? / A sonic lockdown, state shakedown, a mass breakdown / Put your muzzle on, get back in your basket / Get behind your doors cos living here is drastic”, ele canta.
Dia 14 de setembro, ele tuitou: “então eu sou um Teórico da Conspiração HA! um termo inventado pela mídia manca para desacreditar aqueles que podem cheirar e ver através das mentiras e propaganda do governo”.
Brown pode ter exergado um inimigo realmente nefasto pra onde apontar sua fúria: o primeiro-ministro britânico Boris Johnson, um negacionista de primeira cepa, que fez, como Jair Bolsonaro no Brasil, um estrago no país ao dizer que a Covid-19 era inofensiva.
Até que pegou a doença e foi parar na UTI. Sarou e repensou suas sandices. Virou defensor do lockdown. Pelo menos até a segunda página. Ou até a segunda onda. Agora, reluta em implantar novo fechamento geral, diante do avanço cada vez maior do vírus em seu país.
É fácil não gostar dele. Foi Johnson um dos líderes xenófobos que levaram o Reino Unido a sair da União Europeia. O Brexit tem muito da sua impressão digital de extrema-direita. Mas, ao menos, ele não anda negando a ciência.
A epidemia no Reino Unido está dobrando de tamanho aproximadamente a cada sete dias e, se esse ritmo continuar, haverá cerca de cinquenta mil novos casos por dia em outubro, disse o conselheiro científico-chefe do governo, Patrick Vallance, no último dia 21 de setembro.
Quarenta e duas mil pessoas já morreram no Reino Unido por conta da doença. Todas essas pessoas não vão poder ouvir a música de Brown, nem de Morrison. E não vão ter o desgosto de ler as sandices de Noel Gallagher, tratado como o “gênio” do Oasis.
Num podcast, atacou o uso de máscaras: “não é uma lei. Há uma cacetada de liberdades sendo tiradas de nós agora… Eu escolho não usar uma. Se eu pegar o vírus, está em mim, não está em mais ninguém… é um problema. Não há necessidade. Elas são inúteis”.
Não são. A Organização Mundial da Saúde (OMS) garante que são a melhor barreira contra o vírus, caso o isolamento social seja frustrado.
O governo de Johnson vai aplicar pesadas multas a quem for pego sem máscara.
Gallagher disse não vai usar em trens e lojas: “eu estava indo pra Manchester na outra semana e um cara disse, ‘você deve colocar sua máscara’ no trem, ‘porque a polícia vai entrar e multar você em mil libras. Mas você não precisa colocar se estiver comendo’. Eu disse: ‘ah, certo, esse vírus assassino que está varrendo o trem vai vir e me atacar, mas se me vir comendo um sanduíche ele desiste?'”.
Talvez a melhor solução seja você não comer um sanduíche no trem. Mas usar máscara. Ou, talvez, nem andar de trem nesses tempos.
Em 24 de abril, o DJ da Indonésia Gilang Mullins lançou seu single “Antilockdwon”. A praga negacionista está em todo lugar.
Naquele mesmo mês, a Deutsche Welle mostrava uma reportagem com protestos anti-isolamento no Brasil, Esteites e Alemanha. Nos dois primeiros, incentivados pelo próprio governo.
Isso mostra que essa gente não está sendo “antissistema”, como imagina. Está sendo usada pela sistema. Donald Trump e Bolsonaro querem exatamente esse diversionismo pra, entre outras coisas, tirar o foco das próprias incompetências em lidar com a crise. E, claro, há uma questão ideológica mais profunda.
Em 2019, matérias inacreditáveis começaram a pipocar na mídia de celebridades, depois que a atriz Jessica Biel, casada com Justin Timberlake, deu seu apoio à campanha contra vacinas nos Esteites. Ela apareceu na Assembleia Estadual da Califórnia pra dar apoio a Robert F. Kennedy Jr., que alega que as vacinas são inseguras.
Mais uma vez, alegou um “direito”: “não sou contra as vacinas – eu apoio o fato de as crianças serem vacinadas, como apoio o direito que as famílias têm de tomar melhores decisões médicas pras suas crianças”. Não disse qual seria a alternativa pra uma vacina, por exemplo, contra a pólio ou o sarampo.
Há outros artistas nessa negação.
Charlie Sheen chegou a contratar um advogado pra negar a vacinação às duas filhas que tem com a atriz Denise Richards. A comediante Jenny McCarthy culpa as vacinas pelo autismo de seu filho. Outro comediante, Rob Schneider, também crê que vacinas levam ao autismo, assim como, acredite, Robert DeNiro. O ator Jim Carrey e Alicia Silverstone são dessa turma antivacina.
Recentemente, o movimento antivacinação foi incluído pela OMS em seu relatório sobre os dez maiores riscos à saúde global.
Segundo a OMS, as razões pelas quais as pessoas escolhem não se vacinar incluem falta de confiança, religião, complacência e dificuldades de acesso (nesse caso, culpa dos governos).
A OMS afirma que vacinar “é uma das formas mais eficientes, em termos de custo, pra evitar doenças. Ela atualmente evita de duas a três milhões de mortes por ano, e mais um milhão e meio de mortes poderiam ser evitadas se a cobertura vacinal fosse melhorada no mundo”.
“As vacinas foram o maior avanço da história da medicina”, diz o médico Drauzio Varella.
“A expectativa de vida dobrou entre 1900 e o ano 2000. O que causou essa revolução? Não foi a medicina que a gente pratica no dia a dia. Controle da pressão, tratamento do câncer… Não foi isso, porque essas doenças atingem a população mais idosa. Quando você tem uma pessoa que morreria de infarto aos 60 anos e você trata rapidamente e ela escapa do infarto, ela vai acabar morrendo depois por outra doença. Agora, quando você tem uma criança que morreria aos dois anos de idade por uma doença infecciosa, e essa criança vai morrer aos 80 anos, ela puxa a expectativa de vida lá para cima. A grande responsável por esse aumento da expectativa de vida foi a vacinação”, afirmou em uma matéria de 2019 do G1.
Entretanto, os artistas seguem negando dados, estatísticas e a ciência.
No Brasil, os artistas ligados ao bolsonarismo relinchante é que assumem a posição negacionista.
O sertanejo Gusttavo Lima declarou em uma live no Instagram, pra vinte e nove milhões de seguidores, que a “mídia esconde o esforço do governo e não noticia que já saiu essa cura, essa vacina”.
O comentarista esportivo Milton Neves argumenta que “foi mais fácil cancelar as aulas do que o Carnaval”, mesmo que no Carnaval não houvesse um só caso confirmado no Brasil – o primeiro foi em São Paulo, na Quarta-feira de Cinzas, dia 26 de fevereiro.
O vocalista do Ultraje A Rigor, Roger Moreira, é um conhecido bolsonarista e negacionista. Nascido em 1956, tem 64 anos. Grupo de risco. Ele acha que respeitar o isolamento e criticar Bolsonaro por não se isolar é criticar o governo e só critica o governo que perdeu as “tetas” pra mamar.
No Brasil, mais ou menos como na Inglaterra de Boris Johnson, houve uma associação política direta da pandemia. Mas, ao contrário de lá, os negacionistas aqui são pró-governo.
Na era de informação, o que está ganhando é a desinformação.
E revoltante e ao mesmo tempo triste ver tanta gente que vc curtia nas telas e nos fones falar tanta besteira.
Enxergar apenas com o umbigo leva a essas…. conclusões.
Mostra também que talvez não saibam viver realmente em sociedade.
E Ian Brown nunca escondeu seu desejo…” I wanna be adored”….talvez pela música… mas pelas “palavras”….vai ser difícil.
Ai ! O eu me amo ficou bravinho !!!! Acho que ele precisa fazer sexo com zero 1