O que a Giallos tem de bom? Bem, pra começar é aquele tipo de banda que te pega na primeira vez que você ouve, mas não por qualidades esperadas, como melodia, beleza, poesia, e sim por aquele soco nostálgico no estômago, que se sentia na adolescência ao ouvir aquela música que iria mudar sua vida. Vale também se sua adolescência for agora – pode ser a música que vai mudar sua vida, quem sabe.
Há no seu primeiro disco, “¡CONTRA!”, de 2013, uma mistura acachapante de punk, funk, The Fall, Patife Band, Replicantes, ginga, raiva, malandragem e… poesia.
Flávio Lazzarin (bateria), Luiz Galvão (guitarra) e Claudio Cox (vocais) colocam tanta energia nas execuções que é impossível não se impressionar.
Mesmo assim, a despeito de tudo isso, não deixei me seduzir de cara. Foi preciso ver uma apresentação ao vivo (essa aqui) pra sacar o que é a Giallos: caso raro em meio a tanta fofice produzida no Brasil pós-Los Hermanos. É o típico caso do conselho: “compre o disco, vista a camisa, vá ao show”.
A música jovem precisa às vezes dar um soco no estômago pra te pegar. E a Giallos juntou um bocado de coisas que são “soco no estômago” pra criar seu próprio “soco no estômago”.
A receita está um terço aqui. Claudio Cox, o insano vocalista do trio, junta os dez “Discos da Vida” que explicam um tanto dessa mistura. E você verá que é uma baita mistura, com muitos “socos no estômago” e algumas belezas malandras. Ajuda um pouco a entender o Giallos. Mas quer saber? Compre o disco, vá ao show. Seu estômago agradece.
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CLAUDIO COX (vocal)
“Mimimi: Adoro listas, mas você sempre acaba deixando alguma coisa de fora, não tem jeito. Nessa ficaram pelo menos mais uns cinco com o mesmo grau de importância, paciência. Usei um critério de colocar discos que fizeram parte da minha vida até os meus vinte e poucos anos, depois disso, tudo é lenda!”
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Ramones – “Rocket To Russia” (1977)
Escuto esse disco desde os meus doze anos de idade, sem longas interrupções. Recentemente recomprei-o em vinil – o que eu tinha (comprado nos anos 80) estava literalmente gasto. Pra mim, os Ramones foram a melhor banda de rock que já existiu e é a banda da minha vida, do visual ao som. No palco era foda, assisti cinco vezes e todas foram inesquecíveis. “Rocket To Russia” é o auge da banda. Lembro que na época rasguei minha calça jeans nos joelhos por causa desse play e minha mãe ficou puta da vida.
Ouça “Teenage Lobotomy”:
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Mundo Livre S/A – “Samba Esquema Noise” (1994)
O mais recente dessa lista, mesmo assim acabou de completar vinte anos de idade. Punk com samba, cavaquinho, guitarra e letras altamente políticas, mas com um senso de humor incrível. O Mundo Livre S/A foi a última grande banda brasileira da minha vida. Fui nos shows de lançamento de todos os discos dos caras. Fred 04 é uma das minhas maiores influências como letrista.
Ouça “Musa Da Ilha Grande”:
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Jorge Ben – “A Tábua De Esmeralda” (1974)
Acho que uma das primeiras vezes que ouvi falar desse disco foi na revista BIZZ. Lembro que tinha uma sessão de álbuns clássicos e rolou uma matéria sobre relançamento em massa da fase clássica (anos 60 e 70) do Jorge Ben em CD. Comprei o “Tábua…” e o “Big Ben” nessa jogada. O “Big Ben” tinha uma levada meio bossa e não bateu legal na época, mas o “Tábua De Esmeraldas” foi amor à primeira ouvida. Cara, eu queria ser o Jorge Ben, fiz até uma letra na época chamada “Freak Ben”. Dia desses, fomos tocar no Rio e ficamos hospedados no apartamento de uma amiga do Lê Almeida, tinha uma vitrolinha lá e um monte de discos, o “Tábua…” foi um dos primeiros que ele botou pra gente ouvir nesse rolê. Continua lindo.
Ouça “Menina Mulher Da Pele Preta”:
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Funkadelic – “Maggot Brain” (1971)
Gostava de Hendrix e colava numa loja clássica aqui de Santo André, a Metal Discos, cujo o dono era um especialista no assunto. Foi ele que me apresentou o “Maggot Brain”. Lembro da frase até hoje: “Gosta de Hendrix, então pode levar sem medo”. E não é que o cara tava certo? Como é que um disco de 1971 poderia ser tão atual? Os Chilli Peppers (sim, eles já foram foda!) tinham acabado de lançar o “Blood Sugar Sex Magik” e tava todo mundo pirando, de repente apareci com o “Maggot Brain” debaixo do braço e disse: achei a fonte, rapaziada! Ano passado vi a “Maggot Brain” (música) ao vivo no show do George Clinton. Chorei.
Ouça “Maggot Brain”:
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Black Sabbath – “Paranoid” (1970)
A primeira vez que ouvi Sabbath foi numa coletânea de sucessos, era uma capa horrível com uma caveira pegando fogo, mas tinha todos os clássicos da Era Ozzy. Chapei. Estava largando o radicalismo sonoro do punk e comecei a traição do movimento em grande estilo. “Paranoid” foi o primeiro disco oficial da banda que comprei, acho que fiquei mais de ano só ouvindo esse disco. “Can you help me? Occupy my brain? Oh yeah!”.
Ouça “Paranoid”:
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De Falla – “Kingzobullshitbackinfulleffect92” (1992)
Entre 92 e 93 eu devo ter visto uns dez shows do De Falla, tudo no finado Aeroanta, em São Paulo. Os caras já eram tudo que os anos 90 iriam ser na minha vida. Tinha punk, trash, funk, rap, psicodelia e o escambau. Recentemente fui a uma apresentação que os amigos do Mickey Junkies fizeram no Sesc Belenzinho. Nessa peleja chamaram o Edu K pra fazer uma participação especial e tocaram juntos “Caminha (Q Aqui É De Osasco)”, música que o Rodrigo Carneiro é um dos personagens. Chorei 2.
Ouça: “Caminha (Q Aqui É De Osasco)”:
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Camisa De Vênus – “Camisa De Vênus” (1983)
Outro que vem lá do começo da adolescência. Até hoje sei todas as letras desse disco de cor. Nessa época rolavam aqueles bailinhos de garagem e toda vez a gente queria escutar esse disco inteiro. Era uma zona, a molecada ficava gritando junto, parecia show. As mina ficava tudo bravinha de canto querendo ouvir as “lentas”. Outra influência monstro.
Ouça “O Adventista”:
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Bezerra Da Silva – “Alô Malandragem, Maloca O Flagrante” (1986)
Esse era top hit nas festas de fim de ano em casa. É outro que sei todas as músicas até hoje. Era engraçado porque eu não entendia nada daquelas gírias loucas, mas pirava mesmo assim. Consegui ver só um show do Bezerra, já no fim da carreira, meio debilitado e tal. Malandro, o cara era um mito.
Ouça “Malandragem Dá Um Tempo”:
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The Jimi Hendrix Experience – “Are You Experienced?” (1967)
Eu ouvia “Hey Joe” no rádio e achava legal, mas não tinha a mínima ideia do que era aquela banda e aquele neguinho. Quando ouvi o “Are you Experienced?” inteiro pela primeira vez o céu se abriu e os anjos negros tocaram cornetas (guitarras). Meses atrás, um amigo foi pra Zoropa e me trouxe de presente o último “lançamento” do Hendrix, uma coleta chamada “People, Hell And Angels”. Depois de ouvi-la, numa roda de amigos surge aquela velha pergunta de sempre: “o que o Hendrix faria hoje em dia?”. Eu também quis ser o Jimi Hendrix um dia. Gênio.
Ouça “Fire”:
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Cólera/Ratos de Porão – “Ao vivo No Lira Paulistana” (1985)
Na sétima série, fui estudar à noite, eu já gostava de punk, principalmente os nacionais, e um cara me apresentou esse disco. Fiquei uns seis meses com ele em casa, ouvia todo dia; antes de devolver, gravei uma fitinha, que também gastou. Passou o tempo e nunca mais tinha tido contato com essa bolacha. Quando resolvi comprá-la definitivamente, ela já tinha virado “cult” e nego queria te furar na faca pra vender. Recentemente um doido relançou em vinil, verde, igual ao original, e finalmente descolei uma cópia. “Aê Macá, chega aí!”. Crássico.
Ouça o lado do Ratos De Porão na íntegra:
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Na edição anterior, “Os Discos da Vida: Raul Ramone”.