“‘Depois do Fim: O Infinito’ é uma série de composições eletroacústicas baseada na ideia de pós-final, uma busca por uma estética do pós-acontecimento, representando as sonoridades que viriam depois que a música acaba. Seria uma pós-música? Ou uma música que retrata um cenário pra depois do fim do mundo. Nascer na contemporaneidade é viver em um mundo onde muita coisa aconteceu antes de você estar aqui, tudo que te restou é assistir o final do filme de uma história mal contada e viver as consequências dos efeitos colaterais das escolhas feitas por seus antepassados, caminhando pra um caos em que todos perderão o controle. Viver em um mundo pós-colonial marcado pela destruição em massa de todos os povos que viviam felizes em solo fértil. Em vez de aproveitarmos este solo pra ir em direção às nossas utopias, preferimos construir o inferno sobre a terra. O fim do mundo já aconteceu há séculos, e até hoje há quem não acredite”.
A descrição de “Depois Do Fim: O Infinito”, algo apocalíptica, algo pretensiosa, de imediato não quer dizer rigorosamente pro ouvinte, a não ser, claro, a visão do artista.
Vitor Çó, paraibano criador da etiqueta Selo Fictício, é mestrado em composição pela Universidade Federal da Paraíba, compõe músicas pra concertos, trilha sonora de filmes, teatros, dança e instalações, o que explica melhor o que se ouve em “Depois Do Fim: O Infinito”.
O disco temático (ou “de história”, ou “argumentativo”), conforme vai se encaminhando, ganha os sons que Çó descreveu apocalipticamente. Há o pós-algo acontecendo, como descrito no roteiro e que o diretor tratou de executar, dentro das suas capacidades imaginativas.
Mais do que se ver num cenário resultante de um evento trágico, entretanto, o ouvinte se enxerga numa plateia, diante do artista no palco, executando suas ideias bem definidas. Já é algo (ou já é bastante coisa).
Segundo sua descrição, “a primeira faixa seria o fim do Álbum e as outras representariam sonoridades que emergem após um fim, sendo cada faixa a continuação e um novo fim pra que faixa que antecede”.
“O fim da experiência é o início de uma nova experiência”, Çó resume.
Ok, clichês a parte, há bastante contemporaneidade nesse Brasil cruel e fundamentalista que o governo federal (de Michel Temer e, agora, de Jair Bolsonaro, claro) tenta, a todo custo, construir: “a capa do Álbum é uma foto de um navio naufragado na costa brasileira. O naufrágio representa um pós-acontecimento, o qual seus sobreviventes vivem uma ‘nova vida’ a partir de suas condições de não morte. No Brasil, viviam muitas pessoas felizes até chegarem os navios e exterminarem toda a paz, o que restou foi um cenário de pós-destruição e pós-colonização. O fim dos tempos aconteceu há séculos atrás e até hoje ainda existe quem quer negar em acreditar…”.
A visão é interessante, por certo. Já estamos vivendo o apocalipse, estamos caminhando sobre os mortos, embora seja tentador achar que há muito mais gente pra matar e pisar em cima – trabalho que, convenhamos, estamos fazendo que eficiência inquestionável.
Ao juntar essas ideias, “Depois Do Fim: O Infinito” se torna um disco bem interessante, mesmo que um trabalho que se ouça uma única vez, a título de conhecimento ou curiosidade. É um trabalho onde os silêncios são protagonistas, criando dramas e apreensões, que por vezes surpreendem o ouvinte.
Daria também um ótimo espetáculo de luzes, imagens e sons.
A obra é toda composta e interpretada por Vitor Çó, com lançamento pelo Selo Fictício em 21 de janeiro de 2021.
As demais obras do selo podem ser encontradas aqui, neste link.
1. Parte 1: O Fim
2. Parte 2: Depois Do Fim
3. Parte 3: Depois Do Fim Parte 2
4. Parte 4: Depois Do Fim Parte 3
5. Parte 5: Depois Do Fim Parte 4
6. Parte 6: Depois Do Fim Parte 5
7. Parte 7: Depois Do Fim Parte 6
8. Parte 8: Depois Do Fim Parte 7
9. Parte 9: Depois Do Fim Parte 8