“Hiperesferas” é o terceiro lançamento de Pedro Salvador (que é de Maceió) em 2020. Os outros dois, o rockão “Traste”, de julho (ouça aqui); e “Frutificações”, de agosto, com A Baga Do Futuro (ouça aqui); são diferentes deste EP, e talvez seja interessante você começar o contato com a obra dele por este disquinho.
Uma única música, vinte e três minutos, sintetizador, colagens, vozes, flauta e um clima um tanto misterioso. Salvador consegue flertar com o jazz e com a ambient com tal sutileza, especialmente no trecho do coro de vozes, a partir do décimo sexto minuto, que faz o ouvinte ser carregado como num ideal cinematográfico (eu pensei em “2001, Uma Odisseia No Espaço”, mas eu sempre penso em “2001”).
Há uma frase que aparentemente resume o trabalho: “na tangente das dimensões superiores, o pensamento”.
Segundo o próprio artista escreveu em uma rede social, “a ideia é: somos entidades cujos movimentos e ações se limitam às três dimensões espaciais. Porém, através do pensamento talvez estejamos interagindo com objetos em dimensões superiores. Talvez o próprio ‘espaço’ da mente seja uma dimensão em si. Talvez seja aí onde ideias, conceitos, memes se organizam enquanto partes de organismos vivos quatridimensionais. Talvez eu esteja extrapolando tolamente conceitos que nem compreenda direito”.
As outras dimensões – e não há quem não goste de pensar nelas – idealizam um mundo menos conflituoso e mais ajeitado. As simetrias, os espaços, as massas, tempos, espera-se características diversas da nossa compreensão bastante limitada.
Criar música (ou qualquer arte) é trafegar em uma nova dimensão em si. O inimaginável e intangível, pra maioria das pessoas analfabetas nessa capacidade. Eu incluso. Por isso, esta simplificação da leitura e do entendimento de uma obra que é mais rica (do que esta análise).
“Hiperesferas” não sugere a reflexão de qualquer coisa em especial. Mas qualquer reflexão. E isso já é o bastante em um mundo que pensar virou, lamentavelmente, processo indesejado.
O disco foi lançado em 25 de setembro de 2020, pelas mãos do selo Voragem, “especializado em música anarco-futurista pós-africana” – e desafio alguém a achar uma definição mais bacana.
Na descrição da obra, o selo fala que “Pedro Salvador continua lançando novos sons e expandindo as fronteiras de sua música psicodélica. ‘Hiperesferas’ é uma jornada de 23 minutos através da qual Pedro brinca com música eletrônica, semiótica e multidimensionalidade do espaço-tempo. Referências: Bulent Arel, Ussachevsky, Sun Ra”.
Ele mesmo executou sintetizador, colagens, guitarra e flauta.
No coro, Flaviane Monteiro, Julia Soares, Lara Melro, Magda Braz, Natalhinha Marinho, Reuel Albuquerque, Thame Ferreira e Thiago Alef.
E há a capa (de Tay), que une Dali e Hitchcock.
1. Hiperesferas
