Hoje é 1º de março de 2021. Daqui a dez dias, em 11 de março, fará um ano exato que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou pandemia por conta da Covid-19.
Dia 27 de fevereiro, apareceu o primeiro caso oficial no Brasil (sim, é altamente possível que muitos tenham sido infectado antes, sem detecção oficial). Dia 17 de março, veio a primeira morte. Desde então, a tragédia. Até o momento, mais de 255 mil pessoas morreram no Brasil, em decorrência da doença – oficialmente, porque teve muita morte por “pneumonia” por aí.
E só piorou. Enquanto outros países buscam alternativas pra melhorar suas situações internas, o Brasil faz de tudo pra piorar. Fevereiro de 2021 foi o segundo pior mês da pandemia no país. Com apenas 28 dias, fechou com 30.438 mortes no Brasil. O pior mês é julho de 2020, com 32.881 (e 31 dias). Fevereiro é também o segundo pior em número de casos confirmados: 1.346.528. O primeiro é janeiro de 2021 (também 31 dias), com 1.531.912 casos.
Por aqui, só se pensa em “salvar a economia”. A economia está acima da vida de tal modo que o governador-tampão do estado do Rio de Janeiro afirmou que seu governo não vai comprar vacinas porque isso “gera aumento de despesas”. Não acredita em tal absurdo? Clique aqui.
Claro, Cláudio Castro (PSC) é bolsonarista convicto e dá todo apoio a Jair Bolsonaro, talvez o maior genocida em posto de comando desde Slobodan Milošević, ex-ditador da Sérvia.
Há inúmeras amostras de como Bolsonaro não só negligenciou a crise sanitária e humanitária como sabotou qualquer maneira de combatê-la.
Nenhum país do mundo lidou de forma tão ruim com a pandemia como o Brasil. É o que afirma um estudo publicado em janeiro pelo instituto australiano Lowy, baseado em Sidney.
Os pesquisadores analisaram a reposta à crise em noventa e oito países, com base em seis critérios: mortes confirmadas, casos confirmados, casos por cada milhão de habitantes, mortes por milhão de habitantes, casos em proporção à testagem, testes por cada mil habitantes. Critérios numéricos, portanto.
Se os australianos levassem em conta declarações, atos, atitudes de Bolsonaro, talvez tivesse abrir outra frente pra analisar como tratou-se a pandemia por aqui: se foi assassinato em massa ou não.
Há um ano, dois dias antes da primeira morte no país, o presidente da República participou de protesto um em Brasília contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). Como se o ato em si já não fosse assombroso (o presidente da República participande de ato contra outros dois poderes constituídos), ao longo da semana, ele minimizou a Covid-19, chamando de “gripezinha”, e lançou seus primeiros ataques contra governadores que tomaram medidas para isolar seus estados, tentando conter o avanço do vírus, tal como os países mais civilizados do mundo faziam – e que, por um tempo, mostrariam ter sucesso.
Uma semana depois, em pronunciamento nacional de rádio e televisão, ordenou que o país voltasse à “normalidade”, pedindo o fim das quarentenas nos estados. Ele incentivou atos contra o fechamento do comércio, algo que dura até hoje, como se viu em Manaus (que culminou na famosa crise do oxigênio) e em várias capitais e grandes cidades do país.
Em 16 de abril de 2020, Bolsonaro demite o ministro da Saúde, que era Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS), médico e apoiador ferrenho do golpe parlamentar de 2016 contra a então presidenta Dilma Rousseff. Mandetta se recusava a colocar em prática as ordens do chefe contra o isolamento social, o uso de máscaras e o uso da cloroquina como tratamento da Covid-19, um remédio descartado pela comunidade médica internacional pra esse fim. Quem assumiu foi outro médico, Nelson Teich.
STF decide que estados e municípios têm autonomia pra determinar isolamento social e realizar políticas de enfrentamento à crise, sem, no entanto, tirar do governo federal a responsabilidade de continuar combatendo a pandemia.
Acuado, Bolsonaro começa sua aproximação ao Centrão, grupo de partidos políticos quem tendem à direita do espectro ideológico, mas que participam de governos desde a redemocratização, em 1989. Presidente pede a empresários que pressionem governadores pela reabertura.
Em 15 de maio, Teich pede pra sair. Também não quis sujar seu currículo liberando a cloroquina.
Pra se precaver, Bolsonaro edita Medida Provisória (MP, que já caducou) protegendo agentes públicos de responsabilização na pandemia.
Na virada de maio pra junho, o Brasil registra mais de um morto por minuto e governo restringe a divulgação de dados, o que levou a diversos veículos de imprensa a criar o “consórcio de imprensa” pra divulgação dos dados reais da pandemia, sem depender do Ministério da Saúde, baseando-se nos números do Conass, Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Uma semana depois, STF determina que o ministério retome a divulgação de dados reais da doença.
Em 11 de junho, Bolsonaro pediu aos seus seguidores nas redes sociais que filmem o interior de hospitais públicos e de campanha para averiguar se os leitos de emergência estão livres ou ocupados, segundo informou a Folha de São Paulo. “Tem hospital de campanha perto de você, hospital público, arranja uma maneira de entrar e filmar. Muita gente está fazendo isso e mais gente tem que fazer para mostrar se os leitos estão ocupados ou não. Se os gastos são compatíveis ou não. Isso nos ajuda”, disse o presidente.
Em julho, Bolsonaro admite que foi infectado pelo SARS-CoV2 e tem Covid=19. Disse que se curou tomando cloroquina, sem nunca provar tal fato. Este é o pior mês da pandemia no país até agora.
Desde a saída de Teich, para tocar o dia a dia pasta, Bolsonaro colocou um general sem nenhuma experiência na área, Eduardo Pazuello. Pra se ter uma ideia, antes de assumir, o militar disse que “nem sabia o que era o SUS (Sistema Único de Saúde)”.
Bolsonaro foi contra a compra de vacinas. Em janeiro de 2021, a CNN teve acesso com exclusividade a uma carta encaminhada no dia 12 de setembro de 2020 pelo CEO mundial da Pfizer, Abert Bourla, a Bolsonaro e a alguns de seus principais ministros. O conteúdo da mensagem mostra que a farmacêutica insistiu pra que o governo fosse célere em fechar negócio com a empresa, tendo em vista a alta demanda mundial.
“Segundo fontes”, diz a matéria da CNN, a manifestação foi encaminhada ao Ministério da Saúde, mas as negociações nunca andaram. Primeiro, porque o governo avaliou que as condições de armazenagem e distribuição da vacina dificultariam sua distribuição pelo Brasil. Ao contrário de outras vacinas, ela precisa estar refrigerada a cerca de 70 graus negativos”.
Em 18 de dezembro, chegou a dizer, com um sorriso peculiar de satisfação, como se imaginasse tenha sido acometido por um lampejo de genialidade: “lá no contrato da Pfizer, está bem claro, nós (a Pfizer) não nos responsabilizamos por qualquer efeito colateral. Se você virar um jacaré, é problema seu”, disse se referindo à vacina.
No caso da Coronavac, fabricada pelo laboratório chinês Sinovac e aposta do seu agora opositor político João Dória (PSDB), governador de São Paulo, foi ainda pior. Ele e sua rede de ódio nas redes sociais fizeram de tudo pra desacreditar a vacina, chamando de “vachina”, como se a procedência quisesse dizer alguma coisa, e comemorando quando algum percalço nos testes acontecia.
“Morte, invalidez, anomalia. Esta é a vacina que o Doria queria obrigar a todos os paulistanos tomá-la. O presidente disse que a vacina jamais poderia ser obrigatória. Mais uma que Jair Bolsonaro ganha”, disse se referindo à suspensão dos testes, quando do suicídio de um voluntário.
Ainda hoje Bolsonaro é contra as vacinas e contra o uso de máscaras.
O G1 lembrou, em 25 de fevereiro de 2021, que “no dia mais letal da pandemia no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro escolheu questionar mais uma vez o uso de máscaras e o isolamento social, dois métodos considerados eficazes pra conter a disseminação do coronavírus. Nesta quinta (25/2), o Brasil registrou ao menos 1.541 novas mortes por Covid-19, segundo o Conass (nas contas do consórcio de veículos de imprensa, o número foi ainda maior: 1.582, fazendo, segundo esse dado, o dia o mais letal da pandemia até agora). Bolsonaro, enquanto isso, citou em sua live semanal um suposto estudo de uma universidade não especificada na Alemanha que teria concluído que máscaras são ‘prejudiciais’ às crianças, causando irritabilidade, dor de cabeça, dificuldade de concentração, entre outros”.
Diante de tudo isso, fica a sensação de que este texto vai, na verdade, caducar. Bolsonaro ainda vai cometer mais crimes contra a saúde dos brasileiros e muito mais gente vai morrer. O quadro ainda vai ficar mais terrível.
Isso porque o brasileiro não ajuda: casas noturnas, praias, festas clandestinas, hotéis, clubes, todos lotados ajudam a espalhar ainda mais o vírus. Já não é mais fácil achar bares vazios, com boa circulação de ar, pra desanuviar. Nem parques salvam. Os hospitais estão cheios por todo o país.
Enquanto isso, os congressistas pensam em das mais R$ 250 por mês como auxílio-emergencial por quatro meses, enquanto vendem outras estatais, pensam em reformas e em leis que garantam que eles não possam ser presos pelo STF.
Uma bebedeira vale mais do que a vida? Um show vale a vida de quantas pessoas? Uma praia lotada vale quantas pessoas sem respirar?
Enquanto isso, na Inglaterra, com a vacinação em bom curso, já se discute (pelo menos há um horizonte) quando os festivais poderão voltar a ser realizados.
Quando este texto caducar, e ele vai caducar rápido, se verá que é porque nada mudou: a gente ainda vai estar se arriscando em aglomerações festivas e Bolsonaro ainda vai continuar matando e estimulando a morte.
Nós perdemos.