RESENHA: PAOLA RODRIGUES – < 3 WIFI (EP)

O mundo hoje meio que está no nosso quarto. “Efeito óptico que ocorre nas horas mais quentes, espelho nos desertos, produzido pela reflexão da luz solar, que cria uma imagem semelhante a um lago azul, onde por vezes se refletem imagens”, Paola entoa na primeira faixa, “N0v0 An0”.

Portanto, “o primeiro é “Perdida”, de 2014, ouça aqui) é a aceitação de uma ilusão – da aceitação de realidades fragmentadas, paralelas e que evocam poeticamente uma urgência que não acredita no que se apresenta como verdadeiro. É uma dúvida constante que questiona as finalidades, mas prefere se deparar no espanto do momento; o momento que surge maximizado na Internet, das interações, da narração do iminente e da evocação das sensações que esses entrecruzamentos sugerem.

A sombra de “hip hop – as batidas da terceira faixa, “N1nh0”, pontuam um discurso de uma situação delirante em que o uso de substâncias e seus refluxos são narrados no momento exato do entretenimento máximo que o uso proporciona.

São sensações alucinadas, mas que atravessam o corpo – é mais ou menos como a Internet atravessa a realidade pra deixar impressões vivas. É a emulação da vida moderna, a sua propagação em elementos sonoros dissolvidos e que dialogam descaradamente com os movimentos contemporâneos. Mas não se trata de simulação ou um discurso de inserção, mas uma exibição evidente de um universo que vai abrindo espaço em um mundo cada vez mais estranhamente virtual. É uma mensagem que exorciza o senso comum sobre interações da web e as aplica no plano estético tão fragmentado quanto esses relacionamentos se iniciam. É um processo de esconderijos categóricos e como eles são desvendados e explorados e somados com os acontecimentos contemporâneos em discursos que insinuam contra frases e clichês e ainda assim retoma ações antigas (Paola jogando, quando criança, uma pedra no olho do seu melhor amigo) pra difundir como as memórias invadem os planos que vivemos (e são vários planos, são inúmeras bifurcações, universos contrários – poderia ser qualquer besteira astrofísica, mas é, como eu disse, a aceitação da difusão estérea no plano concreto).

Seja consciência, seja sentimento, seja conhecimento, seja a vivência – o que há aqui é um reconhecimento de que nunca nada em nenhum destes campos está completo, mas que seus micro andamentos que prolongam e definem caoticamente o mundo em que vivemos.

Eu não estou 100% certo como Paola trabalha com memória, mas parece que ela a invoca estados antigos e os associa como eles intervém em seu presente. Pra isso, há todo um arsenal; imaginação, fluxo de consciência, diálogos entre diferentes vertentes sonoras que se trombam e unem pontos diversos e, inicialmente, desconexos.

Porque de seu apartamento (ou casa, ou seja lá o que for) Paola se abre pra o mundo e em suas andanças (virtuais ou físicas) ela reconhece elementos dele e modifica isso pra colocar em sua música.

Toda evocação de “< 3 WIFI” ultrapassa a glorificação mais superficial à Internet pra testemunhar uma aceitação (e toda a complexidade que isso implica) de uma realidade nova, estranha, abrupta e relativamente impostora. É realmente melhor fingir do que dormir, no fim das contas.

Eis o vídeo oficial de “N1nh0”:

1. N0v0 An0
2. Madrug4da
3. N1nh0
4. Err0 (Interlúdio)
5. Calafr1o

NOTA: 9,5
Lançamento: 16 de agosto de 2016
Duração: 23 minutos e 54 segundos
Selo: Geração Perdida
Produção: André Pádua

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